Agro superou área com vegetação nativa do Pampa

Em pouco menos de quatro décadas, o avanço de lavouras, pastagens exóticas e plantações de eucalipto transformou 8,8 milhões de hectares de campos nativos em áreas produtivas.

A expansão agrícola foi o principal vetor dessa transformação. O cultivo de soja, que há 30 anos era quase inexistente no bioma, tornou-se dominante em diversas regiões do Rio Grande do Sul.

Segundo o MapBiomas, as áreas agrícolas cresceram 2,1 milhões de hectares no período, ocupando planícies antes cobertas por campos naturais e vegetação herbácea típica.

A silvicultura, sobretudo com eucalipto, também avançou com paraça: a área destinada a florestas plantadas aumentou mais de 1.600% desde os anos 1980, atingindo 720 mil hectares.

A pressão produtiva não vem apenas do agronegócio. As pastagens plantadas com espécies exóticas e as obras de infraestrutura, estradas, cercas e áreas de mineração, fragmentam a paisagem, dificultam a regeneração natural e alteram o microclima local.

A compactação do solo, o escoamento superficial e a perda de biodiversidade se somam aos impactos diretos do desmatamento.

Essa vulnerabilidade institucional faz do Pampa um território de fácil conversão: sem barreiras de proteção, a fronteira agrícola avança, movida por incentivos econômicos e pela ausência de fiscalização efetiva.

Apesar de o desmatamento ter caído 42% no Rio Grande do Sul em 2024, com 896 hectares suprimidos no ano, segundo o Relatório Anual de Desmatamento (RAD 2024), a redução pontual não reverte as perdas acumuladas.

As mudanças no regime de chuvas no sul do país, com secas prolongadas e eventos extremos mais frequentes, tendem a agravar o quadro.

A degradação dos solos e a redução da cobertura vegetal comprometem a capacidade do bioma de armazenar água e resistir à desertificação.

No oeste gaúcho, há registros crescentes de áreas arenizadas, uma forma de degradação semelhante à desertificação, causadas pela retirada da cobertura vegetal e pela erosão.

Desde meados dos anos 1980, a superfície com aquelas atividades cresceu aceleradamente, mostra o MapBiomas. As perdas acumuladas foram as maiores entre os biomas brasileiros nas últimas quatro décadas.

O avanço ocorreu principalmente sobre a vegetação de campos – a marca registrada do Pampa. A cobertura de florestas, banhados e restingas, embora com territórios menos extensos, permaneceu relativamente estável no período.

Na grande maioria dos municípios, as lavouras já superam a pecuária no uso dos campos. A soja lidera a eliminação do bioma, pois sua área quase quadruplicou.

É o que mostra o mais recente levantamento da Coleção 10 de mapas e dados sobre cobertura e uso da terra no Brasil do MapBiomas, elaborada com base em imagens de satélite, e que está sendo lançado nesta quinta-feira (09/10).

A área ocupada por algum tipo de uso humano totalizou 8,8 milhões de hectares em 2024 – crescimento de 76 % desde 1985. A expansão se deu sobre os 3,8 milhões de hectares de vegetação nativa que foram suprimidos no período. A vegetação campestre, que é típica e simboliza o bioma, foi a mais afetada nesse período.

Por outro lado, outros tipos de vegetação nativa também presentes no bioma, como as florestas, os banhados e as restingas (vegetação florestal ou herbácea que ocorre sobre solos arenosos e dunas da zona costeira) se mantiveram relativamente estáveis ao longo das últimas quatro décadas.

Outro dado levantado pelo mapeamento é que o Pampa é o bioma brasileiro com a menor proporção de unidades de conservação no Brasil: apenas 3% (575 mil hectares) de seu território estão protegidos por unidades de conservação (2,4% em unidades de conservação de uso sustentável e 0,6% em unidades de conservação de proteção integral). Elas concentram 5,4% da vegetação nativa do bioma.  “A combinação da grande perda da vegetação nativa com o baixo grau de proteção em áreas protegidas deixa o bioma numa situação de grande vulnerabilidade ambiental”, complementa Heinrich Hasenack, coordenador da pesquisa no Pampa do MapBiomas.

Sobre o Pampa

O bioma Pampa se estende por 83,3 milhões de hectares espalhados por três países da América do Sul (Argentina, Brasil e Uruguai), ocupando 4,7% do continente. Mais da metade (56%, ou 46,7 milhões de hectares) fica na Argentina; o restante se divide entre Brasil (23%, ou 19,4 milhões de hectares, todos concentrados no estado do Rio Grande do Sul) e Uruguai (21%, ou 17,8 milhões de hectares – a totalidade do país).

O pampa é caracterizado por uma vegetação herbácea nativa constituída por uma mistura de gramíneas e ervas que variam entre 5 e 50 cm. Em um único metro quadrado de campo já foram encontradas mais de 50 espécies de plantas. Espécies lenhosas como subarbustos e árvores isoladas podem estar presentes, mas com baixa cobertura.

O pesquisador Eduardo Vélez, da equipe do MapBiomas Pampa, comenta que o bioma sofre com a falta de compreensão sobre a importância dessa vegetação nativa herbácea: “O fato da vegetação campestre do Pampa não ter a mesma exuberância das  florestas tropicais acaba contribuindo para que a perda dessa vegetação nativa não tenha o mesmo impacto na percepção da sociedade que o desmatamento das florestas provoca. Entretanto, a importância ecológica dos campos é equivalente à das florestas, sendo cruciais para a conservação do solo, o controle da erosão, a infiltração da água no solo e a existência de polinizadores, dentre tantos outros serviços ecossistêmicos relevantes.

A formação campestre é o habitat da fauna campestre, abrigando diversas espécies de plantas e animais, várias delas ameaçadas de extinção. Ao mesmo tempo, também é usada para a criação de rebanhos bovinos.  As folhas das plantas são consumidas pelos rebanhos (forragem), sendo a base da atividade pecuária regional. A pecuária no Pampa se notabiliza por ser um exemplo de uso sustentável da natureza.

Com 9% do bioma coberto por água, o Pampa é o bioma com a maior superfície proporcional de água – em especial, por conta da Laguna dos Patos, das lagoas Mirim e Mangueira, além de dezenas de lagoas costeiras. Entretanto, a abundância de água na zona costeira contrasta com algumas regiões do bioma com hidrografia de rios pouco caudalosos.

Fontes: ((O))eco, MapBiomas, Veja.

Foto: Fepam/RS / Divulgação.

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