Equador: o resultado da votação histórica que impacta no futuro da exploração de petróleo na Amazônia

Em um referendo histórico, os equatorianos votaram pelo fim da extração de petróleo na reserva protegida do Parque Nacional de Yasuní. Com a decisão, os projetos liderados pela estatal Petroecuador em operação na região deverão ser encerrados dentro de um ano. O pleito ocorreu no domingo e 58% do país votou contra a exploração de combustíveis fósseis na reserva, que abriga várias populações indígenas, entre elas dois povos indígenas isolados, e é um hotspot de biodiversidade.

O Parque Nacional Yasuni é habitado pelos povos isolados Tagaeri e Taromenani e em 1989 foi designado reserva mundial da biosfera pela Unesco, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Abrangendo mais de 1 milhão de hectares (2,5 milhões de acres), possui 610 espécies de aves, 139 espécies de anfíbios e 121 espécies de répteis., sendo pelo menos três espécies endêmicas.

O resultado da votação popular contraria o governo equatoriano, que estava fazendo campanha para que a exploração continuasse — segundo estimativas oficiais, o país deixaria de gerar US$ 1,2 bilhão em receita por ano sem a exploração. E surpreende pelo engajamento: pesquisas de intenção de voto anteriores sugeriam que menos de 40% dos eleitores queriam interromper a perfuração, que conta com serviços das empresas chinesas Sinopec e Chuanqing Drilling Engineering Company Limited.

A vitória de Yasuní é o ponto alto da luta de uma década de jovens ativistas reunidos no grupo Yasunidos, que surgiu quando o ex-presidente Rafael Correa havia solicitado compensação financeira de países ricos para que o Equador mantivesse o local intacto. O dinheiro não veio, e o governo começou, em 2016, a perfurar o Bloco 43, que pelas estimativas oficiais fornece 12% dos 466 mil barris de petróleo produzidos por dia no Equador.

Contudo, naquele período, um grupo de ativistas deu início a um processo para permitir que os cidadãos decidissem sobre a viabilidade da exploração. Um esforço que demandou uma década.

O Yasunidos recrutou cerca de 1.400 voluntários para caminhar pelas ruas e bater de porta em porta em todo o país, conforme relata o The New York Times. Em seis meses, eles coletaram mais de 757 mil assinaturas, quase 200 mil a mais do que o necessário para desencadear um referendo. A conquista histórica também se deve aos esforços de grupos indígenas daquele país. Em 2019, após uma batalha judicial, uma comunidade indígena Waorani conseguiu bloquear a exploração de petróleo em suas terras.

A votação pelo fim da exploração no Parque ocorre em paralelo às eleições legislativas e presidencial do Equador, convocada após o presidente Guillermo Lasso dissolver o Congresso ao ser confrontado com um processo de impeachment. No começo do mês de gosto, um dos candidatos presidenciais, Fernando Villavicencio, foi assassinado, enquanto o país viu um aumento vertiginoso da violência política.

A eleição presidencial vai ao segundo turno em 15 de outubro. Os eleitores terão de escolher entre a esquerdista Luisa González, candidata do partido do ex-presidente Rafael Correa e a mais votada no domingo, com 33% dos votos, e o empresário Daniel Noboa, de centro-direita, filho de um dos homens mais ricos do país, que conquistou 24%.

E não foi a única consulta ambiental realizada naquele dia.

Os cidadãos de Quito expressaram sua discordância com o avanço da exploração mineral em uma área de grande importância devido à sua biodiversidade: o Chocó Andino.

Localizada a cerca de 40 quilômetros do centro da cidade, esta região é uma rica reserva ecológica e, ao mesmo tempo, contém depósitos minerais como ouro e cobre.

Por essa razão, ao longo dos últimos anos, ativistas do coletivo “Quito sem mineração” têm impulsionado uma consulta popular com quatro questões para que os moradores da área pudessem indicar se concordavam em proibir a exploração mineral em âmbito artesanal, de pequena, média e grande escala.

A resposta nesta consulta regional foi mais contundente: 67% dos eleitores se declararam a favor da proibição.

“Conseguimos o maior consenso nacional. Ou seja, o que os políticos nos dividem, conseguimos unir na natureza”, disse à BBC Mundo Pedro Bermeo, um dos líderes da iniciativa cidadã.

Com a vitória do “Sim”, conforme anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral e confirmado pela Corte Constitucional ao aprovar a consulta em maio deste ano, o governo equatoriano não estará autorizado a celebrar mais contratos de exploração de petróleo nessa região.

Ademais, o governo terá um prazo de um ano para proceder à remoção gradual e organizada das infraestruturas petrolíferas localizadas no parque nacional.

“Para nós, ficou cristalino que a riqueza desse território transcende o aspecto material: reside em sua população e em sua biodiversidade”, expressou Bermeo.

Quanto ao Chocó Andino, a aprovação do “Sim” não possui efeitos retroativos. Ela simplesmente determina que o governo equatoriano não pode emitir novas licenças de mineração nessa região.

“Essa é uma mensagem para o governo, indicando que desejamos progredir de maneira distinta: uma economia fundamentada na biodiversidade e não na exploração de recursos naturais”, comunicou à BBC Mundo Inti Arcos, um dos líderes do movimento “Quito sem mineração”.

Fontes: Um Só Planeta, BBC News.

Foto: Getty Images.