Milhões de cabeças de gado abatidas para a produção de carne no Brasil passaram pelo menos parte de suas vidas em pastagens ilegais, sobretudo em áreas protegidas da Amazônia brasileira, incluindo terras indígenas. Esse é um dos dados alarmantes de um estudo conduzido pela Universidade de Wisconsin-Madison (UW-Madison), nos Estados Unidos, e a Universidade de Vrije, na Holanda.
Publicada na revista Conservation Letters na última segunda-feira (17), a pesquisa usou dados de pecuaristas e frigoríficos no Brasil, que são obrigados pela lei a compartilhar os locais por onde os animais são transportados. Ao associá-los a registros de propriedade, os pesquisadores puderam identificar onde o gado pastou durante sua vida, e se isso aconteceu dentro de áreas protegidas.
A equipe cruzou dados de movimentação de animais em registros de propriedade com mapas de áreas protegidas nos estados de Mato Grosso, Pará e Rondônia. O resultado foi que, entre 2013 e 2018, mais de 1 milhão de cabeças de gado foram comercializadas diretamente de áreas protegidas localizadas nos três estados para os frigoríficos.
“As áreas protegidas são a pedra angular dos esforços de conservação do Brasil e são, sem dúvida, a maneira mais eficaz de conservarmos as florestas e a biodiversidade ali existentes,” afirma Holly Gibbs, professora de geografia da UW-Madison, em comunicado. “É alarmante que os frigoríficos continuem a comprar de propriedades em áreas que estão sob rigorosa proteção.”
Além disso, 2,2 milhões de cabeças de gado foram indiretamente associadas a áreas protegidas, indicando que os animais passaram uma parte da vida nessas áreas antes de serem comprados pelos frigoríficos.
Outro alerta feito pela pesquisa é em relação à falta de transparência de dados recentes sobre essa questão. A análise das movimentações de gado terminou em 2018; depois disso, encontrar esses registros públicos ficou cada vez mais difícil. “No início de 2019, essa informação crítica tornou-se menos disponível,” diz Gibbs.
Entretanto, imagens de satélite analisadas pela Agência Espacial Brasileira indicam que as taxas de desmatamento aumentaram quase 50% de 2018 a 2020, com quase três quartos das perdas ocorrendo nos estados cobertos por esse estudo.
A pesquisadora reforça que enquanto o governo federal brasileiro limitar o acesso aos dados nacionais será mais fácil para os frigoríficos continuarem violando seus compromissos de evitar o gado das áreas protegidas. Para ela, voltar com a transparência de dados de movimentação de gado é fundamental para garantir que os frigoríficos brasileiros possam avançar em direção a seus compromissos públicos.
Fonte: Revista Galileu.
Foto: Etienne Girardet/ Unsplash.