Brasileiros no setor de construção se preocupam menos com ambiente que a média global, alerta estudo

A construção civil no Brasil representa uma paraça econômica relevante — em 2021 e 2022, cresceu e gerou empregos em ritmo mais forte que o resto da economia. Em responsabilidade ambiental, porém, o setor enfrenta barreiras. É o que aponta o primeiro Barômetro da Construção Sustentável, pesquisa mundial produzida pelo grupo Saint-Gobain, gigante francês dono de marcas brasileiras como Telhanorte e Brasilit.

Localmente, boas práticas ambientais no setor significariam unidades residenciais mais inteligentes e cidades melhores para viver do que temos hoje no Brasil. Globalmente, o setor responde por 37% das emissões de CO2, gera 40% dos resíduos sólidos e consome 50% dos recursos naturais usados, segundo dados da Saint-Gobin. Por isso, é imperativo transformar os métodos de construção para cumprirmos as metas do Acordo de Paris, que prevê manter o aquecimento global em no máximo 2°C até o fim do século.

A sondagem consultou 802 pessoas — foram 403 profissionais de empresas e associações, 200 estudantes de engenharia, arquitetura e design e 199 políticos eleitos. O trabalho foi feito em 10 países — Brasil, EUA, África do Sul, Alemanha, Espanha, França, Índia, Itália, Japão e Reino Unido.

Enquanto para a maioria global (70% dos entrevistados) os custos são apontados como principal gargalo para a evolução dos métodos sustentáveis, nos países em desenvolvimento participantes do estudo (Brasil, Índia e África do Sul), a falta de treinamento e qualificação profissional aparece como preocupação número um. “Os próximos anos serão cruciais para apoiar o setor e garantir a inclusão bem-sucedida de todos profissionais nessa transformação setorial”, destaca a pesquisa.

Em outro indicativo desse descompasso, o Brasil aparece também no grupo dos países onde apenas metade (51%) dos profissionais consultados se diz familiar com o conceito de construção sustentável, enquanto a média mundial fica em 58%.

O financiamento para adoção desses métodos também é considerado uma barreira a ser superada, mesmo que no Brasil a previsão do setor de construção seja de investir R$ 2,7 trilhões até 2030, segundo a consultoria Deloitte. Anualmente, o setor movimenta R$ 377,8 bilhões, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

O que define uma construção sustentável?

Por definição, para fabricar construções sustentáveis, as empresas devem modernizar processos — no planejamento e durante a obra, é preciso reduzir desperdícios, preservar árvores e solo permeável, aumentar a eficiência no uso de água e energia, usar os materiais mais adequados a cada situação, destinar resíduos corretamente, minimizar impactos para o entorno. Depois disso, a obra pronta deve ser segura, confortável, eficiente no uso de água e energia e não agredir o restante da cidade (por seus efeitos como ruído, sombra, impermeabilização do solo e influência no trânsito).

O conceito abrange desde a engenharia e arquitetura, escolhendo materiais e usando sol e vento para aquecimento e refrigeração, por exemplo, ao mercado de casas pré-fabricadas, que usa menos material para construir residências eficientes e confortáveis. A lista de possibilidades engloba ainda práticas como engenharia verde e impressão 3D.

Na visão da Saint-Gobain, “a construção sustentável combina desempenho e durabilidade: em todo seu ciclo de vida, contribui positivamente para a saúde e o bem-estar das pessoas, tem uma pegada ambiental reduzida e oferece valor e qualidade superiores”.

Sustentabilidade aliada ao desenvolvimento econômico

O estudo sugere estratégias para países como o Brasil. “Em países com altas taxas de desemprego, precisamos enfatizar o valor inclusivo e eminentemente local de um método de construção que gera empregos regionais e investe em P&D para desenvolver soluções que utilizam predominantemente materiais locais. A construção sustentável pode ser uma alavanca para reduzir a dependência de recursos, cortar o gasto de energia e melhorar conforto e bem-estar”, afirma Othman Benjelloun-Touimi, CEO da companhia para a região da África Subsaariana, com altos níveis de pobreza e desigualdade.

O apelo econômico é destaque na defesa de métodos mais sustentáveis, de olho em casas mais baratas que possam aquecer o mercado e impulsionar inovação. Neste ponto, a visão dos profissionais dos países em desenvolvimento é quase unânime, segundo o levantamento: é com bons preços que os métodos de construção sustentável vão abrir caminho em meio ao convencional.

No Brasil, porém, a sustentabilidade é vista no setor principalmente pelo ângulo de viabilidade financeira das empresas e acesso financeiro dos compradores — em detrimento de preocupações ambientais.

No grupo de profissionais de países desenvolvidos consultados pelo barômetro, apenas 22% veem o estágio atual dos métodos sustentáveis de construção como suficientes para vencer o desafio da descarbonização e preservação de recursos naturais. No caso de países em desenvolvimento, essa parcela vai a 35%. O ceticismo no Brasil seria saudável se o setor já usasse todos os recursos de que dispõe. Não é o caso. São comuns no país projetos e obras sem nenhum traço de preocupação com a cidade ao redor e com seu impacto ambiental de longo prazo.

Essa posição, de esperar que a inovação traga soluções, pode indicar certo comodismo dos profissionais da área, no mundo inteiro. “Isso não necessariamente indica falta de inovação, e o obstáculo para a construção sustentável não parece ser esse tópico”, alertam os autores da pesquisa. Mas eles reconhecem a importância de desenvolver novos processos, métodos e materiais. “Os desafios são tantos que as partes interessadas do setor estão prontas para inovar ainda mais para encontrar soluções”.

Fonte: Um Só Planeta.

Imagem: Getty Images.