A entidade manifesta “profunda preocupação com os rumos da discussão acerca da liberação dos agrotóxicos nos termos do texto do PL 6299/2002 aprovado pela Câmara dos Deputados e em tramitação no Senado. A liberação e o uso de tais produtos devem ser fortemente fiscalizados, com regramentos claros e melhoria da estrutura fiscalizatória dos órgãos competentes”
O Brasil é um dos países que mais consomem agrotóxicos em suas mesas. Estes agrotóxicos trazem danos enormes à saúde da população, aos rios e aos ecossistemas. Muitos agrotóxicos que são proibidos em outros países por conhecidos danos à saúde da população são largamente utilizados em nosso país. O agronegócio brasileiro não deve se limitar a aumentar seus lucros no curto prazo, em detrimento do meio ambiente e da saúde da nossa população. Em fevereiro de 2022, a Câmara de Deputados aprovou o Projeto de Lei 6299/2002 que altera importantes artigos da Lei 7802, conhecida como Lei dos Agrotóxicos. As fragilidades e retrocessos do PL aprovado na Câmara já têm sido amplamente apontados pela comunidade científica. O PL modifica o sistema de registro de agrotóxicos, retira poder da ANVISA e IBAMA, e traça novas regras sobre a pesquisa, experimentação, produção, rotulagem, transporte, armazenamento, comercialização, utilização, importação e exportação, assim como, o destino final dos resíduos e das embalagens de agrotóxicos no Brasil.
Entre os aspectos que tornam seu conteúdo altamente preocupante, estão o afrouxamento das exigências e prazos impostos pelos órgãos governamentais competentes na análise do uso destes agrotóxicos. Também suaviza a utilização de nomenclatura que deixa clara à população a reconhecida toxicidade e ecotoxicidade destes compostos. Além disso, centraliza as tarefas de análise, aprovação e fiscalização destes produtos no Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), excluindo o poder decisório dos órgãos governamentais de saúde e meio ambiente, como a ANVISA e o IBAMA.
O PL propõe alterações no tocante à criação do Registro Temporário (RT) e da Autorização Temporária (AT) baseado no não atendimento do prazo de 24 meses para conclusão dos pleitos de registro de novos agrotóxicos. A emissão do RT e da AT tem como base autorizar produtos autorizados em pelo menos três países-membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), quando o solicitante tiver cumprido o estabelecido nesta Lei, mas sem a manifestação conclusiva pelos órgãos responsáveis pelos setores da agricultura, do meio ambiente e da saúde nos prazos estabelecidos. Salienta-se que as autorizações serão de exclusiva competência do MAPA, os órgãos de saúde e ambiental poderão ser consultados, mas não terão poder de veto.
A nova redação trazida na lei pelo PL, traz elementos subjetivos ao não pontuar claramente sobre a aceitabilidade do risco e deixa de exigir critérios claros para proibição ou aprovação do registro dos agrotóxicos. Alguns destes critérios deveriam ser a) que revelem características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas; b) que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor; c) que se revelem mais perigosos para o homem do que os testes de laboratório, com animais, tenham podido demonstrar; d) cujas características causem danos ao meio ambiente.
Em 2018, o IBAMA e a ANVISA já haviam apontado a inconstitucionalidade da proposta e as falhas que prejudicam a fiscalização dos produtos, colocando em risco a saúde da população. Outro ponto crítico, é que o PL reduz e subjuga a competência dos órgãos técnicos governamentais de saúde e meio ambiente ao órgão responsável pela agricultura, retirando a paridade e autonomia desses órgãos.
Assim, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, ouvindo o seu Grupo de Trabalho de Meio Ambiente, manifesta profunda preocupação com os rumos da discussão acerca da liberação dos agrotóxicos nos termos do texto do PL 6299/2002 aprovado pela Câmara dos Deputados e em tramitação no Senado. A liberação e o uso de tais produtos devem ser fortemente fiscalizados, com regramentos claros e melhoria da estrutura fiscalizatória dos órgãos competentes. O Ministério da Agricultura deveria agir de modo contrário ao conteúdo do PL, na direção de fornecer alimentos sem agrotóxicos para a população, e minimizando seu uso no campo. Este PL prejudica a saúde dos brasileiros, prejudica o meio ambiente, e a imagem da produção agropecuária brasileira no exterior. Os riscos certamente são grandes para o Brasil e o Senado deve bloquear este PL que prejudica os brasileiros.
Fonte: SBPC, ((O)) eco.