A presença de garimpeiros com balsas atuando na extração de ouro ao longo do rio Madeira não é novidade. Porém a grande quantidade de dragas e balsas operando no mesmo trecho chamou atenção, e a imagem impressiona. Moradores da região relatam que garimpeiros começaram a compartilhar, nas últimas semanas, a notícia de que haveria ouro naquele trecho específico, de maneira informal. Eles começaram a chegar ao local há cerca de 15 dias.
Apenas duas semanas se passaram desde que o Brasil se comprometeu com medidas de proteção ambiental durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 26). O cenário que se vê no país, no entanto, é bem diferente da imagem de preocupação com o meio ambiente que o Governo Federal tentou vender para as grandes potências “É um crime ocorrendo à luz do dia, sem o menor constrangimento”, afirma Danicley Aguiar, porta-voz da campanha Amazônia do Greenpeace, que sobrevoou a região para averiguar a denúncia de crime ambiental, em nota divulgada à imprensa.
O local é bastante estratégico, uma vez que a distância da capital dificulta fiscalização. “O Madeira é o rio com a maior biodiversidade no mundo. Abriga pelo menos 1.000 espécies de peixes já identificadas. Trata-se de um gigante que agoniza com hidrelétricas e uma epidemia de garimpo que nunca foi contida”, afirmou Aguiar.
Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil explicam que a “invasão” do rio Madeira por garimpeiros ilegais acontece por uma conjunção de fatores, como: aumento no preço do ouro, queda na fiscalização ambiental, discursos e ações governamentais simpáticas à atividade e facilidade para “esquentar” o ouro ilegal.
As imagens do rio Madeira chamaram atenção porque evidenciam o avanço dos garimpos ilegais nos rios da Amazônia, movimento que ocorre há vários anos, mas que ambientalistas afirmam ter se intensificado durante o governo do presidente Jair Bolsonaro.
O Greenpeace atribui a audácia da exploração do rio Madeira à luz do dia à licença “política e moral” dada por Bolsonaro. Mourão afirma que atividade pode estar ligada ao narcotráfico.
Segundo pesquisa divulgada pelo MapBiomas, entre 1985 e 2020 a área minerada no Brasil cresceu seis vezes, passando de 31.000 para 206.000 hectares, e o garimpo ilegal já ocupa uma área maior que a da mineração industrial. No ano passado, três de cada quatro hectares minerados no país estavam na Amazônia, pressionando especialmente os territórios indígenas. Em dez anos, a área ocupada pelo garimpo dentro de terras indígenas cresceu 495%; em unidades de conservação, o crescimento foi de 301%. O bioma concentra hoje 72,5% de toda mineração feita no país: são 149.393 hectares, sendo que, destes, 101.100 (67,6%) são de garimpo ilegal.
Os garimpos ilegais no rio Madeira não são uma novidade. A atividade vem sendo exercida na região há décadas, mas inicialmente ela se concentrava mais próxima ao estado de Rondônia, que também é cortado pelo rio. Agora ela vem avançando também pelo território do Amazonas, mais especificamente entre os municípios de Borba, Nova Olinda do Norte, Novo Aripuanã e Autazes.
A extração ilegal acontece com a utilização de balsas que são verdadeiras dragas, as quais reviram o leito do rio em busca de ouro. Para separar o minério das impurezas, eles frequentemente utilizam o mercúrio, uma substância tóxica que é jogada na água e causa danos para toda a cadeia alimentar. O metal tem efeito cumulativo e pode causar doenças neurológicas.
Em nota enviada à BBC News Brasil, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) disse que uma ação de combate aos garimpeiros ilegais está sendo organizada pela Polícia Federal na região e deverá ser deflagrada nos próximos dias.
Uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) divulgada em junho deste ano mostra que houve uma queda de 43,5% na média anual de multas aplicadas pelo Ibama na Amazônia entre os anos de 2019 e 2020 na comparação com o período entre 2012 e 2018.
A sensação de impunidade na Amazônia é tão grande que os invasores não estão mais indo pra regiões remotas. Esse garimpo do rio Madeira fica a pouco mais de 120 km de Manaus. É perto da sede do Ibama, da Polícia Federal, da Marinha.
Fontes: El País, G1, BBC, Ambiente Brasil.