Mata Atlântica perde 2,4 milhões de hectares em 40 anos

Bioma com menor cobertura vegetal natural do país, a Mata Atlântica chega aos nossos dias com apenas 31% de sua cobertura original preservada. Dos restantes 69%, 67% já se transformaram em algum tipo de uso humano — e a agricultura se destaca como a classe de uso da terra que mais cresceu no bioma, quase dobrando de área entre 1985 e 2024. A constatação consta no mais recente levantamento da Coleção 10 de mapas de cobertura e uso da terra do MapBiomas, divulgado nesta terça-feira (28/10), que monitora quatro décadas de mudanças no bioma.

“A vegetação natural da Mata Atlântica foi suprimida para abrir espaço para atividades humanas desde o início da colonização. Em 1985, ano de início da nossa série histórica, o bioma tinha apenas 27% de sua área florestal original”, explica Natalia Crusco, da equipe Mata Atlântica do MapBiomas. De lá para cá, o ritmo de desmatamento variou ao longo das quatro décadas que se estendem até 2024. “Depois da promulgação da Lei da Mata Atlântica é possível notar inclusive um ligeiro aumento na área florestada do bioma”, adiciona.

No Rio Grande do Norte, a Mata Atlântica tem no Parque Estadual das Dunas, em Natal, o importante exemplo de preservação. Com uma área de aproximadamente 1.172 hectares, o parque representa um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica no estado. A área tem relevância ambiental e urbana, e resiste para manter a integridade da vegetação nativa, a recarga dos aquíferos e a biodiversidade que abriga.

Parte da área está no centro de polemica que levantada pela Prefeitura de Natal que quer instalar um “Parque Linear” ao longo da Avenida Engenheiro Roberto Freire sem considerar as questões técnicas que envolvem a área. A proposta municipal prevê usar cerca de dez hectares dentro dos limites da unidade de conservação para lazer e convivência urbana. O Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN (Idema), aponta que aproximadamente 60% dessa área se encontra em Zona Primitiva 3 do parque — segmento destinado à preservação integral, onde construções permanentes são vedadas pelo plano de manejo —, defendendo que o parque linear seja transferido para outro trecho mais adequado da unidade.

Estudo avaliou quatro décadas

A primeira década analisada (1985-1994) concentrou a maior perda: 4,7 milhões de hectares de floresta foram convertidos para agropecuária — uma queda de 7% na cobertura florestal do bioma. Na sequência, entre 1995 e 2004, a área desmatada recuou cerca de 40% em comparação à década anterior, com 2,9 milhões de hectares convertidos nesse período. Já no intervalo de 2005 a 2014 é possível identificar os efeitos da legislação: houve ganho líquido de 200 mil hectares de vegetação florestal, ou seja, mais área foi recuperada do que convertida. Contudo, entre 2015 e 2024 o panorama volta a requerer atenção: as áreas de desmatamento e de recuperação passam a se equiparar, apesar da vigência do Código Florestal Brasileiro de 2012.

No total, ao longo de 40 anos, a perda de área florestal (florestas maduras) soma 2,4 milhões de hectares — o que equivale a uma diminuição de 8,1% em relação à área mapeada em 1985. Embora o ritmo de desmatamento tenha diminuído em parte, os últimos cinco anos revelam uma média de 190 mil hectares de floresta desmatada por ano, sendo cerca de 50% dessa perda concentrada em florestas maduras com mais de 40 anos de idade — que são essenciais para biodiversidade, estoque de carbono e outros serviços ecossistêmicos.

Quando consideramos todas as categorias de vegetação nativa (incluindo formações campestres costeiras), a perda acumulada entre 1985 e 2024 atinge 11,5%. Apenas dois estados — Rio de Janeiro e São Paulo — registraram aumento na área de vegetação nativa no período. Em 2024, os estados que mais preservavam proporção de vegetação nativa na Mata Atlântica eram Santa Catarina (45 %), Rio Grande do Sul (40 %) e Bahia (39 %).

No ano de 2024, último da série histórica disponibilizada pelo MapBiomas, o bioma apresentava 25,3% de sua área sob floresta, mangue ou restinga; 25% sob pastagens; 19% sob agricultura; e 17% sob mosaico de usos. Dentro das classes de uso humano, a agricultura assume posição de destaque: em 2024, a Mata Atlântica concentra cerca de 33% da agricultura brasileira — com aumento de 96% da área agrícola desde 1985, o que representa cerca de mais 10 milhões de hectares ocupados nesse período. A maior parte desse avanço se deu sobre áreas de pastagem — que perderam 8,5 milhões de hectares — e cerca de 10% dessa nova área agrícola se estabeleceu sobre vegetação natural previamente intacta.

No segmento das lavouras temporárias — que respondem por cerca de 95% da agricultura no bioma — a cultura da soja cresceu 343% entre 1985 e 2024 (ganho de 8,3 milhões de hectares), fazendo com que a Mata Atlântica responda por 26% da área nacional de soja cultivada (com o estado do Paraná respondendo por 52% desse total). A cana-de-açúcar, por sua vez, expandiu em quase 5 milhões de hectares (256%) nesses 40 anos, com o bioma abrigando 66% da área nacional de cana e São Paulo respondendo por 68% dessa plantação na Mata Atlântica.

Nas lavouras perenes, o café cresceu 105% no bioma (adição de 445 mil hectares) — que reúne 70% da área nacional de café — com Minas Gerais detendo 62% desse cultivo dentro da Mata Atlântica. O citrus ampliou 200% (mais 96 mil hectares), com o bioma agregando 36% da área nacional desse cultivo, sendo que São Paulo concentra 88% desse total. A silvicultura — cultivo de árvores para fins comerciais — multiplicou sua área por cinco (crescimento de 3,6 milhões de hectares em 40 anos), alcançando 4,5 milhões de hectares em 2024. Mais da metade da silvicultura nacional (51 %) está na Mata Atlântica; os estados de Santa Catarina, Paraná e Bahia concentram mais de 60% dessa atividade no bioma. Cerca de 57% da área de silvicultura já era entronizada em 1985.

E a urbanização completa o cenário: a Mata Atlântica concentra 51% da área urbanizada do Brasil em 2024 — que mais que dobrou (+133%) nos últimos 40 anos, com acréscimo de cerca de 1,3 milhão de hectares de solo urbano. Setenta e sete por cento dos municípios viram sua área urbanizada crescer até cinco vezes desde 1985, sendo que 10% desse crescimento se deu sobre áreas naturais. No entanto, mais de 80% dos municípios da Mata Atlântica têm áreas urbanizadas menores que mil hectares; apenas três capitais — São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba — ultrapassam os 30 mil hectares de área urbana.

Este panorama demonstra que, embora o ritmo de desmatamento tenha sido reduzido em parte, o desafio de preservar o bioma permanece substancial — sobretudo se considerarmos unidades de conservação como o Parque das Dunas, no Rio Grande do Norte, cujo papel como refúgio da Mata Atlântica no contexto urbano é crucial frente às pressões de uso da terra.

Fonte: Saiba Mais, g1, ClimaInfo.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil.

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