Desde 1859 que a Austrália tem um problema com coelhos, culpa do colono inglês Thomas Austin, que acreditava que introduzir 24 desses animais na natureza não faria mal algum à sociedade, muito pelo contrário, poderia até dar uma aparência mais “convidativa” para o país que nascia naquela região.
Como resultado, devido à rápida reprodução dos coelhos, hoje a Austrália tem milhares de quilômetros habitados por esses animais, com uma população de cerca de 200 milhões e mais de 150 anos de prejuízos ecológicos e econômicos.
E como se isso tudo já não fosse o suficiente, a Austrália também tem problemas com outro tipo de animal: o gato. Apesar da aparência preguiçosa e adorável, os felinos carregam garras ameaçadoras e afiadas, corpos ultrarrápidos e flexíveis, adequados para perseguir e pular sobre suas presas.
Os gatos selvagens estão destruindo o ecossistema da Austrália devido ao seu comportamento altamente predatório, eliminando espécies inteiras e fazendo o país recorrer a medidas drásticas, como um toque de recolher.
O problema dos gatos
Os gatos chegaram à Austrália em meados de 1788, com os primeiros colonos europeus, um pouco antes de Thomas Austin ter sua “brilhante ideia” com os coelhos. Rapidamente, os felinos se espalharam por todo o país e hoje habitam 99,8% da área total da Austrália. Segundo o biólogo John Woinarski, da Universidade Charles Darwin, cerca de 2,8 milhões de gatos selvagens vagam pelo continente, sendo que esse número pode aumentar para 6,3 milhões em anos de chuvas intensas.
Em pouco mais de 230 anos desde sua introdução ao novo continente, os gatos selvagens exterminaram mais de uma dúzia de espécies e levaram outras à beira da extinção. Para tentar combater o problema, em 2008, o Departamento Australiano do Meio Ambiente, Água e Patrimônio divulgou um relatório propondo intervenção governamental para proteger ilhas naturais de alto valor de conservação com intuito de montar planos de contingência para prevenir, monitorar, conter e erradicar os gatos selvagens.
Assim foi com Newhaven, com seus 23 ecossistemas, uma região a noroeste da Austrália com cerca de um terço do tamanho do Parque Nacional de Yellowstone dos Estados Unidos, onde foi estabelecido um santuário livre dos gatos selvagens para que espécies nativas possam se recuperar.
“Muitas espécies de mamíferos sobreviventes foram reduzidas a um fragmento diminuto do seu antigo alcance e tamanho populacional, e agora estão ameaçadas e continuam em declínio. Deixados sem controle, os gatos continuariam comendo grande parte do resto da fauna australiana”, disse Woinarski.
Essa cerca montada ao redor de Newhaven ficou pronta em março de 2018, colocando o local na linha de frente no combate para proteger seus animais dos gatos. Atualmente, conforme um relatório divulgado pelo parlamento federal da Austrália, o país lidera o mundo com 34 espécies de mamíferos exterminadas e outras 74 espécies de mamíferos terrestres sob ameaça.
A grande controvérsia
O Projeto Noah, desenvolvido por um novo comitê governamental em 2020, visando preservar a vida selvagem e doméstica, revelou que cada gato selvagem mata 390 mamíferos, 225 répteis e 130 aves todos os anos. Isso significa 1,4 bilhão de animais nativos australianos mortos, quase o mesmo número que morreu nos incêndios florestais catastróficos de 2019–2020; fora que os 3,8 milhões de gatos de estimação matam até 390 milhões de animais todos os anos, deixando ainda mais evidente a seriedade e urgência do problema.
Para reduzir o impacto que a ação dos gatos selvagens tem, o relatório recomendou três etapas essenciais. Primeiro, o registro obrigatório dos gatos por cada dono, garantindo que a receita chegue aos conselhos locais que aplicam os regulamentos de controle de gatos. Depois, os donos devem ser obrigados a esterilizar e castrar os felinos para reduzir o número de ninhadas indesejadas e o despejo de gatos que se tornarão vadios. E por último, e mais controverso, o pedido para que o governo estabeleça toques de recolher noturnos para evitar que gatos domésticos saiam de casa após escurecer.
Woinarski é um dos que se opõe a terceira medida, alegando que o toque de recolher noturno não salvará as presas ativas durante o dia. O melhor, de acordo com seu ponto de vista, seria manter os gatos de estimação contidos 24 horas por dia e 7 dias por semana. Por outro lado, pessoas como Becky Robinson, presidente e fundadora da Alley Cat Allies, chama todo o plano do Projeto Noah de “uma medida bárbara, repreensível e uma escolha moralmente falha”.
Ainda assim, a natureza feroz dos gatos continua destruindo o ecossistema da Austrália, enquanto os abrigos da Royal Society para the Prevention of Cruelty to Animals (RSPCA), a principal organização de bem-estar animal do país, continua recebendo 65 mil gatos todos os anos, dos quais 40% deles são sacrificados.
Em 2021, a RSPCA concordou que a única saída para o problema e melhor conscientização das pessoas seria o plano de 24 horas de contenção e os toques de recolher.
Fonte: Mega Curioso.
Foto: PetSmart/Reprodução.