Projeto da Petrobras ameaça sobrevivência dos corais da Amazônia

Um dos mais novos bancos de recifes do mar brasileiro foi descoberto em 2016. E, antes de mais nada, causou surpresa mundial. Ninguém acreditava ser possível um banco de recifes debaixo da pluma de água doce e barrenta, como é o caso da foz do Amazonas. Contudo, eles estão lá. O imenso banco dista cerca de cem quilômetros da foz do Amazonas, e fica entre 50 e 200 metros de profundidade.

Além do mais, o conjunto é enorme, uma faixa com cerca de 900 km de extensão por 40 km de largura com uma área de 56 mil quilômetros quadrados, que se estende do Maranhão até a Guiana Francesa. Atualmente, o conjunto é conhecido como Grande Recife Amazônico, ou GARS. Isso corresponde a uma área sete vezes maior que a região metropolitana de São Paulo, que é a maior do Brasil e tem quase 8 mil quilômetros quadrados.

A existência dos Corais da Amazônia foi revelada em 2016 na maior revista científica do mundo, a Science Advances, em um estudo assinado por 39 pesquisadores de 12 instituições, tanto brasileiras quanto internacionais. A descoberta foi considerada uma das mais importantes da biologia marinha da última década.

Uma das características mais marcantes dos Corais da Amazônia é sua rica biodiversidade. Isso vale tanto para os seres que formam o recife (esponjas-do-mar, rodolitos e corais) quanto para os peixes e outras espécies que circulam pela região e têm no recife um importante local para se abrigar, se alimentar e se reproduzir. Apesar de essa rica biodiversidade ter sido descoberta recentemente, ela já está ameaçada. A Petrobras defende a exploração de petróleo nessa região.

Corais da Amazônia

Esse recife de corais é como um ponto de encontro de muitas espécies que vêm de diferentes (e opostos) locais do oceano e precisa ser preservado. Prova disso é um artigo publicado em abril chamou os Corais da Amazônia de “corredor de biodiversidade“. Foram encontrados ali tanto espécies de peixes que são originários do sul do oceano Atlântico quanto do Caribe. O artigo foi resultado dos estudos feitos na primeira expedição que o Greenpeace fez aos Corais da Amazônia, em 2017.

Um novo estudo que revela a imensidão dos corais foi liderada pelo pesquisador Fabiano Thompson, do Instituto de Biologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A pesquisa mostra que microrganismos e nutrientes do Rio Amazonas alimentam as esponjas do Grande Recife Amazônico (GARS).

O estudo mostra que o GARS está conectado à Floresta Amazônica, e se nutre de elementos e microrganismos da pluma do Rio Amazonas. Portanto, há um contínuo, rio Amazonas-pluma-recife.

A região do GARS ainda é pouquíssima conhecida. O GARS somente foi descrito em detalhes em 2018 por Francini-Filho et al. A região da Foz do Amazonas é uma das menos estudadas de toda a costa brasileira comparativamente.

Novo estudo sobre os corais da Amazônia ou ‘farmácia submersa’

Em julho de 2022 um grupo de pesquisadores publicou novo estudo sobre os corais da Amazônia. Em entrevista ao jornal O GLOBO, o pesquisador Fabiano Thompson, chefe do Laboratório de Microbiologia da UFRJ, afirma que pela primeira vez foi possível identificar que microrganismos e nutrientes da pluma do Rio Amazonas alimentam as esponjas do Grande Recife Amazônico e que local pode ser considerado uma “farmácia submersa”.

Mesmo assim, Thompson afirma que ‘além de ser habitat para a vida marinha, há riquezas que podem ser transformadas em produtos biotecnológicos, como novos medicamentos e alimentos, para a geração de divisas para o Brasil’.

Em trabalho para proteger a nova descoberta, desde sempre ameaçada pela extração do petróleo, o Greenpeace publicou o estudo Amazônia em Águas Profundas – Como o Petróleo Ameaça os Corais do Amazonas, no qual relembra a potência do maior rio do mundo.

Por exemplo, ‘o Amazonas é o maior rio do mundo quando se fala em volume de água que lança no mar. Ele despeja mais água doce que os outros sete maiores rios do mundo juntos, ao todo são 300 mil metros cúbicos de água chegando ao Oceano Atlântico a cada segundo’.

Pois é justamente abaixo desta potência de água doce que se encontra o Grande Recife Amazônico. Uma descoberta das mais importantes da ecologia marinha das últimas décadas.

A relação entre o rio Amazonas e o grande recife

Ao responder uma pergunta sobre por que é importante o Brasil entender uma ligação deste tipo, Thompson respondeu,

‘É importante por várias razões. Trata-se de um megabioma composto pela maior floresta tropical do mundo, com o maior sistema de manguezais do Atlântico (um dos maiores do mundo) e o maior sistema recifal do Atlântico Sul. Este megabioma está todo conectado’.

Em outras palavras, um depende do outro segundo Thompson. ‘Por exemplo, os manguezais da região servem de berçários para vida marinha, ou seja, para a vida no GARS. E o GARS serve como um banco de “sementes” para recifes mais rasos, das regiões costeiras, um recurso biológico inestimável no contexto das mudanças globais’.

Enquanto pesquisadores descobrem novidades que aumentam ainda mais nossa biodiversidade, a maior do mundo, a Amazônia nunca foi tão maltratada e compreendida pela poder público. Nesse sentido, é no mínimo mais um paradoxo digno do País.

Outro ponto de preocupação ambiental, a formação está na mira da exploração de petróleo.

Por isso, após o achado, o Greenpeace reuniu cerca de 2 milhões de assinaturas para pedir a proteção da região. Em 2018, tramitou uma proposta para tornar o recife uma área de preservação permanente, mas a Câmara dos Deputados barrou.

No mesmo ano, falhas nas propostas para a exploração segura do potencial de petróleo na região fizeram o Ibama negar licença para a empresa francesa Total.

A dificuldade de licenciar os poços levou então a Total a desistir da área e vender suas participações à Petrobras. A estatal, por sua vez, mantém planos de explorar a foz do Amazonas, se conseguir aval dos órgãos ambientais.

Nesta segunda-feira (26), em evento no Rio de Janeiro, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, disse que “dá para explorar petróleo e garantir a proteção ambiental”. Mais um absurdo.

Fontes: Greenpeace, DW, Mar Sem Fim.

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