Os cavalos já foram o problema de poluição em Nova York

No final do século 19, a poluição causada pelos cavalos era um enorme problema em Nova York, o sistema estava para colapsar, mas a mudança parecia distante. Como agora, com a questão climática.

Com a segunda revolução industrial e, consequente, urbanização, a economia demandava movimento massivo de bens e pessoas. Isso era feito por cavalos.

Para terem ideia, em 1870, os EUA tinham quase 9 milhões de cavalos, 1 para cada 5 pessoas. Todas as pessoas dependiam dos equinos.

Em 1872, o nordeste do país foi acometido por um vírus que matou milhares de animais e obrigou os outros a paralisarem as atividades. Foi um caos. Não havia alimentos nos supermercados, remédios, cerveja, as pessoas não conseguiam se locomover. As construções pararam. Uma demonstração clara da dependência da economia norte-americana dos cavalos.

Apesar desse cenário, mesmo à época parecer inadequado, antiquado, não havia muito o que fazer.

A poluição era o grande problema. Em 1908, os 150 mil equinos de Nova York produziam diariamente 1 milhão de quilos de estrume e 2 milhões de litros de urina. Além dos animais que morriam e, muitas vezes, eram deixados pela rua. Um problema sanitário enorme.

Os riscos eram gigantescos. Questões sanitárias, disrupção de cadeia de valor, legislações cada vez mais rigorosas, insatisfação crescente da população etc.

No entanto, a substituição por novas tecnologias não parecia muito próxima e havia lobby de muita gente: criadores de cavalos, carroceiros, operadores de bondes, fabricantes de carruagens, tosadores, cocheiros, comerciantes de rações, seleiros, fabricantes de rodas, ferradores, ferreiros, fabricantes de chicotes para charretes, veterinários, limpadores de rua e os fazendeiros que plantavam grãos e feno.

Os riscos eram claros e se materializavam com grande frequência. Olhando para trás, parecia tudo muito óbvio, não é? Transição inevitável, certo?

Numa escala infinitamente menor, me parecem os problemas e discussão relacionadas à crise climática.

A ciência é clara, mas preferimos não encarar o problema de frente.

Havia ali muitas oportunidades também, Henry Ford que o diga, no entanto, a agenda era majoritariamente de riscos.

Nesse sentido, cada vez mais líderes empresariais vão às conferências de clima (COPs) e os que não vão ficam com profundo FOMO (feeling of missing out).

“Em toda crise há muita oportunidade”, “há muito dinheiro com o mercado de carbono”, “é a hora do Brasil”, “temos uma matriz energética, elétrica que dá inveja a qualquer economia”. Essas são frases recorrentes nos discursos sobre a crise climática nos corredores da COP27. Estão errados? Não estão, são muito acuradas, por sinal.

A própria carta de capa do Plano de Implementação de Sharm El-Sheikh destaca que, para a transição para um economia de baixo carbono, são necessários de US$ 4 trilhões a US$ 6 trilhões anuais de investimentos. Ou seja, muita oportunidade de negócio.

Segundo a TCFD (Força Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas à Mudança do Clima) – principal referência no tema –, os riscos para o negócio podem ser divididos em riscos físicos e de transição.

Os físicos são divididos em agudo (ciclone, furacões, etc) e crônico (mudança no perfil hidrológico, elevação na temperatura e aumento do nível do mar). Os riscos de transição são: riscos legais e regulatórios, tecnológicos e de mercado;

Dessa publicação, alguns exemplos para materializar:

Um conglomerado descobriu que eventos climáticos extremos poderiam custar várias centenas de milhões de dólares por ano até 2030. A maior parte da exposição ao risco da empresa está em sua cadeia de suprimentos e fora de seu controle direto.

Um grande varejista identificou dezenas de suas instalações críticas com risco elevado de clima extremo e viu como uma transição global para uma economia de baixo carbono poderia mais do que dobrar os custos de transporte da empresa até 2030.

No Brasil, poderíamos mencionar o sufoco que várias empresas têm passado com estresse hídrico em algumas regiões, seja pela falta de água ou pelo conflito com a sociedade local. Ainda, quebra de safras no Sul e Centro-Oeste.

Essa discussão parece antiga, mas não é. O número de empresas com um mapeamento de riscos climáticos é muito pequeno. Ou mesmo, empresas com inventário de gases de efeito estufa, 30% das empresas listadas no Ibovespa.

O problema de focar apenas em, por exemplo, crédito de carbono, é que muitas empresas estão desenvolvendo seu projeto, outras estão lançando títulos de dívidas relacionados a metas de redução de gases de efeito estufa, mas sem ter uma governança climática. Ou seja, mergulhar a fundo no tema, com inventário e diagnósticos, trazendo diversas áreas da empresa para discutirem.

Fonte: Um Só Planeta.

Foto: Getty Images.