Cientistas de todo o mundo se uniram em um manifesto que pede um tratado jurídico global para combater o acúmulo de lixo espacial na órbita da Terra, considerado por eles como uma bomba-relógio para a humanidade devido à expansão da indústria espacial. O documento foi lançado em 09 de março (9/3/24) e publicado na revista Science.
A preocupação da comunidade científica não é nova, mas se intensificou nos últimos anos após a identificação de uma escala crescente de satélites enviados para a órbita do planeta: de 2 mil em 2018, o número saltou para 9 mil satélites (em 2023) — e estima-se que chegará a 60 mil até 2030.
A predição revela um problema grave, já que são os satélites — e as naves que os levam à órbita — que causam o maior montante de lixo espacial, seja por partes dele deixados para trás quando são lançados ou por aqueles que já foram desativados e abandonados ao redor do planeta. O cenário se agrava com a estimativa dos cientistas de que existem mais de 100 trilhões de peças de satélites antigos não rastreadas que circulam em volta da Terra.
Em 2016, o astronauta Tim Peake, da Agência Espacial Europeia (ESA), compartilhou a foto de um trincado em uma das janelas da Estação Espacial Internacional, causada por um detrito espacial.
No caso da grande nave, o objeto não causou estragos porque o local é revertido com janelas multicamadas, mas revelou o perigo do lixo espacial. Mesmo que sejam menores que três centímetros, os detritos podem causar estragos e desativar sistemas de satélite.
Os satélites são essenciais para a Terra porque são responsáveis pela distribuição de sinais de telefonia, internet e televisão (satélite de comunicação); por viabilizar o GPS (satélites de navegação); por monitorar o tempo e o clima da Terra, sendo capazes de dar alertas de tempestades, ciclones, furacões e queimadas; e por monitorar o território da Terra por completo.
Assim, o lixo espacial pode causar danos em serviços essenciais aos humanos disponibilizados por satélites já existentes, além de criar um ambiente inóspito para o lançamento de novos e necessários satélites.
Lixo espacial também traz riscos físicos para seres humanos
Os detritos espaciais não são um problema apenas de caráter espacial: os cientistas alertam sobre o risco dos detritos entrarem na atmosfera da Terra e caírem em diferentes locais do planeta, causando níveis diferentes de destruição.
Os riscos promovidos pelo lixo espacial podem ser tão prejudiciais que é comparado, pelos cientistas, com a população dos mares, urgência ambiental que coloca em risco a Terra e os seres humanos.
“A questão da poluição plástica e muitos outros desafios enfrentados por nossos oceanos agora estão atraindo a atenção global. No entanto, tem havido uma ação colaborativa limitada e a implementação tem sido lenta. Agora estamos em uma situação semelhante com o acúmulo de detritos espaciais”, compara Imogen Napper, cientista marítima e pesquisadora da Universidade de Plymouth que liderou o manifesto com apoio da National Geographical Society.
“Levando em consideração o que aprendemos em alto mar, podemos evitar cometer os mesmos erros e trabalhar coletivamente para evitar uma tragédia dos comuns no espaço. Sem um acordo global, poderíamos nos encontrar em um caminho semelhante”, alerta a especialista.
O chefe da Unidade Internacional de Pesquisa de Lixo Marinho da Universidade de Plymouth Richard Thompson ressalta que a poluição marítima poderia ter sido evitada e o esforço dele e dos colegas é mostrar ser possível o combate ao lixo espacial, desde que haja proatividade.
“No futuro, precisamos assumir uma postura muito mais proativa para ajudar a proteger o futuro do nosso planeta. Há muito que pode ser aprendido com os erros cometidos em nossos oceanos que são relevantes para o acúmulo de detritos no espaço”, relata Richard.
O grupo de pesquisadores propõe um acordo no qual sejam definidas medidas para implementar a responsabilidade do produtor de naves e satélites espaciais, assim como também os compradores deles — uma das ideias é ampliar o uso de materiais sustentáveis nas máquinas para que se desintegrem e não perpetuem no Universo. O mesmo tem sido visto nos acordos de colaboração de combate à poluição marítima.
“Os satélites são vitais para a saúde de nosso povo, economias, segurança e da própria Terra. No entanto, usar o espaço para beneficiar as pessoas e o planeta está em risco. Ao comparar como tratamos nossos mares, podemos ser proativos antes de prejudicar o uso do espaço para as gerações futura”, alega Melissa Quinn, chefe da empresa britânica de lançamento de satélites Spaceport Cornwall
A empresária ressalta que os líderes de empresas e de governos ao redor do mundo se juntem à responsabilidade do combate ao lixo espacial. “A humanidade precisa assumir a responsabilidade por nossos comportamentos no espaço agora, não mais tarde. Encorajo todos os líderes a tomarem nota, reconhecerem a importância deste próximo passo e se tornarem conjuntamente responsáveis”, acrescenta Melissa.
O manifesto, publicado em formato de artigo, foi co-escrito por cientistas pesquisadores da Universidade de Plymouth, da Iniciativa Arribada, da Universidade do Texas em Austin, do do Instituto de Tecnologia da Califórnia, do Laboratório de Propulsão a Jato da NASA, Spaceport Cornwall e da Sociedade Zoológica de Londres.
Fontes: Correio Brazilience, Canaltech, G1.
Imagem: Stuart Grey/University College London.