Quando decidiu fundar a Arboran, em 2017, o biólogo Paulo Garbugio tinha uma convicção: as cidades precisavam enxergar as árvores como patrimônio vivo — e não como obstáculos ao crescimento urbano. “Sempre gostei de observar árvores. Percebia que havia uma vida inteira acontecendo ali, mas que a sociedade não dava o devido valor. Quando entrei para a área de arborização urbana, vi que o cuidado com elas era muito limitado. Resolvi transformar isso em missão de vida”, diz.
A ideia de criar uma startup que unisse biologia, engenharia e tecnologia nasceu de conversas com colegas que compartilhavam da mesma inquietação. Em sociedade com o engenheiro florestal Charles Coelho, ele tirou o projeto do papel. O desafio era grande: convencer prefeituras, empresas e construtoras de que o manejo de árvores não era apenas uma questão estética, mas também de saúde pública, segurança e, principalmente, oportunidade econômica.
No começo, os contratos eram pequenos e, muitas vezes, inviáveis financeiramente. “Executávamos trabalhos quase a preço de custo, só para provar que dava certo. Era uma aposta de longo prazo. A gente sabia que precisava mostrar valor antes de pensar em faturamento”, lembra Garbugio.
A virada veio com o desenvolvimento do GAAU — Grau de Atenção para Árvores Urbanas. O software analisa riscos de queda, orienta o manejo e calcula o carbono estocado em cada árvore. Com ele, a Arboran conseguiu transformar árvores em ativos financeiros rastreáveis, criando créditos de carbono que podem ser revertidos em investimentos ambientais.
“Mostramos para os gestores públicos que as árvores não são custo, são receita. Elas podem financiar a própria preservação”, afirma.
O impacto foi imediato. Até agora, a startup já gerou 8.610 créditos de carbono, o que representa cerca de R$ 730 mil. Uma árvore de grande porte pode representar até 1,5 tonelada de carbono, ou seja, até 1,5 crédito comercializável. “É uma forma de colocar as árvores na linguagem que governos e empresas entendem: números. E, ao mesmo tempo, garantir recursos para manter as cidades mais verdes e seguras”, explica Garbugio.
Além da inovação em créditos de carbono, a Arboran se especializou em transplante de árvores adultas, técnica que substitui o corte em obras urbanas. Foram mais de 350 transplantes até agora, incluindo um dos maiores já feitos no Brasil: uma figueira de 20 metros de altura e 56 toneladas, em Florianópolis. “É como fazer uma cirurgia de alta complexidade. A gente escava, transporta e planta de novo, com todo cuidado para que a árvore sobreviva. Cada vez que uma dessas dá certo, é uma vitória enorme”, diz.
A startup também investe em ciência. Entre os trabalhos de maior repercussão está o sequenciamento de DNA da Figueira da Praça XV, um dos símbolos da capital catarinense. O estudo revelou que a árvore tem origem na Ásia tropical e na Austrália. “A Figueira é um patrimônio afetivo da cidade. Descobrir sua origem foi como contar a biografia de um velho amigo. É ciência que gera conexão com a população”, afirma Garbugio.
A inovação e os resultados renderam reconhecimento. A Arboran venceu o Prêmio Centelha em 2020, promovido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc); foi listada entre as TOP 100 startups do Startup Summit 2024; e conquistou o prêmio Acelera Startup SC em 2025, que também trouxe R$ 80 mil em fomento financeiro. “Cada prêmio reforça que estamos no caminho certo, mas o mais importante é ver a transformação acontecendo na prática”, comenta Garbugio.
Com uma equipe multidisciplinar, formada por biólogos, engenheiros e arboristas, a empresa cresce 60% ao ano e deve fechar 2025 com receita próxima de R$ 2 milhões. Apesar do assédio de investidores, o negócio ainda não abriu rodada de captação. “A gente busca parceiros estratégicos, não apenas capital. Não queremos alguém que só esteja preocupado com retorno financeiro no curto prazo. Nosso trabalho tem impacto social, ambiental e econômico. Quem entrar precisa entender isso”, afirma.
De olho no futuro, a Arboran planeja expansão internacional. Há negociações com cidades do Chile e da Argentina, e em novembro a startup será uma das representantes brasileiras no Web Summit Lisboa, um dos maiores eventos de tecnologia do mundo. “Estamos mostrando que o modelo pode ser replicado em qualquer lugar. Onde há árvores e cidades crescendo, existe demanda por esse tipo de solução”, diz Garbugio.
Os próximos passos envolvem o uso de sensores para monitoramento em tempo real, alimentando o GAAU com dados contínuos. O objetivo é criar um sistema autogerível, capaz de prever riscos e propor soluções automaticamente. “É a evolução natural. Queremos transformar o cuidado com árvores em algo inteligente, conectado, escalável. Assim como as cidades estão se tornando smart, a arborização também precisa ser”, afirma.
Para Garbugio, a essência da Arboran está na paixão da equipe. “Alguém pode até copiar um software, mas não copia o brilho no olhar. Nosso diferencial é a certeza de que cuidar de árvores é cuidar de pessoas, de saúde pública e do futuro das cidades. É sobre deixar um legado”, conclui.
Fonte: Um Só Planeta.
Foto: Divulgação/ Bruna Campos.
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