Elas paralisam cidades e colocam nossas vidas em risco. Para chamar a atenção para o fenômeno, a ONU marcou no dia 12 de julho o primeiro Dia Internacional de Combate às Tempestades de Areia e Poeira. A organização revela que o fenômeno afeta 151 países e tem se tornado uma questão transfronteiriça cada vez mais relevante.
Como tsunamis no céu, as tempestades de areia produzem nuvens densas de poeira e partículas que enterram tudo por onde passam. Até mesmo um pequeno contato com um “sopro” de areia é desagradável, causando coceira nos olhos, na pele e dificultando a respiração. A inalação de muitas partículas de areia e poeira pode até levar a óbito.
Um artigo da Organização das Nações Unidas (ONU) detalha que as tempestades de areia e poeira afetam cerca de 330 milhões de pessoas em todo o mundo e ocorrem desde a África subsaariana até o norte da China e da Austrália – e podem ser mais prejudiciais do que se imagina.
Intitulado “Sandstorms wreak worse havoc on desert communities due to climate change” (algo como “Tempestades de areia causam mais estragos em comunidades desérticas devido à mudança climática”), esse documento ajuda a esclarecer e conscientizar sobre os perigos representados por essas tempestades e incentiva a cooperação global para mitigá-las.
De onde elas vêm?
Quando os ventos fortes sopram sobre o solo árido ou com pouca vegetação, eles agitam a terra seca, a areia e a poeira, levantando-as no ar.
Isso pode gerar grandes tempestades de poeira. Algumas das partículas agitadas caem de volta ao solo, mas as menores são transportadas a grandes alturas e levadas mais longe, às vezes até milhares de quilômetros, por correntes de ar.
De acordo com o programa das Nações Unidas para o meio ambiente (PNUMA) e o Serviço Alemão de Meteorologia (DWD), cerca de dois bilhões de toneladas de areia e poeira são lançadas na atmosfera todos os anos a uma altura de aproximadamente 12 quilômetros. Cerca de um quarto desse volume acaba nos oceanos.
Metade de toda a areia no ar vem do Saara e o restante de outros desertos e regiões áridas. O chamado “cinturão de poeira” do nosso planeta se estende desde o Saara, passando pelo Oriente Médio, até os desertos da Ásia Central e do Nordeste.
De onde a areia é soprada, a cor revela a região de origem. No oeste do Saara, por exemplo, ela é vermelha ou marrom, enquanto no leste e no sul ela tende a ser amarelada ou branca.
Um aumento nos ventos do Saara, sobretudo com pico no final de junho e meados de agosto, faz com que a poeira seja injetada na troposfera — a camada mais baixa da atmosfera do planeta. Lá, ela forma a Camada de Ar Saariana, uma pluma de ar extremamente seco e empoeirado de 3 a 4 km de espessura, que se forma a partir de 1,6 km acima da superfície.
Essa camada de ar do Saara tem cerca de 50% menos umidade do que normalmente se espera na atmosfera de regiões tropicais. Por conta disso, a cada três a cinco dias, os ventos predominantes permanentes de leste a oeste do Equador sopram a camada através do Oceano Atlântico em direção aos EUA. Ao chegar no país, toda essa poeira pode causar diversos impactos.
Uma das principais formas pelas quais a camada de ar do Saara pode deixar sua marca é no clima. De acordo com pesquisadores, esse ar seco pode suprimir as nuvens da tarde a ajudar a esfriar a temperatura. Ele também pode ajudar a enfraquecer tempestades tropicais, promovendo correntes descendentes. Isso também pode provocar alguns dos dias mais quentes do ano
As tempestades de areia são importantes para nossos ecossistemas?
A areia do deserto é composta de substâncias orgânicas e inorgânicas, incluindo muitos nutrientes e minerais.
A poeira do Saara que sopra até as florestas tropicais da América do Sul e do Caribe é um importante fertilizante mineral. A areia se deposita no chão e oferece nutrientes para o solo dessas regiões.
