Nas eleições de 2018, 422 candidatos em todas as Unidades da Federação receberam doações de pessoas e sócios de empresas ligadas a crimes ambientais na Amazônia; 156 deles foram eleitos.
Mato Grosso foi o líder em doações: 62 candidatos receberam R$ 6 milhões de infratores multados pelo IBAMA. Total das multas por crimes ambientais desses financiadores supera R$ 260 milhões.
A campanha à eleição do atual governador, Mauro Mendes, recebeu R$ 1 milhão provenientes de infratores ambientais. Seu mandato tem sido marcado por polêmicas, como o envolvimento com mineradoras na Chapada dos Guimarães e a instalação de hidrelétricas no Pantanal.
Em março passado, começou a tramitar no Congresso um projeto de lei que prevê a retirada de Mato Grosso da Amazônia Legal para, assim, ampliar o desmatamento no estado.
Esse projeto de lei prevê retirar Mato Grosso da Amazônia Legal, o que liberaria uma área de 10 milhões de hectares para desmatamento. Autores do projeto estão entre os que foram financiados por criminosos ambientais nas últimas eleições.
Atualmente, donos de imóveis rurais por lá devem preservar 80% da área de suas propriedades, mas, caso a proposta vire lei, terão de manter intactos apenas 35% de suas terras. Para se ter ideia, a nova lei liberaria uma área de 10 milhões de hectares para desmate, algo equivalente aos estados de Espírito Santo e Rio de Janeiro somados.
O mesmo levantamento também destaca o valor total de punições aplicadas pelo Ibama em Mato Grosso. Doadores a campanhas eleitorais em 2018 respondiam por mais de R$ 260 milhões em multas por crimes ambientais no estado.
As descobertas constam em uma análise do instituto de pesquisa independente Plataforma Cipó em parceria com o estúdio de inteligência em dados Lagom Data.
O levantamento expõe as relações entre infratores ambientais — multados ou que tiveram parte de suas terras embargadas — e o financiamento de candidatos a cargos executivos e legislativos nas eleições passadas em todo o país.
Para a cofundadora e diretora de Programas da Plataforma Cipó, Maiara Folly, “a concentração de recursos [doados por infratores ambientais] em Mato Grosso coincide, de fato, com um cenário de retrocesso na pauta ambiental”.
Ao todo, 62 candidatos aos cargos de governador, deputado estadual, federal, senador, 1º e 2º suplentes em Mato Grosso foram financiados por infratores ambientais naquelas eleições. Destes, 19 se elegeram, incluindo também o atual candidato à reeleição para o governo estadual, o empresário Mauro Mendes (União Brasil).
O mesmo levantamento ainda revela a influência desses políticos eleitos na atual legislatura. Desde 2019 eles ocuparam metade da Assembleia Legislativa Estadual, cinco das oito vagas de Mato Grosso para a Câmara e um dos seus dois cargos no Senado.
Situado no encontro entre Amazônia, Cerrado e Pantanal, o estado também concentrou o maior volume de doações de infratores ambientais nas eleições passadas, quase R$ 6 milhões ao todo. Na sequência vêm Rondônia, com R$ 4,3 milhões; São Paulo, com R$ 1,6 milhão; e Tocantins, com outro R$ 1,5 milhão de multados pelo IBAMA.
“É preciso que a sociedade demande não apenas que seus candidatos se posicionem a favor e apresentem medidas para coibição dos crimes ambientais, como também exerça pressão por transparência sobre o histórico socioambiental de candidatos a cargos públicos e de seus respectivos financiadores”, afirma a diretora da Plataforma Cipó.
No total, 422 candidatos em todas as unidades da federação receberam doações de pessoas e sócios de empresas ligadas a crimes ambientais na Amazônia. Destes, 156 foram eleitos em 2018 e somente o Sergipe não elegeu candidatos financiados por multados pelo IBAMA.
Fato é que a trajetória de Mauro Mendes é marcada por polêmicas quanto à proteção do meio ambiente e ao uso de recursos naturais. Após ser empossado como governador, a Agência Pública revelou suas ligações com uma problemática mineradora de ouro no entorno do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães.
O caso envolvia uma barragem de rejeitos sob potencial risco de rompimento no local, além de um nebuloso acordo para a compra da mina, negócio sob julgamento da 3ª Vara da Justiça Federal no estado.
Recentemente, mais polêmicas. Mendes teria atuado em favor da instalação de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) em um dos principais rios do Pantanal. O governador teria pressionado agências reguladoras para liberarem as obras, que favorecem sua família – seu filho seria dono de uma PCH na região, segundo a Agência Pública.
Um dos grandes nomes do agronegócio se destaca entre os infratores ambientais que financiaram campanhas em 2018. Trata-se de Elizeu Zulmar Maggi Scheffer, um dos vinte maiores doadores naquele pleito que já foram punidos por crimes ambientais.
Em março de 2002, Elizeu foi multado pelo Ibama por desmatamento ilegal em Sapezal (MT), extremo noroeste do estado. Mandatário do grupo Scheffer, ele é irmão de Eraí Maggi, o “rei da soja” no Brasil, e primo do ex-governador mato-grossense Blairo Maggi.
Elizeu Scheffer doou R$ 470 mil a quatro candidatos pelo estado de Mato Grosso nas eleições de 2018. Dois concorriam à Câmara dos Deputados, enquanto os outros disputavam vagas de suplente na Assembleia Legislativa.
Do valor doado, a maior parte bancou as campanhas de nomes fortes da bancada ruralista, os deputados José Medeiros (PL) e Neri Geller. Medeiros recebeu R$ 150 mil e Geller angariou outros R$ 100 mil.
Segundo o portal Congresso em Foco, Medeiros é dos parlamentares mais fiéis às pautas bolsonaristas. Ele seguiu orientações do governo em 97% das votações e tomou parte em projetos nocivos ao meio ambiente segundo especialistas— como uma proposta que visa impedir a destruição de máquinas apreendidas em fiscalizações do Ibama.
Para Folly, as descobertas relativas ao pleito de 2018 mostram que “é muito importante aumentar a transparência e investigar mais a fundo a atuação parlamentar na área socioambiental dos candidatos eleitos que receberam financiamento de infratores ambientais”.
Fonte: Mongabay.
Foto: Divulgação.