Como semana de trabalho de 4 dias pode beneficiar meio ambiente

Em 2011, Simon Ursell e os três outros cofundadores da recém-criada consultoria ambiental Tyler Grange, com sede em Gloucestershire, no Reino Unido, decidiram dar a todos os seus funcionários um dia de folga por mês para que se dedicassem ao trabalho voluntário.

Eles haviam percebido que muitos dos seus novos funcionários já usavam seu tempo livre trabalhando como voluntários em organizações de proteção da vida selvagem.

Mas, no ano passado, a Tyler Grange tomou uma medida que algumas pessoas considerariam muito mais radical para o bem-estar dos funcionários: ela tentou eliminar um quinto da semana de trabalho de todos eles.

A empresa participou do maior teste da semana de quatro dias de trabalho já realizado no mundo, que ocorreu no Reino Unido entre junho e dezembro de 2022.

A iniciativa piloto pretendia determinar se as empresas conseguiriam manter a produtividade com menos dias de trabalho — e, o mais importante, sem reduzir o salário dos seus funcionários.

Os gerentes e demais funcionários da Tyler Grange comemoraram a conquista com entusiasmo. Seus resultados demonstraram que a produtividade diária aumentou em 22%.

Mas Ursell também estava interessado em avaliar outro resultado: o impacto da semana de trabalho mais curta sobre a pegada de carbono da empresa. E ele conta que a semana de quatro dias acabou funcionando surpreendentemente bem, também para este propósito.

“Em média, observamos uma redução de 21% da quilometragem percorrida de carro”, observa ele, com um sorriso de contentamento.

A discussão em torno da semana de trabalho de quatro dias está ganhando impulso em todo o mundo. A organização sem fins lucrativos 4 Day Week Global — que coordenou o teste no Reino Unido — já havia conduzido pilotos nos Estados Unidos e na Irlanda.

O setor público da Islândia e empresas da Espanha, Suécia, Bélgica, Japão e Nova Zelândia também já testaram o impacto da semana de trabalho mais curta. Mas o teste do Reino Unido foi o maior já realizado. Ele envolveu mais de 60 empresas e organizações.

Os resultados foram publicados em 21 de fevereiro e algumas das empresas estão apresentando resultados mais amplos que confirmam as indicações de estudos anteriores: a semana de trabalho mais curta pode ajudar o planeta.

Redução da pegada de carbono

De 70 empresas participantes do teste realizado em 2022 no Reino Unido, 56 afirmaram que planejam manter a semana de trabalho de quatro dias após o fim do piloto.

Elas mencionaram benefícios como o aumento da produtividade e economias financeiras significativas para os funcionários, como os custos de transporte e creches.

Mas, embora a semana de trabalho de quatro dias possa parecer promissora em alguns setores, como o de tecnologia, ainda se questiona sua viabilidade em setores mais tradicionais.

Na área ambiental, a economista e socióloga Juliet Schor, do Boston College, nos Estados Unidos, e pesquisadora-chefe da 4 Day Week Global que trabalhou em dois pilotos (no Reino Unido e nos EUA), defende que a semana de trabalho mais curta é fundamental para atingir a redução de emissões de carbono de que o mundo precisa.

Empresas que participaram do teste no Reino Unido observaram redução de 10% do tempo de deslocamento; nos EUA, ela foi ainda maior: 27%

“Os benefícios climáticos são os mais difíceis de se avaliar, mas temos muitas pesquisas indicando que, ao longo do tempo e à medida que os países diminuem as horas de trabalho, suas emissões de carbono também são reduzidas”, afirma ela.

Uma redução de 10% das horas de trabalho representa uma queda de 8,6% da pegada de carbono, segundo um estudo de 2012, do qual Schor é uma das autoras.

Um dos fatores que mais contribuíram com os benefícios climáticos da semana de trabalho de quatro dias foi a redução dos deslocamentos.

Dados do teste realizado no Reino Unido obtidos pela BBC revelam redução de 10% ao longo do período piloto, de 3,5 horas para 3,15 horas por semana, entre as companhias que acompanharam o tempo de deslocamento. É uma redução significativa, mas a economia pode atingir 15-20%, segundo Schor.

No teste americano, também realizado em 2022, a redução foi ainda maior, de 3,56 para 2,59 horas por semana — uma queda de 27%.

Os dados do Reino Unido também demonstram que a mudança para a semana de trabalho mais curta gerou aumento das ações em prol do meio ambiente. Os participantes do teste passaram mais tempo em trabalhos voluntários para causas ambientais e cuidaram mais da reciclagem e da compra de produtos ecológicos.

Riscos e benefícios

Ter mais dias sem trabalhar no futuro é ideal para o planeta, então?

Calma, a resposta não é tão simples. Alguns especialistas ressaltam que a redução das horas de trabalho pode apresentar outros riscos para o meio ambiente.

É difícil prever como cada pessoa irá utilizar seu dia de folga adicional. Elas podem embarcar em um voo internacional altamente poluente para comemorar sua sexta-feira de descanso remunerado.

“O fim de semana de três dias pode gerar maior consumo de bens e serviços com uso intensivo de carbono”, afirma Anupam Nanda, professor de economia urbana e imobiliária da Universidade de Manchester, no Reino Unido..

Ele menciona um estudo que demonstrou que as pessoas na Europa e na América do Norte têm pegada de carbono menor no fim de semana.

Segundo o estudo, as emissões de domingo na Europa e na América do Norte, de forma geral, ficaram 40% abaixo da média, enquanto as emissões durante a semana de trabalho foram cerca de 20% maiores que a média.

As emissões de carbono no fim de semana não diminuíram no leste asiático.

“Precisamos investir em infraestrutura verde”, segundo ele. “Instalações ecológicas e espaços verdes na vizinhança devem ser criados nas áreas urbanas, para incentivar as pessoas a passar seu tempo livre de forma sustentável.”

O que vem pela frente?

A semana de quatro dias de trabalho realmente é algo que todas as empresas podem adotar?

“Na prática, não há desvantagens e sua adoção generalizada é viável”, segundo Jon Leland, mas “é preciso coragem para fazê-lo”.

Às vezes, os empregadores precisam apenas de um empurrãozinho. É aqui que as ações do governo entram em cena.

“É preciso ter ações políticas para direcionar esta grande mudança. Os governos nacionais precisam mostrar o caminho”, afirma Philipp Frey.

Recentemente, o governo espanhol confirmou que irá pagar até 150 mil euros (cerca de R$ 828 mil) para as empresas de pequeno e médio porte que testarem a semana de trabalho de quatro dias.

Frey ressalta que o apoio governamental pode também materializar-se de outras formas, como reduzindo por lei o limite máximo de horas de trabalho ou com o próprio governo agindo como pioneiro.

“O setor público é um dos maiores empregadores em todos os países europeus”, explica ele. “Se ele oferecer a semana de quatro dias [aos seus servidores], as empresas particulares precisarão ficar competitivas para atrair funcionários.”

Além disso, quanto mais empresas se aventurarem neste campo, mais os governos serão pressionados a agir.

Fonte: BBC News.

Foto: Getty Images.