A palavra mangue é já encontrada em vários mapas do Brasil, de Teixeira e Albernas (Teixeira, 1631; Albernas, 1666), indicando parte dos nomes locais de vários acidentes geográficos, como pontas, ilhas e rios.
A carta número 21 do Atlas da Baía de Todos os Santos, de 1631, contém a seguinte anotação: “Ilhas Alagadizas cubertas mangues”. A carta da América do Sul, de 1660, intitulada “De Zee-Atlas Ofte Water-Waereld” (Putman, 1988), indica a “Pta. de los manglares” na costa oeste da América do Sul.
A carta náutica do Brasil de 1809, preparada por Manoel Pimentel, principal hidrógrafo do rei de Portugal, D. João V, mostra o local chamado de “mangues verdes”, situado a leste de São Luís, no Maranhão. As cartas de navegação de Pimentel fazem diversas referências aos manguezais naquele trecho de costa. Depreende-se dessas evidências que o termo era familiar aos primeiros navegadores, os quais desenhavam as cartas náuticas daquele tempo.
Os portugueses descobriram os manguezais e cunharam o termo para descrevê-los. Alguns dos primeiros relatos sobre os manguezais da costa brasileira descrevem a paisagem do litoral da Bahia.
Cartas jesuíticas, escritas por Anchieta no século XVI, apresentavam descrições detalhadas de hábitos de espécies que povoavam os mangues, como gavião-do-mangue ou caranguejeiro (Buteogallus aequinoctialis).
As primeiras viagens marítimas de Portugal se iniciaram nos anos 1440, levando seus navegadores mais e mais para o Atlântico Sul e para a costa sul da África. Por volta de 1460, atingiram o Cabo Palma, navegando ao longo dos ricos manguezais que iam do Senegal até a atual Libéria. Em 1484, os velejaram pela Passagem de Daomé, atual Benin, e descobriram o estuário do Congo. Em 1497, pouco antes do descobrimento do Brasil, ocorrido em 1500, os portugueses haviam chegado a Moçambique.
A descoberta dos manguezais da costa do Brasil
O aspecto peculiar da vegetação arbórea do manguezal mereceu atenção desde muito tempo. As primeiras referências datam de 325 a.C., atribuídas ao general Nearco, membro da comitiva de Alexandre, “O Grande” (Macnae, 1968).
Um médico que integrou a expedição de Cristóvão Colombo, na viagem de 1492 às Américas, descreveu os manguezais caribenhos como sendo “tão densos que um coelho mal podia deslocar-se pela floresta.” Os manguezais das Américas aparecem descritos a partir de 1526 no trabalho “História Natural General de las Índias”, escrito por Oviedo (Macnae, 1968).
Entre os primeiros relatos conhecidos sobre o Brasil, aparecem os de Gabriel Soares de Souza (1569-1587), referentes ao “Tratado Descriptivo do Brasil” (Souza, 1987).
Os informes sobre o litoral da Capitania da Bahia foram escritos em 1587 e reimpressos em 1987. Referências aos manguezais da Capitania de São Vicente podem ser encontradas nas “Cartas Jesuíticas”, escritas pelo Padre Joseph de Anchieta, S.J. (Anchieta, 1984). Essas cartas apresentam descrições detalhadas das árvores de mangue Avicennia e Rhizophora, conhecidas dos ameríndios como “sereiba” e “candapaúba”, respectivamente (Souza, 1987). Lá também são encontradas as primeiras referências aos manguezais da Capitania de São Vicente.
De acordo com o Padre Anchieta: “… existem outras árvores, que ocupam os braços salobros do mar onde se desenvolvem, cujas raízes, algumas das quais crescem do meio dos troncos ou da base dos galhos e são do comprimento de lança, pendendo pouco a pouco sobre o substrato até que depois de muitos dias o alcançam” (Leite, 1954).
A 34ª “Carta Jesuítica” escrita por José de Anchieta, em São Vicente, ao Padre Diego Laynes, em Roma, datada de 31 de maio de 1560, inclui referências à flora e à fauna associadas à zona costeira, entre a Capitania de São Vicente e a da Bahia.
