Quando as calotas de gelo polar derretem, os efeitos se espalham por todo o mundo. O derretimento do gelo eleva o nível médio global do mar, altera correntes oceânicas e afeta as temperaturas em locais distantes dos polos.
Mas este derretimento não afeta o nível do mar e as temperaturas da mesma forma em todos os lugares.
Em um novo estudo, uma equipe de cientistas investigou como o derretimento do gelo na Antártida afeta o clima global e o nível do mar. Combinaram modelos computacionais da camada de gelo da Antártida, das áreas terrestres e do clima global, incluindo processos atmosféricos e oceânicos, para explorar as complexas interações que o derretimento do gelo tem com outras partes da Terra.
É importante entender o que acontece com o gelo da Antártida, pois ele contém água congelada suficiente para elevar o nível médio do mar em cerca de 58 metros. À medida que este gelo derrete, isso se torna um problema existencial para as pessoas e os ecossistemas de comunidades insulares e costeiras.
Mudanças na Antártida
Estudos sugerem que grande parte da camada de gelo da Antártida poderia sobreviver se os países reduzissem suas emissões de gases de efeito estufa de acordo com a meta do Acordo de Paris de 2015 de limitar o aquecimento global a 1,5ºC em comparação com os níveis pré-industriais. No entanto, se as emissões continuarem aumentando e a atmosfera e os oceanos aquecerem muito mais, isso poderá causar um derretimento substancial e um aumento muito maior do nível do mar.
Isso também mostra como diferentes regiões do mundo sofrerão diferentes níveis de aumento do nível do mar à medida que a Antártida derrete.
Compreendendo a mudança do nível do mar
Se o nível do mar subisse como a água em uma banheira, então, à medida que as camadas de gelo derretessem, o oceano subiria na mesma proporção em todos os lugares. Mas não é isso que acontece.
Em vez disso, muitos lugares experimentam um aumento regional do nível do mar superior à média global, enquanto lugares próximos à camada de gelo podem até ver o nível do mar baixar. A principal razão tem a ver com a gravidade.
As camadas de gelo são enormes, e essa massa cria uma paraça gravitacional que atrai a água do oceano ao seu redor, semelhante à forma como a atração gravitacional entre a Terra e a Lua afeta as marés.
À medida que a camada de gelo encolhe, sua atração gravitacional sobre o oceano diminui, levando à queda do nível do mar em regiões próximas à costa da camada de gelo e ao aumento em regiões mais distantes. Mas as mudanças no nível do mar não são apenas uma função da distância da camada de gelo derretida. Essa perda de gelo também altera a forma como o planeta gira. O eixo de rotação é puxado em direção à massa de gelo que falta, o que, por sua vez, redistribui a água ao redor do globo.
Fatores que podem retardar o derretimento
À medida que a enorme camada de gelo da Antártida derrete, a Terra sólida abaixo dela se recupera.
Sob o leito rochoso da Antártida está o manto da Terra, que flui lentamente como melaço. Quanto mais a camada de gelo derrete, menos ela pressiona a Terra sólida. Com menos peso sobre ela, a rocha pode “repicar”. Isso pode elevar partes da camada de gelo, tirando-as do contato com as águas oceânicas em aquecimento e diminuindo a velocidade do derretimento. Isso acontece mais rapidamente em locais onde o manto flui mais rápido, como sob a camada de gelo da Antártida Ocidental.
Esse efeito de “repique” poderia ajudar a preservar a camada de gelo — se as emissões globais de gases de efeito estufa forem mantidas baixas.
Outro fator que pode retardar o derretimento pode parecer contraintuitivo.
Embora a água do degelo da Antártida provoque o aumento do nível do mar, os modelos mostram que ela também retarda o aquecimento induzido pelos gases de efeito estufa. Isso porque a água do degelo da Antártida reduz as temperaturas da superfície do oceano no hemisfério sul e no Pacífico tropical, retendo o calor nas profundezas do oceano e retardando o aumento da temperatura média global do ar.
Mas, à medida que o degelo ocorre, mesmo que seja mais lento, o nível do mar sobe.
Mapeando resultados sobre o nível do mar
Foi feita uma combinação de modelos computacionais que simulam esses e outros comportamentos da camada de gelo da Antártida, das áreas terrestres e do clima para entender o que poderia acontecer com o nível do mar em todo o mundo à medida que as temperaturas globais aumentam e o gelo derrete.
Por exemplo, em um cenário moderado em que o mundo reduz as emissões de gases de efeito estufa, embora não o suficiente para manter o aquecimento global abaixo de 2ºC em 2100, o aumento médio do nível do mar devido ao derretimento do gelo antártico seria de cerca de 0,1 metro até 2100. Em 2200, seria mais de 1 metro.
Tenha em mente que este é apenas o aumento do nível do mar causado pelo derretimento da Antártida. A camada de gelo da Groenlândia e a expansão térmica da água à medida que os oceanos aquecem também elevarão o nível do mar. Estimativas atuais sugerem que o aumento médio total do nível do mar — incluindo a Groenlândia e a expansão térmica — seria de 0,32 a 0,63 metro até 2100, no mesmo cenário.
Também mostramos como a elevação do nível do mar do degelo da Antártida varia ao redor do mundo.
Nesse cenário de emissões moderadas, descobrimos que o maior aumento do nível do mar proveniente apenas do derretimento do gelo antártico, de até 1,5 metro até 2200, ocorre nas bacias dos oceanos Índico, Pacífico e Atlântico ocidental — locais distantes da Antártida.
Essas regiões abrigam muitas pessoas em áreas costeiras baixas, incluindo residentes de nações insulares no Caribe, como a Jamaica, e do Pacífico central, como as Ilhas Marshall, que já estão sofrendo impactos prejudiciais do aumento do nível do mar.
Em um cenário de emissões altas, o aumento médio do nível do mar causado pelo derretimento da Antártida seria muito maior: cerca de 30 centímetros em 2100 e quase 3 metros em 2200.
Nesse cenário, uma faixa mais ampla da bacia do oceano Pacífico ao norte do equador, incluindo a Micronésia e Palau, e ao longo do meio da bacia do oceano Atlântico, teria o maior aumento do nível do mar, chegando a 4,3 metros até 2200, apenas devido à Antártida.
Embora esses números de aumento do nível do mar pareçam alarmantes, as emissões atuais do mundo e as projeções recentes sugerem que esse cenário de emissões muito altas é improvável. Esse exercício, no entanto, destaca as graves consequências das emissões altas e ressalta a importância de reduzi-las.
Fontes: Folha SP, The Conversation.
Foto: Luis Acosta – 24.fev.24/AFP.


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