Vidas inspiradoras: personalidades que se foram em 2025 mas deixaram legado ambiental potente

De Jane Goodall, primatóloga que mudou para sempre a compreensão da relação entre humanos e natureza ao estudar os chimpanzés na África, ao Papa Francisco, que levou a crise climática ao centro da agenda ética, passando por cientistas, arquitetos, artistas e defensores da terra, diferentes trajetórias ajudaram a redefinir a forma como olhamos para o nosso planeta Terra.

Em campos distintos de atuação da ciência à espiritualidade, do ativismo local à formulação de políticas públicas, essas personalidades deixaram legados duradouros que seguem orientando debates, inspirando ações e influenciando gerações na defesa da vida e dos territórios.

Christopher Uhl

O ecólogo americano Christopher Uhl transformou a ciência amazônica ao fundar, em 1990, o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), uma das principais ONGs de pesquisa do mundo tropical. Nascido em 1949 na Pensilvânia, Uhl trouxe rigor científico e método draconiano de pesquisa, formando gerações de cientistas brasileiros que hoje publicam nos principais periódicos do mundo. Sob sua supervisão, foram realizados os primeiros experimentos de manejo sustentável de madeira na região.

Seu trabalho ajudou a embasar políticas de controle do desmatamento aplicadas na Amazônia desde o início do século. O Imazon, fundado com David McGrath, Paulo Barreto e Adalberto Veríssimo, investigou questões pioneiras como a ilegalidade no mercado de madeira e a relação entre economia e desmatamento. Mesmo após retornar aos Estados Unidos para lecionar na Universidade da Pensilvânia, seu legado seguiu vivo através do sistema independente de monitoramento por satélite criado pelo Imazon.

Jane Goodall

Jane Goodall foi uma das cientistas mais influentes do século XX e um dos maiores símbolos mundiais da conservação da vida selvagem. Nascida em Londres, em 1934, a primatóloga britânica revolucionou a ciência ao iniciar, em 1960, um estudo de longo prazo com chimpanzés no Parque Nacional de Gombe, na Tanzânia. Sem formação acadêmica formal no início de sua carreira, ela desafiou protocolos científicos da época ao dar nomes — e não números — aos animais e ao reconhecer comportamentos complexos, como o uso de ferramentas, emoção, cooperação e violência, o que ajudou a redefinir a fronteira entre humanos e outros primatas.

Ao longo das décadas, Goodall ampliou sua atuação da pesquisa científica para o ativismo ambiental e educacional. Fundadora do Jane Goodall Institute, ela passou a defender a proteção de habitats, o bem-estar animal e a conexão entre conservação, justiça social e desenvolvimento sustentável. Seu trabalho inspirou programas de educação ambiental em mais de 60 países, incluindo o Roots & Shoots, voltado a jovens, e consolidou sua voz como referência ética global na defesa da biodiversidade, da empatia entre espécies e da responsabilidade humana diante da crise ambiental.

Papa Francisco

O Papa Francisco foi um dos líderes religiosos mais influentes na luta contra a mudança climática e a perda de biodiversidade. Em 2015, publicou a histórica encíclica Laudato si’, considerada a primeira “encíclica verde”, na qual pediu mudanças profundas nos estilos de vida e alertou que a Terra estava se tornando um “enorme depósito de lixo”. O pontífice defendeu a limitação do uso de recursos não renováveis, criticou a privatização da água e destacou que os mais pobres sofrem mais com a degradação ambiental.

Durante seu pontificado, Francisco participou ativamente de debates climáticos globais, incluindo a emblemática COP de Paris de 2015, que resultou no Acordo de Paris. Em 2023, publicou a exortação apostólica Laudate Deum, criticando duramente o negacionismo climático e alertando que o mundo se aproximava de um ponto de não retorno. Entre suas últimas ações ambientais, recebeu seu primeiro papamóvel elétrico e continuou pedindo urgência no enfrentamento da poluição e do uso de combustíveis fósseis.

