Por que terras férteis estão se tornando desertos

Quase metade da superfície sólida do planeta está prestes a se tornar um deserto não arável, de acordo com a Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (UNCCD, na sigla em inglês).

Essas terras são marcadas há muito tempo pela baixa pluviosidade, e mesmo assim sustentam 45% da agricultura mundial. Agora, a seca extrema ligada ao aquecimento global causado pelo homem está ajudando a transformar essa área em um terreno baldio infértil.

Com uma em cada três pessoas do mundo vivendo nessas regiões áridas, especialistas alertam que a insegurança alimentar, a pobreza e o deslocamento em massa acompanharão a desertificação.

O problema é tão grave que uma conferência das Nações Unidas sobre desertificação (COP16), realizada na Arábia Saudita em dezembro, exigiu que 1,5 bilhão de hectares de terras desertificadas do mundo sejam restaurados até 2030. Pelos cálculos da ONU, essa é a porção que poderia ser reabilitada.

O que é desertificação?

A desertificação é uma forma de degradação pela qual a terra fértil perde grande parte de sua produtividade biológica – e econômica – e se torna um deserto.

Atualmente, até 40% das terras do mundo já estão degradadas, de acordo com a UNCCD.

Embora as mudanças climáticas, o desmatamento, o uso excessivo de pastagem para pecuária, práticas agrícolas insustentáveis e a expansão urbana sejam os principais fatores da desertificação, uma crise global de estiagem está exacerbando o problema.

A seca e o calor extremos provocam escassez de água e levam à degradação do solo e à perda de culturas e vegetação.

Com a previsão de que 2024 será o ano mais quente já registrado, a seca poderá afetar 75% da população mundial até 2050, de acordo com relatório da ONU divulgado nesta semana.

A escassez de água agrava ainda mais os impactos do desmatamento. Menos árvores significa menos raízes para prender o solo e evitar erosão.

Enquanto isso, questões sociais, como maior dificuldade para mulheres de possuir terras, também podem afetar a saúde da terra e do solo. A ONU observa que as mulheres investem com mais frequência em sistemas alimentares biodiversos, ao contrário dos homens, que se concentram principalmente em monoculturas de alta produtividade que podem degradar a terra rapidamente.

Por que enfrentar a desertificação é importante?

A grave degradação da terra e a desertificação estão afetando a capacidade do planeta de “apoiar o bem-estar ambiental e humano”, disse um relatório da UNCCD de 2024.

A terra degradada não pode mais sustentar diversos ecossistemas ou ajudar a regular o clima, os fluxos de água e a produção de nutrientes vitais para toda a vida.

A terra saudável também proporciona segurança alimentar e um sistema agrícola sustentável, aponta o estudo.

Porém, com tanta terra fértil e produtiva degradada a cada ano, a desertificação contínua está acelerando a perda de biodiversidade, a fome e a pobreza.

Migração paraçada e conflitos sobre recursos em declínio serão algumas das consequências futuras.

“São a terra e o solo sob nossos pés que cultivam o algodão para as roupas que vestimos, garantem a comida em nossos pratos e ancoram as economias das quais dependemos”, observou Ibrahim Thiaw, secretário executivo da UNCCD.

O que pode ser feito?

Um tema fundamental dos esforços para combater a desertificação é a restauração do solo e a promoção de uma agricultura e de um manejo de pastagens mais sustentáveis e “positivos para a natureza”, de acordo com Susan Gardner, diretora da divisão de ecossistemas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).

Isso anda de mãos dadas com a conservação de “bacias hidrográficas” que armazenam água.

O Programa Mundial de Alimentos da ONU, por exemplo, tem trabalhado para melhorar a resiliência da água na Mauritânia e no Níger, no oeste da África, construindo “meias-luas” que retêm a água da chuva.

Os lagos semicirculares ajudam solos degradados a reter a água por mais tempo e a sustentar a vegetação. Além disso, eles são práticos e econômicos para a população local construir.

Mas medidas mais drásticas também estão sendo tomadas para impedir a expansão dos desertos.

Em 2007, as nações da região do Sahel, na África, decidiram impedir a expansão do deserto do Saara para o norte, alimentada pela seca e pela mudança climática, cultivando árvores, pastagens e vegetação para criar a Grande Muralha Verde.

Bilhões de árvores seriam plantadas ao longo de quase 8.000 km, do litoral oeste ao leste da África, para criar zonas de amortecimento e evitar mais desertificação.De acordo com os números mais atualizados da ONU, um quinto da restauração desejada foi alcançado, com o progresso paralisado devido à falta de financiamento. No entanto, novas iniciativas estão avançando com o objetivo de tornar mais verdes 100 milhões de hectares de terras degradadas em toda a África.

Uma iniciativa semelhante de replantio na China e no deserto de Gobi, na Mongólia, também conhecida como a “Grande Muralha Verde”, inclui esforços para reduzir o o uso excessivo de pasto entre os pastores da Mongólia.

Quase 80% das terras da Mongólia foram afetadas pela degradação até 2020, e uma iniciativa da ONU buscou combater a desertificação por meio do gerenciamento sustentável da terra, incluindo a proteção de quase 850 mil hectares na região sul de Gobi como corredores de biodiversidade.

Fonte: g1.

Foto: Nelson Almeida/AFP.

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