Eventos que antecedem sismos são estudados por cientistas há anos; porém, ainda não é possível fazer previsões consistentes de que um tremor vai acontecer.
Na noite desta segunda-feira (8), um terremoto atingiu o Marrocos. Com epicentro a 70 km ao sul da cidade histórica de Marrakech, o tremor de magnitude 6,8 (considerada forte) derrubou construções e, até a publicação dessa matéria, havia deixado 1.037 mortos e mais de 1.200 feridos, segundo a AFP. Para se ter uma ideia, o sismo pôde ser sentido até mesmo em Portugal, Espanha e Argélia.
Cerca de 19 minutos desse primeiro tremor, ainda ocorreu um segundo – desta vez, de magnitude 4,9.
Essa não é a primeira vez que o país ao norte da África enfrenta esse tipo de catástrofe: em fevereiro de 1960, um terremoto próximo à cidade de Agadir, ao sudoeste de Marrocos, matou entre 12 mil e 15 mil pessoas.
A região setentrional do país, no entanto, é mais suscetível a tremores, já que fica localizada entre duas placas tectônicas: a Placa Africana e a Plana Eurasiática. O movimento desse tipo de bloco rochoso que forma a crosta da Terra é o que pode causar terremotos em diferentes pontos do planeta – assim como também pode resultar em atividades vulcânicas e tsunamis.
Por que ainda é tão difícil de prever um grande terremoto?
Ainda que geólogos possam identificar as causas de terremotos após eles acontecerem, cientistas não conseguem prever esse tipo de evento por diversos motivos – incluindo o fato de que esses tremores ocorrem muito rapidamente. Ser imprevisível está na natureza desses sismos, argumentam especialistas. “Um terremoto não é como um trem lento que eventualmente ganha velocidade. É um evento repentino e acelerado”, explicou Ben van der Pluijm, professor de geologia da Universidade de Michigan, em entrevista ao site norte-americano NBC News em fevereiro, quando a Turquia e a Síria foram atingidas por um tremor de magnitude 7,8.
Além disso, os terremotos dão poucos sinais (ou mesmo nenhum). Cientistas analisam diferentes fatores que poderiam servir de alerta, como mudanças nos sons subterrâneos, potenciais aumentos na atividade sísmica de uma região e alterações no comportamento animal; porém, nenhum desses pontos serve como uma prova consistente de que um lugar vai enfrentar um sismo.
Outro fator de dificuldade é que os processos das placas tectônicas que resultam em terremotos – como a colisão delas – podem levar centenas de anos. Ou seja: essas análises não funcionam tão bem quando se trata de prever um tremor nas escalas de tempo humanas.
Isso também é salientado pelo Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS): o órgão afirma em seu site que, embora cientistas nunca tenham conseguido prever um grande terremoto, é possível “calcular a probabilidade de ocorrência de um terremoto significativo numa área específica dentro de um determinado número de anos”.
Ainda segundo os especialistas norte-americanos, para ser válida, uma previsão de terremoto precisa definir três dados: data e horário; localização; e magnitude.
Assim, os cientistas alertam para falsas previsões que são propagadas nas redes sociais por não especialistas. “[Esses alertas] não se baseiam em provas científicas, e os sismos fazem parte de um processo científico. Por exemplo, terremotos não têm nada a ver com nuvens, dores no corpo ou lesmas”, destaca o USGS.
“Essas pessoas não definem todos os três elementos necessários para uma previsão”, acrescentam os cientistas. “Suas previsões são tão gerais que sempre haverá um terremoto adequado a elas; tais como, ‘haverá um terremoto de magnitude 4 em algum lugar dos Estados Unidos nos próximos 30 dias’.”
O USGS também destaca que, todo dia, a chance de um terremoto acontecer é de 100%. Tremores são uma ocorrência muito comum na Terra; mas muitos deles são fracos ou acontecem longe de regiões habitadas. “O problema está em identificar a área onde um choque forte se centrará e quando isso ocorrerá”, o órgão norte-americano sublinha. “A previsão de terremotos pode algum dia se tornar realidade; mas somente depois que muito mais para aprendido sobre eles.”
Esforços para prever sismos é o que não falta. Em julho, um estudo publicado na revista Science defendeu que dados de GPS poderiam ser usados para detectar o deslizamento gradual e acelerado entre placas tectônicas até duas horas antes de um terremoto.
Os autores da pesquisa analisaram dados de GPS coletados ao longo de 5 minutos 48 horas antes de 90 terremotos diferentes. Então, eles compararam essas informações a uma base com mais de 3 mil medições de movimentos geológicos, notando a direção de deslocamentos terrestres que cada terremoto poderia causar.
Em cada um dos casos analisados, os pesquisadores descobriram que o maior movimento na direção esperada ocorreu pouco antes do terremoto. Além disso, os últimos 23 pontos de dados mostraram um deslocamento gradualmente crescente na direção esperada; já os sete últimos foram mais altos do que quaisquer outros durante todo o período de 48 horas.
Porém, devido aos níveis de ruído dos sensores GPS atuais, perceber sismos só é possível com um grande conjunto de dados; e ainda não é possível medi-los em qualquer local da Terra. Por isso, para melhorar os cálculos, seriam necessários sensores GPS capazes de verificar movimentos de apenas 0,1 milímetro.
“Não podemos detectar a escala de um terremoto; por isso, não podemos fazer previsões”, reconheceu ao site NewScientist um dos autores do estudo, Quentin Bletery, da Universidade de Côte d’Azur (França). “Mas [esta pesquisa] nos diz que há algo acontecendo, e se fizermos progressos significativos na medição – seja no próprio sensor, melhorando sua sensibilidade, ou apenas tendo mais deles – poderemos ser capazes de perceber coisas e fazer previsões.”
Pesquisadores ligados a instituições e universidades brasileiras também vieram estudando formas de monitorar e prever terremotos. É o caso de um grupo apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) que tem analisado métodos baseados na ionosfera para descobrir tremores e tsunamis em near (aproximação) real time (NRT, na sigla em inglês para quase em tempo real).
“Um pequeno tremor na atmosfera pode ser bem maior na ionosfera. Por exemplo: o deslocamento da superfície da Terra durante um terremoto pode ser de milímetros; mas, na ionosfera, o registro atinge um número 10 mil vezes maior”, disse o pesquisador Esfhan Alam Kherani, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em comunicado. “Sabemos que houve vários trabalhos nessa área nas últimas três décadas; mas nosso foco é o monitoramento em tempo quase real, um desafio ainda a ser resolvido. Um primeiro pulso de tremor dura cerca de dez minutos. Já conseguimos detectar em seis minutos depois do início do terremoto, mas queremos reduzir esse prazo, talvez para dois minutos ou poucos segundos.”
Fonte: Revista Galileu.
Foto: Fadel Senna/AFP via Getty Images.