A abertura de pastagem foi a principal finalidade do desmatamento da Amazônia entre 1985 e 2023, aponta uma nova análise da rede MapBiomas, que analisou imagens de satélite do período. De acordo com os dados, uma fatia total de 14% da Amazônia era pasto no ano passado.
Segundo os pesquisadores, em todos os anos da série histórica, mais de 90% das áreas desmatadas na Amazônia tiveram como primeiro uso a pastagem, sendo que uma parcela foi posteriormente usada para agricultura ou se regenerou. Nos 39 anos analisados, o crescimento da área de pastagem no bioma quase quintuplicou, passando de 12,7 milhões de hectares para 59 milhões de hectares. A expansão chega a 46,3 milhões de hectares, superando o território da Suécia.
Já o desmatamento diretamente relacionado com a agricultura teve seu ápice em 2004, com 147 mil hectares desmatados de forma direta para uso agrícola, porém caiu drasticamente nos anos seguintes, influenciado diretamente pela moratória da soja, afirma o MapBiomas, se referindo ao acordo comercial que estabelece o compromisso de não comprar essa commodity quando produzida em áreas desmatadas da Amazônia. O monitoramento das lavouras fica a cargo do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Considerando a Amazônia Internacional, que engloba o Brasil e também Peru, Bolívia, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana, Guiana Francesa e Suriname, o bioma perdeu 88 milhões de hectares de florestas entre 1985 e 2023, aponta o MapBiomas, uma área maior que o Chile e mais de duas vezes o território do Paraguai.
A pastagem é o uso do solo mais comum no bioma, muitas vezes a área é desmatada para especulação imobiliária, visando um lucro futuro com a venda da terra, e a atividade de pastagem é a forma mais fácil de comprovar o uso desse território — Luis Oliveira, pesquisador do Imazon e da equipe Amazônia do MapBiomas.
Agropecuária avançou sobre áreas úmidas, diz relatório
As pastagens avançaram também sobre as áreas úmidas do bioma, que perderam 3,7 milhões de hectares entre 1985 e 2023, o que representa -5,65%. Desse total, 3,1 milhões de hectares foram convertidos em pastagem, e 441 mil hectares foram transformados em áreas agrícolas.
No Tocantins amazônico, 74% virou pasto
Os três estados com maior expansão de pastagem no período (analisando somente a porção de área dos estados dentro do bioma) são Tocantins (de 33% para 74% da área do estado inserida na Amazônia), Maranhão (de 14% para 48%) e Rondônia (de 6% para 39%).
Esses são também os estados com menor proporção de vegetação nativa no bioma, com 21%, 46% e 59% de cobertura remanescente, respectivamente.
Os dados do MapBiomas mostram que as áreas com menor perda de vegetação nativa são as que estão sob algum regime de proteção, como Territórios Indígenas e Unidades de Conservação. Os estados com menor proporção de vegetação nativa tendem a ser os com menos territórios protegidos e com economia com predominância de atividades agropecuárias — Luis Oliveira, pesquisador do Imazon e da equipe Amazônia do MapBiomas.
A agropecuária na Amazônia cresceu 417% em 39 anos, afirma o levantamento do MapBiomas. No caso específico da agricultura, o aumento de área no bioma no período foi de 4.647%, ou 47 vezes, passando de 154 mil hectares para 7,3 milhões de hectares.
A quase totalidade (97%) da área agrícola mapeada na Amazônia é de lavouras temporárias, com predomínio da soja, modalidade que responde por 80,5% do total.
Em 2023, a soja ocupava 5,9 milhões de hectares no bioma. A área de cana-de-açúcar aumentou progressivamente, observa o relatório, passando de 192 hectares em 1985 para mais de 90 mil hectares em 2023, ou 1,23% do total da área agrícola no bioma.
A área dedicada à silvicultura aumentou de 3,2 mil hectares em 1985 para 360 mil hectares em 2023, um aumento de mais de 110 vezes em 39 anos.
Amazônia perde 14% de vegetação nativa em 39 anos
No período analisado, foram perdidos 55,3 milhões de hectares (-14%) de vegetação nativa na Amazônia, ou 14% do total. Os estados com maior cobertura de vegetação nativa são Amazonas e Amapá, com 95% cada, e Roraima, com 93%.
Segundo análise do MapBiomas, 50,4 milhões de hectares desmatados eram de formação florestal, que foi o tipo de cobertura da terra que mais perdeu área nesse período, passando de 336 milhões de hectares em 1985 para 285,8 milhões de hectares em 2023. Com isso, no ano passado 81,3% da Amazônia eram cobertos por vegetação nativa.
“A continuidade dessa perda pode levar a região ao chamado ponto de não retorno”, alerta Jailson Soares, pesquisador do Imazon e da equipe Amazônia do MapBiomas. “Nesse estágio, o bioma amazônico perderia sua capacidade de manter funções ecológicas essenciais e de se recuperar de distúrbios como queimadas e exploração madeireira, resultando em uma degradação irreversível da floresta.”
A área de vegetação secundária, que foi desmatada anteriormente e que está em processo de regeneração, vem crescendo a uma média de 0,55 milhão de hectares por ano e já responde por 2% da vegetação nativa do bioma (8,1 milhões de hectares em 2023).
A Amazônia tem influência na precipitação [chuvas] em outras regiões do Brasil, através da evapotranspiração que forma os “rios voadores”. O desmatamento no bioma através do avanço da agropecuária enfraquece esse transporte de vapor d’água para outras regiões, agravando ainda mais a crise climática que vivemos — Luis Oliveira, pesquisador do Imazon e da equipe Amazônia do MapBiomas.
Fontes: Um Só Planeta, g1, Poder 360.
Imagem: SAD/Imazon.