O aumento abrupto da temperatura superficial dos oceanos chamou a atenção de estudiosos nas últimas semanas. Foram 42 dias seguidos de aquecimento ininterrupto, marcando a temperatura mais alta observada na superfície oceânica desde 1981, quando a capacidade para este tipo de registro teve início.
Analistas ficaram em alerta porque este aquecimento está se antecipando à formação do fenômeno El Niño, previsto para ocorrer na segunda metade deste ano e que sozinho já pode contribuir para temperaturas mais altas em todo o planeta.
No mês de março a superfície global do mar atingiu um novo recorde de temperatura. O oceano nunca havia esquentado tanto em tão pouco tempo.
Os cientistas não entendem exatamente por que isso aconteceu.
Mas eles temem que, combinado com outros eventos climáticos, a temperatura mundial possa atingir um novo patamar preocupante até o fim do próximo ano.
O aumento do conteúdo de calor dos oceanos pode alterar correntes vitais que distribuem o calor para outras partes do globo, além de nutrientes para as espécies marinhas. São os oceanos que absorvem a maior parte – cerca de 90% – dos gases de efeito estufa gerados por atividades como a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento, principais causadores da mudança climática em curso.
O maior temor dos cientistas é o de que o mundo esteja aquecendo mais e mais rapidamente do que as previsões mais pessimistas dizem.
Oceanos mais quentes podem provocar a morte da vida marinha, levar a condições climáticas mais extremas, elevar o nível do mar e reduzir a absorção de gases de efeito estufa que aquecem o planeta.
Um novo estudo importante, publicado na semana passada com pouco alarde, destaca uma novidade preocupante.
Nos últimos 15 anos, o calor acumulado na Terra aumentou em 50%, com a maior parte do excesso indo para os oceanos.
Isso está tendo consequências no mundo real — não apenas a temperatura geral dos oceanos atingiu um novo recorde em abril deste ano, como em algumas regiões a diferença em relação ao longo prazo foi enorme.
Em março, as temperaturas da superfície do mar na costa leste da América do Norte chegaram a ser 13,8°C mais altas do que a média de 30 anos, entre 1981-2011.
Um fator que pode estar influenciando o nível de calor que chega aos oceanos é, curiosamente, a redução da poluição causada pelo transporte marítimo.
Em 2020, a Organização Marítima Internacional implementou um regulamento para reduzir o teor de enxofre do combustível queimado pelos navios.
Isso teve um impacto rápido, reduzindo a quantidade de partículas de aerossol liberadas na atmosfera.
Mas os aerossóis que sujam o ar também ajudam a refletir o calor de volta ao espaço. Removê-los pode ter provocado a chegada de mais calor às águas.
Outro fator importante que preocupa os cientistas é o fenômeno climático conhecido como El Niño – Oscilação Sul.
Nos últimos três anos, esse evento natural esteve em uma fase mais fria chamada La Niña e ajudou a manter as temperaturas globais sob controle.
Mas os pesquisadores agora acreditam que um forte El Niño está se formando, o que terá implicações significativas para o mundo.
“Se um novo El Niño acontecer, provavelmente teremos um aquecimento global adicional de 0,2-0,25°C”, disse o Dr. Josef Ludescher, do Instituto Potsdam de Pesquisas Climáticas.
O El Niño provavelmente afetará os padrões climáticos em todo o mundo, enfraquecerá as chuvas de monções e causará mais incêndios florestais na Austrália.
Vários cientistas entrevistados nesta reportagem não quiseram falar quais seriam as implicações disso.
Um deles disse estar “extremamente preocupado e completamente estressado”.
Quais são os impactos do aquecimento dos oceanos?
A temperatura média da superfície dos mares do mundo aumentou cerca de 0,9°C em comparação com os níveis pré-industrialização — com 0,6°C tendo subido só nos últimos 40 anos.
Isso é menor do que o aumento da temperatura do ar sobre a terra — que aumentou mais de 1,5°C desde os tempos pré-industrialização. Isso ocorre porque é necessária muito mais energia para aquecer a água do que a terra e porque os oceanos absorvem o calor muito abaixo de sua superfície.
Mesmo esse aumento médio aparentemente pequeno tem consequências significativas no mundo real.
Perda de espécies: ondas de calor marinhas mais frequentes e intensas levam à mortalidade em massa da vida marinha. Isso é particularmente prejudicial para os recifes de coral.
Clima mais extremo: o aumento do calor na superfície do oceano significa que furacões e ciclones podem captar mais energia. Isso significa que eles se tornam mais intensos e duradouros.
Elevação do nível do mar: as águas mais quentes ocupam mais espaço — conhecida como expansão térmica — e podem acelerar o derretimento das geleiras da Groenlândia e da Antártida que desembocam nos oceanos. Isso aumenta o nível global do mar, aumentando os riscos de inundações costeiras.
Menor capacidade de absorção de CO2: os oceanos absorvem atualmente cerca de um quarto das emissões de gases de efeito estufa. Águas mais quentes têm menos capacidade de absorver CO2. Se os oceanos absorverem menos CO2 no futuro, mais CO2 ficará acumulado na atmosfera — aquecendo ainda mais o ar e os oceanos.
Fonte: BBC News, Climatempo.
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