Queda da população de morcegos impulsionou mortalidade infantil nos EUA

Uma pesquisa publicada no periódico Science na semana passada sugere uma ligação causal entre o bem-estar humano e o dos morcegos. Segundo o trabalho, um fungo mortal que matou colônias de morcegos nos Estados Unidos tem relação com a morte de mais de 1,3 mil crianças no país.

O problema com os morcegos começou em 2006, quando o fungo Pseudogymnoascus destructans chegou à América do Norte vindo da Europa. Esse patógeno, que causa uma doença chamada síndrome do nariz branco, pode extinguir uma colônia inteira em apenas cinco anos.

Os morcegos são predadores naturais de insetos que causam danos às plantações agrícolas. Com a queda da população, os agricultores tiveram que se proteger de outra maneira.

Ao ter conhecimento deste caso, Eyal Frank, um professor assistente da Universidade de Chicago, decidiu utilizá-lo para determinar o valor dos morcegos, que se alimentam de pragas de plantações e desempenham papéis bem importantes nos sistemas alimentares humanos, e explicar o que poderia acontecer se eles desaparecessem.

A partir de sua investigação, Frank descobriu que os fazendeiros aumentaram drasticamente – em 31% em média – o uso de pesticidas após a mortandade dos animais, e as vendas das safras caíram cerca de 29% na época.

O custo financeiro foi de US$ 26,9 bilhões entre 2006 e 2017, mas os danos foram bem maiores. Em seguida, ele analisou a mortalidade infantil, uma métrica comumente usada para julgar o impacto de toxinas ambientais.

Os resultados mostraram que, apesar de o uso dos inseticidas estar dentro dos limites regulatórios, os condados onde os morcegos foram atingidos pelo vírus tiveram uma taxa de mortalidade infantil 7,9% maior, em média, do que os condados com morcegos saudáveis. Isso equivale a 1.334 mortes infantis extras. É provável que a água e o ar contaminados atuem como via de entrada das substâncias químicas em seres humanos.

O pesquisador insistiu em que as descobertas corroboram a sua teoria de que a mortalidade dos morcegos incidiu diretamente no repique da mortalidade infantil, em vez de ser uma simples coincidência.

Reportagem do The Guardian explica que o professor testou outros fatores que poderiam explicar plausivelmente o aumento de mortes: desemprego, epidemia de opioides, clima, diferenças entre mães ou a introdução de culturas geneticamente modificadas, mas nenhum deles explicou o aumento do uso de pesticidas ou o aumento das mortes.

“Os fazendeiros responderam ao declínio de morcegos insetívoros, e essa resposta teve um impacto adverso na saúde de bebês humanos”, ele constatou.

David Rosner, professor de história da Universidade de Columbia que passou sua carreira investigando toxinas ambientais, destacou que o estudo se junta a um conjunto de evidências que remontam à década de 1960 de que os pesticidas afetam negativamente a saúde humana.

“Estamos despejando esses materiais sintéticos em nosso ambiente, sem saber nada sobre quais serão seus impactos”, observou. “Não é surpreendente, é apenas meio chocante que descubramos isso todos os anos.”

“Precisamos de dados melhores sobre a presença de pesticidas no meio ambiente”, disse Frank, acrescentando que suas descobertas também mostram a necessidade de proteger os morcegos.

Estão sendo desenvolvidas vacinas contra a WNS, mas esses animais também estão ameaçados pela perda de seu habitat, as mudanças climáticas e ainda  os parques eólicos.

Novas ameaças à natureza. E ao ser humano

Reportagem da revista Science aponta que linhas de evidências conectam pesticidas e outros agroquímicos a riscos à saúde humana e, ainda que reguladores governamentais avaliem os perigos potenciais desses compostos antes de sua aprovação para uso, trabalhadores rurais e a população destes locais podem ser mais expostos quando essas substâncias se infiltram em águas subterrâneas, por exemplo. Estudos epidemiológicos têm vinculado algumas delas a problemas de desenvolvimento em bebês e crianças.

A pesquisa destaca que a síndrome do nariz branco é apenas uma das muitas ameaças que os morcegos enfrentam, incluindo aquelas compartilhadas com várias outras espécies, como perda de habitat e mudanças climáticas.

“Esses resultados não são apenas informativos sobre as interações com inimigos naturais em geral, e o controle biológico de pragas mais especificamente, mas também destacam os benefícios agrícolas e de saúde diretos que os morcegos fornecem”, explica Frank. “Melhorar nossa compreensão de como as mudanças na biodiversidade afetam o bem-estar humano será importante ao projetar e implementar políticas de conservação.”

A pesquisa se soma ao conjunto de evidências das repercussões da perda da fauna selvagem nos ecossistemas. Segundo outro estudo recente, na América Central a diminuição de anfíbios e serpentes provocou um aumento dos casos de malária em seres humanos.

Fontes: Um Só Planeta, Revista Forum, oLhar Digital, Isto É dinheiro.

Foto: Jackie Chin/Unsplash

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