Em um feito histórico, astrônomos revelaram a primeira imagem do buraco negro supermassivo que fica no centro da Via Láctea, três anos depois de obter a imagem de outro, semelhante, na galáxia M87*.
A colaboração, um projeto conhecido como EHT (Event Horizon Telescope), apresentou, em várias coletivas de imprensa simultâneas, a “silhueta” do buraco negro chamado Saggitarius A* em um disco luminoso de matéria.
Essa imagem é parecida com a do gigantesco buraco negro na distante galáxia M87*, muito maior que a Via Láctea e que o EHT divulgou em 2019.
Os cientistas acreditam que isso prova que os mesmos princípios da física operam no coração de dois sistemas de tamanhos muito diferentes.
Tecnicamente, um buraco negro não pode ser examinado diretamente, já que o objeto é tão denso e sua atração gravitacional tão poderosa que nem mesmo a luz consegue escapar de sua paraça de atração. Mas é possível detectar a matéria que circula ao seu redor, antes de ser engolida.
Os buracos negros são chamados de estelares quando têm uma massa equivalente a três vezes a do Sol, e são classificados de supermassivos quando sua massa é equivalente a de milhares, ou mesmo bilhões, de sóis.
Sagittarius A* (Sgr A*) foi nomeado assim após ser detectado na direção da constelação de Sagitário. Tem uma massa de cerca de 4 milhões de sóis e está a cerca de 27.000 anos-luz da Terra.
Sua existência era suspeita desde 1974, quando uma fonte de rádio incomum foi detectada no centro da galáxia.
Na década de 1990, vários astrofísicos confirmaram a presença de um objeto compacto supermassivo naquele local, o que rendeu um Prêmio Nobel de Física em 2020.
A imagem que foi revelada nesta quinta-feira representa a primeira prova visual daquele objeto.
Horas de Observação, Anos de Cálculos
O EHT é uma rede internacional de oito observatórios radioastronômicos, incluindo um localizado em Sierra Nevada (Espanha) e outro no deserto do Atacama (Chile).
Em 2019, a equipe conseguiu a imagem histórica do buraco negro supermassivo de M87*, equivalente a 6 bilhões de massas solares e localizado a 55 milhões de anos-luz de distância.
O Sgr A* representa, portanto, um “peso-pena” em comparação.
“Temos dois tipos completamente diferentes de galáxia e duas massas muito diferentes de buracos negros, mas, quando você examina suas bordas, esses buracos parecem notavelmente semelhantes”, disse Sera Markoff, copresidente do conselho de ciência do EHT, em um comunicado que acompanha o anúncio.
“Isso prova que a [teoria da] relatividade geral se aplica” em ambos os casos, acrescentou.
A imagem apresentada é o resultado de várias horas de observação realizadas essencialmente em 2017, além de cinco anos de cálculos e simulações feitos por mais de 300 pesquisadores de 80 institutos.
A imagem foi muito mais difícil de obter do que a da galáxia M87*, porque o buraco negro no centro da Via Láctea é muito menor e há nuvens de poeira e gases que se estendem por milhares de anos-luz e o ocultam.
O gás que o envolve precisa apenas de 12 minutos para dar a volta nesse objeto galáctico, quase à velocidade da luz, enquanto no caso do M87* esse tempo é de duas semanas.
Isso significa que a luminosidade e a configuração do gás mudaram muito rapidamente durante a observação.
“É como se você quisesse tirar uma foto nítida de um cachorro que quer pegar seu rabo”, comentou Chi-Kwan Chan, cientista do EHT.
As duas imagens que os cientistas agora têm, e sua comparação, permitirão o estudo detalhado do comportamento da matéria em condições extremas, com plasma a “bilhões de graus, poderosas correntes magnéticas e matéria que circula a uma velocidade próxima à da luz”, explicou à AFP o professor Heino Falcke, ex-diretor do conselho científico do EHT que produziu a imagem do M87*.
Tais condições adversas permitirão explorar fenômenos como as deformações do espaço-tempo perto de um objeto supermassivo, previstas na teoria da relatividade geral, que Albert Einstein formulou em 1915.
O novo feito foi divulgado nesta quinta-feira (12), em coletivas de imprensa simultâneas em todo o mundo, inclusive na sede do Observatório Europeu do Sul (ESO) na Alemanha. O resultado está em seis artigos publicados no jornal científico The Astrophysical Journal Letters.
Fonte: Revista Galileu, R7, DW, Agência Brasil.