Dalton Valeriano

O biólogo e pesquisador Dalton de Morisson Valeriano revolucionou o monitoramento da Amazônia durante seus mais de 40 anos como servidor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Formado em biologia pela UFRJ, com mestrado em sensoriamento remoto e doutorado em geografia, Valeriano foi responsável pela concepção do Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter), que abriu aos órgãos de fiscalização ambiental a possibilidade de monitoramento das florestas em tempo quase real.

Sua contribuição foi decisiva para o sucesso no enfrentamento do desmatamento ilegal, tendo estruturado o sistema Prodes a partir de 2000 e criado ferramentas que mudaram a história da gestão ambiental no Brasil. Dedicou sua vida a aperfeiçoar a metodologia de análise de imagens de satélite, transformando dados brutos em informações críticas. Seu trabalho garantiu que o Brasil possuísse um sistema de grande rigor científico, capaz de fornecer a base incontestável sobre a devastação da Amazônia ano após ano.

Niède Guidon

A arqueóloga Niède Guidon dedicou sua vida à pesquisa e à preservação da Serra da Capivara, no Piauí, revelando ao mundo pinturas rupestres que mudaram o conhecimento sobre o povoamento das Américas. Fundadora da Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM), ela identificou ao longo de sua carreira mais de 700 sítios pré-históricos, incluindo 426 paredes de pinturas antigas. Sua chegada à região, na década de 1970, transformou não apenas a arqueologia brasileira, mas toda a dinâmica social e econômica local.

Niède promoveu uma verdadeira revolução feminina no interior do Piauí, contratando mulheres para cargos de liderança e falando em proteção do meio ambiente numa época em que poucos discutiam o tema. Chamou atenção para a resiliência da caatinga e lutou por décadas para proteger e divulgar a riqueza arqueológica do Brasil. Sua atuação foi fundamental para o desenvolvimento da região, incluindo a criação da primeira universidade federal no interior do Nordeste, em São Raimundo Nonato.

Hipolito Quispehuaman

Hipolito Quispehuaman dedicou sua vida à defesa da Reserva Nacional de Tambopata, área de proteção ambiental ameaçada por atividades ilegais na região de Madre de Dios, no sudeste do Peru. Como integrante do Comitê de Gestão da reserva, ele atuava na linha de frente contra o avanço do desmatamento e da mineração ilegal em uma das regiões mais biodiversas do planeta. Sua morte, investigada como retaliação à sua atuação, expôs a vulnerabilidade dos defensores ambientais na Amazônia peruana.

A região de Madre de Dios tem sido marcada por conflitos envolvendo grileiros, garimpeiros ilegais e traficantes de drogas, com presença limitada do Estado. Segundo a organização Global Witness, pelo menos 54 defensores da terra e do meio ambiente foram assassinados no Peru desde 2012, mais da metade deles pertencentes a povos indígenas. O caso de Quispehuaman gerou forte indignação internacional e levou organizações de direitos humanos a exigir medidas urgentes do governo peruano.

Joanna Macy

A pesquisadora e ativista ambiental Joanna Macy foi uma referência mundial em filosofia ecológica, integrando espiritualidade, ciência e ativismo em sua abordagem sobre a crise climática. Estudiosa do budismo, a pensadora norte-americana criou “O Trabalho que Reconecta”, metodologia participativa que incentiva rodas de conversa, meditação e experiências terapêuticas para estimular a reconexão com a Terra. Seus livros, especialmente “Esperança Ativa”, tornaram-se guias fundamentais para educadores e ativistas ambientais.

Macy viveu com coragem e coração aberto diante do colapso ecológico, oferecendo uma abordagem que combinava profundidade filosófica com ação prática. Sua metodologia, baseada em presença, escuta, interdependência e compromisso com a vida, influenciou movimentos de educação ambiental em todo o mundo. Aos 96 anos, ela deixou um legado que lembra que a esperança não é um sentimento passivo, mas uma escolha ativa de se colocar a serviço da regeneração da vida.

