Os aterros sanitários a céu aberto — onde os resíduos domésticos vão parar, sejam eles restos de vegetais ou eletrodomésticos antigos — emitem, em média, quase três vezes mais metano do que o relatado às autoridades dos Estados Unidos. A conclusão é de um estudo publicado na quinta-feira (28) na revista Science.
O estudo mediu as emissões de metano, gás que contribui muito para o aquecimento do planeta, em cerca de 20% dos aproximadamente 1.200 grandes aterros sanitários em operação nos EUA. O trabalho se soma a uma série de evidências de que os aterros sanitários são um fator significativo nas mudanças climáticas, diz Riley Duren, fundador da parceria público-privada Carbon Mapper, que participou do estudo.
“Até agora, como sociedade, temos estado em grande parte no escuro sobre as emissões reais dos aterros sanitários”, afirma Duren, ex-engenheiro e cientista da Nasa. “Este estudo aponta as lacunas.”
As emissões de metano da produção de petróleo e gás, bem como da pecuária, têm sido cada vez mais estudadas nos últimos anos. Assim como o dióxido de carbono, o principal gás de efeito estufa que está aquecendo o mundo, o metano age como um cobertor no céu, retendo o calor do sol.
E, embora o metano dure menos tempo na atmosfera do que o dióxido de carbono, ele é mais potente. Seu efeito de aquecimento é mais de 80 vezes mais poderoso do que a mesma quantidade de dióxido de carbono ao longo de um período de 20 anos.
A Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) estima que os aterros sanitários sejam a terceira maior fonte de emissões de metano causadas pelo homem nos EUA, emitindo tanto gás de efeito estufa quanto 23 milhões de carros a gasolina dirigidos por um ano. Resíduos orgânicos, como restos de comida, podem emitir grandes quantidades de metano quando se decompõem.
Mas essas estimativas foram em grande parte baseadas em modelagem computacional, em vez de medições diretas. A razão: é difícil e até perigoso os trabalhadores medirem com “farejadores” de metano as emissões nesses locais, tendo que caminhar em encostas íngremes ou perto de locais de despejo ativos.
Para o novo estudo, os cientistas reuniram dados de sobrevoos de aviões usando uma tecnologia chamada espectrômetro de imagem, projetada para medir concentrações de metano no ar. De 2018 a 2022, eles sobrevoaram 250 locais em 18 estados americanos, cerca de 20% dos aterros sanitários a céu aberto do país.
Em mais da metade dos aterros que pesquisaram, os pesquisadores detectaram pontos quentes de emissão, grandes concentrações de metano que, por vezes, duraram meses ou anos.
Isso sugere que há algo de dado errado no local, como um grande vazamento de metano causado por camadas de lixo em decomposição há muito enterradas, dizem os pesquisadores.
“Às vezes, você pode ter décadas de lixo no aterro”, afirma Daniel H. Cusworth, cientista climático da Carbon Mapper e da Universidade do Arizona, que liderou o estudo. “Nós chamamos isso de ‘lasanha de lixo’.”
Muitos aterros são equipados com poços e tubos especializados que coletam o gás metano que escapa do lixo em decomposição para queimá-lo ou, então, gerar eletricidade ou calor. Mas esses poços e tubos podem vazar.
Os pesquisadores dizem que identificar vazamentos não apenas ajuda os cientistas a terem uma imagem mais clara das emissões, mas também auxilia os operadores dos aterros a consertar os vazamentos. Manter mais resíduos fora do aterro, por exemplo, fazendo compostagem de restos de comida, é outra solução.
No exterior, a situação pode ser menos clara, especialmente em países onde os aterros não são estritamente regulamentados. Levantamentos anteriores usando tecnologia de satélite estimaram que, globalmente, o metano dos aterros sanitários representa quase 20% das emissões de metano ligadas às atividades humanas.
“O setor de resíduos claramente será uma parte crítica da ambição da sociedade de reduzir as emissões de metano”, diz Duren. “Não vamos atingir as metas globais de redução de metano apenas cortando as emissões de petróleo e gás.”
Existe uma crescente constelação de satélites detectores de metano projetados para fornecer uma imagem mais completa. No mês passado, outra organização sem fins lucrativos, a Environmental Defense Fund, lançou o MethaneSat, satélite dedicado ao rastreamento de emissões de metano ao redor do mundo.
A Carbon Mapper, com parceiros como o Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa, o Rocky Mountain Institute e a Universidade do Arizona, pretende lançar o primeiro de seus próprios satélites de rastreamento de metano ainda neste ano.
Fontes: Folha SP, The New York Times.
Foto: Angela Weiss – 4.jan.2024/AFP.