Com os dez maiores rios do Brasil abaixo do nível médio, abastecimento de água pode ser afetado

A seca transformou em poeira a abundância de água do Brasil. Os dez maiores rios estão abaixo do nível médio esperado para a estação, que normalmente já é de estiagem e tem a menor cota do ano.

A situação é crítica na Amazônia e no Pantanal, e severa no Cerrado. Mas todos os biomas estão com os seus maiores rios abaixo da faixa de normalidade, mostra o Serviço Geológico do Brasil (SGB). E todas as regiões, inclusive o Sul, onde tem chovido mais, são afetadas, em diferentes graus de intensidade.

O Sudeste já tem alguns de seus principais reservatórios na faixa de atenção, que indica níveis abaixo de 60%, afirma Adriana Cuartas, especialista em recursos hídricos do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). Chamam atenção Três Marias (54%), Furnas (48%) e Marimbondo (47%). A Cantareira, fundamental para São Paulo, também está na mesma faixa de atenção, com 57%.

No Sul, a Bacia do Paraná está também na mesma faixa. A Hidroelétrica de Itaipu está com seis mil metros cúbicos por segundo de vazão afluente (a quantidade de água que entra no reservatório), o que equivale a pouco mais que a metade da média, de 11.663 metros cúbicos por segundo.

O Rio Paraná, assim como o Tocantins e o São Francisco, tem seu fluxo regularizado por hidroelétricas. Ainda assim, esses rios têm trechos afetados pela baixa vazão.

Futuro preocupa

O que mais preocupa, explica Cuartas, não é somente a situação agora, mas o cenário até o fim de 2024 e o início de 2025. A previsão do Cemaden e de outras instituições é de atraso da estação chuvosa, chuvas abaixo da média e temperaturas elevadas, que aumentam a evaporação e acentuam a seca. Nas regiões mais secas do Centro-Oeste (Pantanal incluído) e Norte a chuva só deve chegar, no melhor cenário, no fim de outubro.

Para os grandes rios do Brasil, será chuva passageira. O Sul da Amazônia está na seca mais intensa da história, com o Solimões e Madeira abaixo da mínima histórica, destaca Artur Matos, coordenador do Sistema de Alerta Hidrológico e engenheiro hidrólogo do SGB. No Sudeste, as poucas frentes frias que conseguem avançar são curtas, fracas e trazem chuva insuficiente.

— O nível dos reservatórios mais estratégicos do país pode ficar perigosamente baixo. É muito ruim para a geração de energia e o abastecimento de água — frisa Cuartas.

Será preciso chover significativamente, num período mais longo, para repor os lençóis freáticos. Os últimos quatro meses foram secos em quase todo o Brasil, com chuvas bem abaixo da média do período de estiagem.

A crise hídrica não se deve apenas à seca que atinge o Brasil, em diferentes níveis de intensidade. A seca castiga também a Bolívia e o Peru, onde nascem o Madeira e o Solimões.

O Madeira, o quinto maior rio do Brasil, pela primeira vez na história ficou abaixo de um metro. O SGB registrou 96 centímetros em Porto Velho ontem. Ironicamente, o Dia da Amazônia.

O Solimões, no trecho superior do Amazonas antes do encontro com o Negro, está todo abaixo da média para a estação e crítico em vários pontos. O Alto Solimões está há dois anos com a chuva abaixo da média.

A Amazônia, marcadamente o Sul, nem chegou a sair da seca severa iniciada em 2023. Houve apenas breves períodos de alívio.

Situada às margens dos gigantes Negro, Solimões e Amazonas, Manaus está isolada pela falta d’água. Todos os grandes rios navegáveis da Amazônia — que incluem os que banham a capital do estado mais o Branco, Madeira, Purus e Juruá — estão com trechos intransitáveis, ou quase, para embarcações maiores.

A baixa dos rios também ameaça elevar a temperatura a níveis intoleráveis para a fauna, como as que, em 2023, causaram a maior mortalidade de botos-cor-de-rosa e tucuxi da história.

Atlântico aquecido

Tanta seca e calor tem a ver com o aquecimento do Oceano Atlântico, explica o meteorologista Marcelo Seluchi, do Cemaden. O Atlântico tem batido recorde sobre recorde de temperatura desde o ano passado. E ele exerce grande influência sobre o clima do Brasil.

A zona de umidade se deslocou mais para o norte da linha do Equador. A chuva se despeja na América Central, e a área de alta pressão, onde o ar desce, esquenta. Isso reduz a umidade em vasta área do Brasil a partir da Amazônia, que seca.

Seluchi diz que outro fator de grande importância é o desmatamento, que tira a umidade do ar ao remover a cobertura de vegetação. E a falta de umidade faz a temperatura subir.

Quando há umidade no solo, grande parte da radiação do Sol é gasta para evaporá-la e não para aumentar a temperatura. Nesta época do ano, quando a umidade do ar e do solo já são mais baixas, toda a energia do Sol se transforma em aumento de temperatura.

Fonte: O Globo.

Foto: Reprodução.

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