Recifes de coral podem desaparecer em até 50 anos, diz estudo da ONU

O consumo excessivo e a agricultura insustentável estão alimentando crises sobrepostas que afetam a natureza e o clima, colocando em risco ecossistemas como os recifes de coral, alerta um relatório divulgado pela ONU (Organização das Nações Unidas) na terça-feira passada (17).

A avaliação é do painel de especialistas em biodiversidade da entidade, conhecido pela sigla em inglês IPBES (Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos).

“Os recifes de coral são os ecossistemas mais ameaçados e poderiam desaparecer globalmente nos próximos 10 a 50 anos”, destaca o documento, elaborado por dezenas de cientistas de todo o mundo.

Os principais fatores de pressão sobre esses habitats são o rápido aquecimento dos oceanos, a pesca excessiva e a poluição do mar. Uma perda tão catastrófica afetaria um bilhão de pessoas que dependem dos recifes para a alimentação, receitas do turismo e proteção contra tempestades.

Em termos de biodiversidade, os recifes de coral podem ser comparados às florestas tropicais: apesar de ocuparem só 1% da superfície da Terra, abrigam um quarto de toda a vida marinha.

O relatório, que levou três anos para ser preparado, foi aprovado por quase 150 governos após dias de debates intensos. A publicação acontece após resultados decepcionantes em uma série de reuniões de cúpulas da ONU sobre a situação do planeta, como a reunião que pretendia firmar um tratado global sobre poluição plástica.

Reação em cadeia

O documento revela a interação complexa entre a perda da natureza, o aquecimento global e as ameaças à água, a alimentação e a saúde, assim como o papel central das atividades humanas na geração das crises.

Abordar qualquer desafio de maneira isolada condena o progresso nos demais, destaca o órgão. “Há um perigo real de solucionarmos uma crise, enquanto pioramos outras”, disse Paula Harrison, uma das principais autoras do relatório.

O verdadeiro custo de tal destruição geralmente é oculto ou completamente ignorado. De acordo com os especialistas, os combustíveis fósseis, a agricultura e a pesca poderiam custar até US$ 25 trilhões por ano em custos não contabilizados, equivalentes a um quarto do PIB mundial.

A natureza é o sustento mais da metade da economia global, mas os governos gastam muito mais na sua destruição do que na conservação.

O economista James Vause, que contribuiu para o relatório, destacou que US$ 200 bilhões são destinados a cada ano à preservação da biodiversidade, enquanto 35 vezes mais — quase 7 trilhões — são investidos em subsídios e incentivos que prejudicam o planeta.

O relatório destaca o impacto particularmente prejudicial da agricultura intensiva, que contribuiu para a perda de biodiversidade, emissões de gases do efeito estufa e poluição do ar, da água e da terra.

Além disso, a pesca também estaria se aproximando de pontos de inflexão — ou seja, estágios em que os ecossistemas não conseguem mais se recuperar dos danos causados pela humanidade.

Soluções possíveis

De acordo com o texto, reduzir o consumo excessivo de carne vermelha e processada ajudaria a promover práticas agrícolas mais sustentáveis e teria um impacto positivo na saúde da população mundial.

A humanidade desperdiça uma quantidade enorme de alimentos cultivados, enquanto 800 milhões de pessoas passam fome a cada dia, afirmou à AFP Pamela McElwee, que também está entre as principais autoras do relatório.

Tratar as crises inter-relacionadas como problemas isolados “pode envolver desperdício de dinheiro”, acrescentou. Plantar árvores para enfrentar o aquecimento global, por exemplo, pode ter um efeito negativo para espécies locais de plantas ou animais quando é feito de forma inadequada.

Por outro lado, envolver as comunidades na gestão de áreas marinhas protegidas trouxe benefícios tanto para o meio ambiente quanto para as receitas do turismo e da pesca para as populações locais.

A IPBES reúne especialistas da ONU em biodiversidade e é equivalente ao IPCC, o principal órgão científico sobre mudança climática.

No início de novembro, as negociações da COP16, a conferência global sobre biodiversidade que ocorreu em Cali, na Colômbia, duraram mais que o esperado este ano e não chegaram a um acordo.

O atraso se deu depois que os países tentaram fazer alterações substanciais de última hora em questões como combustíveis fósseis, plásticos descartáveis e hábitos de consumo.

As nações se reunirão novamente em fevereiro para tentar quebrar o impasse sobre ampliar o financiamento para biodiversidade.

Fonte: Folha SP.

Foto: Lillian Suwanrumpha – 14.jun.24/AFP.