Na última semana, veio à público a notícia de que a Marinha do Brasil havia agendado um exercício de tiros na Ilha Sapata, que faz parte da zona de amortecimento do Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes, no litoral norte paulista, para os dias 16 e 17 de agosto. A notícia causou uma imediata repercussão na sociedade civil e no próprio ICMBio, que gerencia as áreas protegidas do Núcleo de Gestão Integrada Alcatrazes, por se tratar do período reprodutivo de aves migratórias e de migração de baleias pela região do arquipélago. O alerta sobre os possíveis impactos do exercício militar na fauna silvestre de Alcatrazes – para além apenas da ilha Sapata – fizeram a Marinha suspender a ação.
A data inicialmente agendada pela Marinha estava fora do período acordado através de Termo de Compromisso com o ICMBio para realização dos exercícios militares, que devem ser feitos entre novembro e abril. A prática é restrita à Ilha Sapata e 1 quilômetro do mar no seu entorno, como parte de acordo firmado entre os órgão militar e ambiental para criação do Refúgio e por isso foi deixada de fora do traçado da unidade de conservação (UC) marinha.
Em nota oficial enviada a ((o))eco, o ICMBio respondeu que devido à época reprodutiva das aves no Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes, orientou a Marinha, por meio de ofício, pelo adiamento do exercício de tiro. “Em resposta ao ICMBio, a Marinha do Brasil adiou a atividade agendada na região”.
((o))eco havia entrado em contato com a Marinha solicitando o posicionamento do órgão diante da manifestação do ICMBio e da sociedade civil, mas não recebeu resposta. Também não foi publicizado se a Marinha já definiu uma nova data para o exercício.
“Conforme exposto na Informação Técnica no 13/2021-CEMAVE/DIBIO/ICMBio, a realização de exercícios de tiro na época reprodutiva das aves pode comprometer em até 75% o sucesso reprodutivo da temporada, e recomenda o aprofundamento do conhecimento da fenologia das fragatas (Fregata magnificens), bem como de outras espécies que nidificam no Arquipélago, visando a definição dos períodos mais adequados para realização de treinamentos militares. Enquanto não houver resultados desses estudo, orientamos que o exercício seja realizado na data acordada previamente com a Marinha, justamente para evitar a sobreposição da atividade com a principal época reprodutiva das aves”, apontou o presidente do ICMBio, Marcos Simanovic, em ofício enviado à Marinha logo após o agendamento do exercício militar. “Ressaltamos que a conservação dos ninhais é um dos principais objetivos do Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes”, completa.
O Refúgio de Vida Silvestre de Alcatrazes foi criado em 2016 e engloba todo o arquipélago dos Alcatrazes, com exceção da ilha Sapata, e as ilhas já protegidas pela Estação Ecológica Tupinambás, unidade de conservação contígua que é gerida de forma conjunta ao refúgio através do Núcleo de Gestão Integrada (NGI) Alcatrazes/ICMBio. Ao todo, as duas UCs somam cerca de 70 mil hectares, entre áreas terrestres e marinha.
A ilha de Alcatrazes, principal ilha do arquipélago, foi utilizada como alvo para treinamentos de tiro até 2013, quando foi substituída pela ilha Sapata. No acordo costurado com a Marinha para criação da unidade de conservação, foi decidido que a ilha ficaria de fora do traçado do refúgio justamente para que o órgão militar fizesse seus treinamentos lá, e não nas demais ilhas do arquipélago, hoje protegidas. A Ilha Sapata faz parte da zona de amortecimento do refúgio, ou seja, da faixa que circunda a unidade de conservação e também tem uso restrito, onde também é proibida a pesca e o mergulho. A ilha foi escolhida porque nela os impactos dos exercícios de tiros seriam potencialmente menores, uma vez que não há espécies endêmicas e ameaçadas identificadas na ilha.
O último exercício de tiros realizado na ilha foi no ano passado, dentro do período acordado.
De acordo com o plano de manejo do Refúgio, os exercícios de tiros podem causar impactos tanto pela perturbação da avifauna do arquipélago, ocasionada pelo estampido sonoro, bem como pelo risco de dispersão e acúmulo de projéteis no fundo marinho.
“Há registro da destruição de ninhos de atobás e gaivotões na ilha da Sapata, pelo impacto dos projéteis. As fragatas perturbadas nos ninhos pelo efeito sonoro dos disparos podem abandoná-los, deixando ovos e filhotes sujeitos a queda e a predação”, descreve o documento.
Mobilização da sociedade civil
O vereador Fernando Puga (PT), do município de São Sebastião, responsável por um abaixo-assinado contra o exercício da Marinha, comemorou em suas redes o adiamento da atividade. “A sociedade civil do litoral norte precisa se manter unida e atenta, para que a gente consiga não só essa, mas uma vitória definitiva que é eliminar qualquer tipo de exercício de tiro em Alcatrazes”, declarou em vídeo publicado na tarde desta terça (09).
O abaixo-assinado organizado por ele já somava mais de 10 mil assinaturas.
Fonte: ((O))Eco.