Robert Redford

Além de ícone de Hollywood, Robert Redford foi um ativista ambiental pioneiro que, nos anos 1970, participou de campanhas vitoriosas contra projetos de rodovias e usinas poluentes em Utah. Seu ativismo ajudou a transformar áreas naturais em monumentos nacionais, protegendo paisagens que poderiam ter sido destruídas pelo desenvolvimento industrial. Redford usou sua fama e influência para chamar atenção às questões ambientais décadas antes de se tornarem tema central do debate público.

Fundador do Instituto Sundance em 1981 e idealizador do Festival de Cinema de Sundance, Redford também revolucionou o cinema independente americano, criando espaço para narrativas que frequentemente abordavam temas sociais e ambientais. Sua visão de que a arte poderia ser ferramenta de transformação social se manifestou tanto em seu ativismo direto quanto em sua promoção de cineastas que traziam consciência crítica para suas obras.

Kongjian Yu

O arquiteto e urbanista chinês Kongjian Yu foi considerado um dos mais influentes pensadores da atualidade, criador do conceito revolucionário das “cidades-esponja”. Sua abordagem pioneira utiliza a própria natureza para tornar áreas urbanas mais resilientes às condições climáticas severas, privilegiando grandes áreas alagáveis e vegetação nativa em vez da tradicional “infraestrutura cinza” de concreto. Fundador do premiado escritório de arquitetura Turenscape, Yu aplicou seu conceito em mais de mil projetos em 250 localidades.

Reconhecido mundialmente com prêmios como o IFLA Sir Geoffrey Jellicoe Award, o Cooper Hewitt National Design Award e o RAIC International Prize, Yu foi nomeado pela Forbes como um dos 50 líderes globais em sustentabilidade. Sua visão transformadora influenciou políticas públicas ambientais na China e em diversos países. Durante visita ao Brasil em 2024, após as enchentes no Rio Grande do Sul, ele compartilhou sua experiência e afirmou estar “orgulhoso de compartilhar como o planeta pode ser sustentável”, defendendo soluções baseadas na natureza para enfrentar os efeitos da crise climática.

José Roberto Manna de Deus

José Roberto Manna de Deus foi um conservacionista e ambientalista atuante na região do Alto Tietê, em Mogi das Cruzes. Dedicado à causa ambiental, ele trabalhava na proteção e preservação de ecossistemas aquáticos, realizando pesquisas de campo e coleta de amostras que contribuíam para o entendimento e conservação da biodiversidade local. Sua morte ocorreu durante uma expedição científica no Rio Grande do Norte, enquanto se preparava para participar da COP 30.

O trabalho de Manna na região do Alto Tietê foi fundamental para a conscientização ambiental e para iniciativas de conservação em uma área sob constante pressão urbana. Sua atuação demonstrava o compromisso de ambientalistas locais que, mesmo longe dos holofotes internacionais, desempenham papel essencial na proteção dos recursos naturais e na produção de conhecimento sobre a biodiversidade brasileira.

Braulino Caetano

Braulino Caetano dos Santos foi reconhecido pelo envolvimento profundo em iniciativas de preservação do Cerrado e pelo trabalho com comunidades tradicionais do Norte de Minas. Nascido na zona rural de Montes Claros, ele foi diretor-geral do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA/NM) e recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Estadual de Montes Claros. Sua atuação em movimentos comunitários e rurais foi fundamental para ampliar o debate sobre o Cerrado no cenário nacional.

Braulino contribuiu significativamente para a formulação de políticas públicas, incluindo a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Participou da Rede Cerrado, formada durante a ECO-92, e manteve articulação constante com ativistas e pesquisadores dedicados à proteção de biomas brasileiros. Sua trajetória demonstrou como o conhecimento local e a organização comunitária são essenciais para a construção de modelos sustentáveis de desenvolvimento, especialmente em regiões frequentemente negligenciadas pelas políticas nacionais.

Fonte: Um Só Planeta.

Foto: Reprodução.

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