Cinco Amazônias não compensariam as emissões das petroleiras, revela estudo publicado pela Nature

Pesquisadores costumam dizer que, quando um estudo é publicado na Nature, ele não apenas ganha credibilidade, mas também peso para mudar discussões no mundo todo. Esse é precisamente o caso da pesquisa recém-publicada na revista científica, que parte de uma pergunta simples e incômoda: é possível compensar, de forma realista, a poluição de carbono se as petroleiras seguirem queimando o que já têm em reservas?

Funciona assim, para continuar queimando combustíveis e fingindo que tá tudo certo, 

– Reflorestamento

– Captura de carbono (CCS)

– Compra de créditos de carbono.

Mas nenhuma alternativa de compensação climática é viável em larga escala para neutralizar os impactos da queima de combustíveis fósseis.

No estudo, quando os autores falam que as 200 maiores empresas guardam um potencial de 673 gigatoneladas de CO₂ equivalente, eles não estão falando de carbono já emitido, mas sim do carbono que seria liberado se as reservas fósseis que essas empresas controlam (petróleo, gás e carvão) fossem extraídas e queimadas.

Ou seja, esse valor representa o “estoque de carbono” contido nos combustíveis fósseis que ainda estão no subsolo, mas que aparecem nos balanços das empresas como ativos econômicos, porque elas planejam explorá-los e vendê-los no futuro.

Quando a gota custa mais do que vale

A pesquisa questiona a lógica financeira da compensação. Ao simular diferentes preços de carbono, os cientistas descobriram que, a partir de 150 dólares por tonelada de CO₂, todas as petroleiras incluídas no estudo passariam a apresentar valor ambiental líquido negativo, ou seja, deixariam de ser viáveis socialmente e economicamente.

Se o custo social do carbono para aplicado, estimado em torno de 190 dólares por tonelada, administrar uma empresa de combustíveis fósseis torna-se um negócio que gera mais prejuízo climático e econômico do que benefícios.

A conclusão é certeira: é mais barato e racional evitar novas emissões do que tentar compensá-las no futuro.

Para ilustrar a desproporção, os autores reforçam que, mesmo que o planeta inteiro fosse reorganizado para reflorestar, ainda assim não haveria espaço suficiente para compensar as emissões projetadas. O carbono armazenado em árvores é temporário e pode ser liberado de volta por incêndios, secas ou doenças.

Assim, a conta nunca fecha. É por isso que especialistas chamam o argumento de compensação de “falsa solução”: ele cria a sensação de que existe uma saída tecnológica fácil, quando, na prática, apenas mascara a necessidade urgente de reduzir emissões na fonte.

O reflorestamento, apesar de ser considerado a forma mais acessível de sequestro de carbono, mostra-se impossível na escala necessária. Para compensar as reservas das grandes petroleiras, seria preciso reflorestar uma área do tamanho da América do Norte e Central apenas com árvores. Além do absurdo logístico, isso significaria deslocar comunidades, substituir terras agrícolas e impactar ecossistemas já existentes.

Oceano: grande aliado no enfrentamento à crise climática?

Nesse cenário, o oceano aparece como um grande aliado no enfrentamento da crise climática. Ele funciona como um “pulmão azul”, absorvendo cerca de um terço do CO₂ que lançamos na atmosfera e guardando esse carbono em ecossistemas costeiros como manguezais, pradarias marinhas e nos próprios sedimentos do fundo do mar.

Mas essa capacidade vital está em risco: a exploração de petróleo na Bacia da Foz do Amazonas pode trazer consequências graves, como vazamentos, poluição e a destruição de habitats que hoje ajudam a capturar e estocar carbono. Ou seja, em vez de avançarmos na mitigação da crise climática, poderíamos perder um dos nossos maiores aliados naturais.

Recentemente, foram leiloados mais de 16 mil km² na Foz do Amazonas para exploração de petróleo, uma área que equivale a 13 milhões de piscinas olímpicas entregues à indústria fóssil.

Além disso, no início da semana, a Petrobras recebeu a licença de operação do Ibama para a perfuração de um poço exploratório no bloco FZA-M-059, localizado em águas profundas do Amapá, a 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas e a 175 quilômetros da costa, na Margem Equatorial brasileira.

Para Mariana Andrade, porta-voz do Greenpeace Brasil, essa pesquisa confirma o que movimentos ambientais vêm alertando há anos: “Não existe compensação capaz de equilibrar os impactos da expansão do petróleo. A Amazônia e o oceano estão conectados por uma rede viva de povos e biodiversidade fundamentais para o enfrentamento das mudanças climáticas. O Brasil pode e deve liderar pelo exemplo, barrando novas fronteiras como a Foz do Amazonas e acelerando uma transição justa que proteja pessoas e natureza”.

Em números, a dimensão do problema:

Queimar as reservas das 200 maiores petroleiras liberaria 673 Gt de CO₂e, quase o dobro do limite para 1,5 °C;

– Para compensar só com árvores, seria preciso plantar em 24,75 milhões de km² — o equivalente a 3 Brasis ou 5 Amazônias inteiras;

– Mesmo a alternativa “mais barata” (reflorestamento) custaria US$ 11 trilhões, sem contar a disputa por terras agrícolas e comunidades já estabelecidas;

– Captura direta de ar? Hoje sai por cerca de US$ 1.000 por tonelada, inviável em escala.

O desafio da coerência na COP 30

O estudo não fala apenas de números globais, ele se conecta diretamente a decisões que o Brasil precisa tomar agora, como o futuro da exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Mais de 50 redes e organizações da sociedade civil lançaram a Carta Aberta Transição Energética Justa e Popular, cobrando que o país chegue à COP 30, a Conferência do Clima que acontece esse ano em Belém, no PA, com propostas coerentes.

O documento pede que todos os planos de transição energética sejam construídos com participação social, transparência e respeito aos territórios, com metas reais de redução de emissões e substituição dos fósseis.

Só haverá liderança se houver consistência entre os compromissos climáticos internacionais e prática em casa.

Seguir abrindo novas fronteiras fósseis significa ignorar a ciência e arriscar crises sociais, ambientais e econômicas, além de enfraquecer o papel do país em fóruns internacionais como a COP30.

Fonte: Greenpeace Brasil, Conexão Planeta.

Foto: © Francesco Alesi / Greenpeace.

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