De acordo com Anchieta: “O peixe-boi, chamado de iguaraguá pelos indígenas, é comum no povoado do Espírito Santo e outros povoados para o norte, onde não faz frio, ou onde o frio é menos rigoroso que aqui (em São Vicente). Ele é grande e se alimenta de capim, como indicam as áreas utilizadas para pastagem, próximas às rochas, junto aos manguezais. Ele é bom para ser comido, sendo difícil distinguir o paladar entre carne de boi ou se deve ser considerado um peixe.
Os caranguejos são variados e possuem diferentes formas. Eles são aquáticos, alguns vivem todo o tempo submersos; esse comportamento é possível devido a que seus braços posteriores são adaptados à natação (possível referência ao Callinectes); outros constroem suas galerias nos canais, e alguns destes têm as pernas vermelhas e o corpo preto (provavelmente Goniopsis cruentata), alguns são azulados e possuem pelos (provavelmente Ucides).
As aves marinhas, conhecidas por guará pelos indígenas (clara referência ao guará, Eudocimus ruber), possui pernas longas, pescoço comprido, bico estendido e recurvado. Ele é voraz e se alimenta de caranguejos. Quando jovem, é coberto por penas brancas. Finalmente essas aves são ornamentadas com penas de bela cor púrpura, muito apreciadas por nossos ancestrais em suas capas ornamentais para os ombros por ocasião de suas celebrações” (Leite, 1954).
Os manguezais do Maranhão foram descritos por d’Abbreville em 1614, com o nome de “apparituriers”, ou florestas à beira-mar (D’Abbreville, 1975).
As descrições fazem referência à rica fauna associada, incluindo o peixe-boi, a se alimentar de gramas e de folhas de mangue; os caranguejos a caminhar sobre as raízes, a presença de mosquitos e, particularmente, a presença de grandes e palatáveis ostras.
Rebelo-Mochel (1997) cita Pianzola ao relatar a presença de franceses ao longo da costa do Maranhão, em 1614, que, ao narrar as batalhas com esses soldados, teriam visto os navios inimigos através da “cortina” de manguezal.
Foram publicadas, em 1648, reproduções dos originais produzidos pelo naturalista Marcgrave, integrante da expedição do conde holandês João Maurício de Nassau, que havia estado no Brasil no início do século XVII (Marcgrave, 1942).
As obras de Gabriel Soares de Souza e de Marcgrave apresentam descrições de características anatômicas e foliares dos gêneros Rhizophora e Avicennia. O manguezal, como elemento da paisagem do entorno da Baía de Guanabara, aparece retratado nas aquarelas do pintor austríaco Thomas Ender, que em 1817 acompanhou a missão dos governos da Áustria e da Bavária ao Brasil (Ferrez, s.d.). Nas suas aquarelas, os manguezais se destacavam na paisagem dessa baía.
Na América do Sul, até 1530 a colonização portuguesa se restringiu a alguns pontos do litoral (feitorias), onde sobrevivia da exportação de corantes obtidos de madeiras como o pau-brasil e do mangue.
Nas áreas costeiras protegidas por manguezais, os colonos encontraram não somente valiosas quantidades de tanino nas cascas de árvores, mas também alimentos e proteção que permitiram o estabelecimento de cabeças-de-ponte e pequenos povoados que sustentavam o desbravamento de terras interiores (Petrone, 1970).
As características geográficas do litoral orientaram a estrutura da colonização em áreas isoladas, funcionando como atratores. Essas regiões renderam as condições econômicas necessárias às futuras colonizações, ocorridas a partir do século XVI (Penteado, 1970; Adas, 1976). A partir do final do século XVI, os manguezais brasileiros haviam sido “descobertos” pelos europeus e se encontravam sob intensa exploração para produção de lenha, carvão, extração de tanino, pesca e produção de sal.
Particularmente importante era a exploração de madeira e de combustível (carvão) para sustentar tanto os inúmeros engenhos de açúcar quanto as populações estabelecidas nas zonas estuarinas próximas destes.
Fontes: ICMBio, IO.USP, Toda Matéria.