Esforços para a preservação da biodiversidade são, cada vez mais, considerados urgentes, dados os graves efeitos da ação humana e da crise climática sobre ela. Não à toa, foi bastante comemorado o Acordo Global de Biodiversidade Kunming-Montreal, celebrado ano passado na COP-15.
Mas, quando se trata de plantas e fungos, os especialistas ainda têm dificuldade em responder a uma pergunta simples: quantas espécies desses seres existem no mundo? A preocupação sobre o tema deve crescer agora que, segundo novo estudo, mais de 75% das espécies de plantas ainda não catalogadas do planeta já estão ameaçadas de extinção.
A quinta edição do estudo “Estado das Plantas e Fungos do Mundo” foi publicada pela equipe de pesquisa de Kew Gardens, o jardim botânico real do Reino Unido. Ela reúne análises do trabalho de mais de 200 pesquisadores internacionais e 25 artigos científicos de ponta, fazendo um balanço das pesquisas mais recentes sobre a biodiversidade vegetal e dos fungos.
Segundo os autores da revisão, o fato de que um grande número de novas plantas e fungos continuam a ser descobertos todos os anos, quando situado em um cenário de perda de biodiversidade e mudanças climáticas, indica que o trabalho ainda está muito longe de acabar, e que organismos preciosos podem estar se perdendo antes que sejam bem compreendidos pela humanidade.
“Numa altura em que as plantas e os fungos estão cada vez mais ameaçados, precisamos agir rapidamente para preencher lacunas de conhecimento e identificar prioridades para a conservação”, afirma o Professor Alexandre Antonelli, Diretor de Ciência do Royal Botanic Gardens (RBG), à Euronews.
O estudo indica que cerca de 350 mil espécies de plantas “vasculares” – aquelas com tecidos específicos para conduzir água e nutrientes ao longo de suas estruturas – já são conhecidas pela ciência. A grande maioria das espécies de plantas se enquadra nesta categoria.
O problema é que cerca de 100 mil delas ainda não foram formalmente nomeadas, e os cientistas temem que as probabilidades estejam contra elas. As estimativas mais recentes avaliadas pelo Kew Gardens sugerem que três em cada quatro plantas vasculares não catalogadas já estão provavelmente ameaçadas de extinção.
Este número foi alcançado depois de os cientistas relacionarem dados da Lista Global de Plantas Vasculares (World Checklist of Vascular Plants – WCVP) com a Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN, para ver que ligações existem entre o ano em que uma espécie de planta é formalmente descrita e o seu risco de extinção. Eles encontraram uma relação clara: mais de 77% das espécies descritas em 2020 cumpriam os critérios para serem avaliadas como ameaçadas. O que indica que o perigo não é menor para as que ainda não foram descobertas.
Outro dado preocupante é que, olhando especificamente para as plantas com flores, os investigadores dizem que 45% de todas as espécies conhecidas podem estar sob ameaça de extinção. As orquídeas estão entre as mais ameaçadas.
Presumir o risco, mesmo sem conhecer as espécies
Para os cientistas, novas espécies devem ser tratadas como ameaçadas até prova em contrário. Eles dizem que, cada vez mais, as espécies recentemente catalogadas têm áreas de distribuição bastante pequenas (muitas são descritas a partir de um único local) e estão em declínio populacional e/ou de habitat.
“Se para aceita, a nossa recomendação poderá ajudar na proteção de dezenas de milhares de espécies ameaçadas não catalogadas, tratando-as como ameaçadas assim que forem conhecidas por nós”, afirma Matilda Brown, pesquisadora em Avaliação e Análise de Conservação em Kew.
Os cientistas dizem que é imprescindível lançar luz sobre as “manchas escuras de biodiversidade” do planeta – áreas onde faltam dados sobre diversidade e distribuição de plantas. Dos 32 locais identificados como carentes de dados, pelo menos 44% estão na Ásia tropical – dando uma ideia clara de onde é necessário mais trabalho de campo.
Como nomear e proteger todas as plantas?
Conhecer uma espécie permite aos pesquisadores compartilhar informações, avaliar o seu estado de conservação para compreender se está em risco de extinção, e explorar o seu potencial benefício para os seres humanos. Plantas e fungos sustentam basicamente toda a vida na Terra, fornecendo alimentos, medicamentos, roupas e matérias-primas para outros produtos.
Felizmente, dois grandes avanços estão ajudando os cientistas a serem mais precisos em relação às espécies vegetais, relata o Euronews. Em primeiro lugar, a WCVP foi finalmente compilada pelo botânico belga Rafaël Govaerts após 35 anos de investigação.
“Há mais de 160 anos, Charles Darwin sonhou com uma lista completa de espécies de plantas de todos os cantos do globo. Este também tem sido o meu sonho, motivado pela destruição desenfreada das florestas tropicais e da biodiversidade em geral, que testemunhei desde quando era estudante”, diz Govaerts.
Em segundo lugar, as análises do DNA em amostras de solo em todo o mundo forneceram uma riqueza de novas informações sobre a diversidade de fungos. Até o momento, apenas 155 mil espécies de fungos foram formalmente nomeadas. Mas os investigadores há muito que suspeitam que esse reino é tão ou mais diverso que o das plantas e dos animais.
Agora, graças em parte aos avanços tecnológicos, os cientistas estimam que existam cerca de 2,5 milhões de espécies de fungos em todo o mundo. Isto significa que mais de 90% das espécies de fungos permanecem desconhecidas pela ciência, e apenas 0,02% tiveram o seu nível de ameaça de extinção global avaliado.
Um avanço importante, mas que deixa claro quanto trabalho ainda há pela frente.
Fonte: Um Só Planeta.
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