A poeira do deserto também é um fertilizante extremamente importante para os oceanos, fornecendo a base para as cadeias alimentares em nossos mares. Os corais, por exemplo, usam partículas de poeira e areia para construir seus esqueletos.
Entretanto, em excesso, a areia e a poeira podem ser prejudiciais aos ecossistemas.
Os cientistas suspeitam que isso pode levar a um maior crescimento de algas em nossos oceanos. E, em excesso, as algas podem privar a água de oxigênio, matando a vida marinha. Os microorganismos contidos na poeira do deserto também podem estar por trás de várias doenças dos corais.
Por que há cada vez mais tempestades de areia?
Embora a poeira e as tempestades de areia sempre tenham ocorrido, em algumas áreas do mundo sua frequência dobrou desde o século passado.
As Nações Unidas registraram que pelo menos um quarto das emissões globais de poeira pode ser atribuído à atividade humana, principalmente devido ao mau uso da terra e da água.
De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), cerca de metade da poeira na atmosfera vem do solo que foi danificado pelo desmatamento, cultivo agrícola ou industrial, secas e chuvas fortes. Os ventos podem facilmente arrastar esse tipo de solo perturbado.
Qual impacto isso tem em nossa saúde e no clima?
Embora a poeira e as tempestades de areia sejam importantes para o meio ambiente, o aumento delas têm efeitos negativos.
As partículas de poeira transportadas pelo ar também representam sérios riscos à saúde humana. Aproximadamente 40% dos aerossóis (um conjunto de partículas minúsculas) nos níveis mais baixos da atmosfera são compostos de partículas de poeira transportadas pelo vento. Quando essas partículas entram no sistema respiratório, podem causar doenças como asma e pneumonia, afirma a ONU.
As partículas mais finas de areia ou pó tem o potencial também de penetrar profundamente nos pulmões, atingir a corrente sanguínea e afetar vários órgãos. Um estudo de 2014 citado pela ONU estimou que a exposição a partículas de poeira resultou em 400 mil mortes prematuras em todo o mundo.
Além disso, as tempestades de poeira podem atuar como vetores de doenças infecciosas, acrescenta a ONU.
A meningite meningocócica, uma infecção bacteriana do cérebro, tem uma alta incidência no chamado “cinturão da meningite” da África Subsaariana, onde as condições de poeira favorecem sua disseminação. Se não para tratada, essa doença é letal em 50% dos casos, conclui a agência
Isso ocorre, pois a poeira do deserto pode conter vários micro-organismos, como fungos, bactérias e vírus. As tempestades de areia afetam regularmente o tráfego aéreo, removem o solo fértil dos campos e destroem as colheitas.
Elas também podem influenciar nosso clima, pois a água se acumula em torno das partículas sólidas de poeira, causando a formação de mais nuvens. No entanto, elas também reduzem a precipitação, pois a presença de matéria sólida de poeira significa que leva mais tempo para a formação de grandes gotículas de água.
A criação de uma maior cobertura de nuvens também pode reduzir a radiação solar e uma maior concentração de partículas de poeira na atmosfera pode influenciar a distribuição de ciclones em todo o mundo.
O que podemos fazer para combater as tempestades de areia?
As tempestades de areia ainda são subestimadas como um risco de desastre em muitos lugares, de acordo com a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (UNCCD).
Para evitar seu aumento, a UNCCD afirma que precisamos começar a cuidar melhor do nosso solo, protegendo-o contra o ressecamento e aumentando sua fertilidade.
Para isso, é necessário reduzir as terras abertas e sem vegetação por meio do reflorestamento e do uso mais sustentável das águas subterrâneas. Em áreas onde há criação de gado, também é importante garantir a rotação de animais, para que as plantas possam crescer novamente nas terras de pastagem.
Fontes: ONU News, National Geographic, Revista Planeta, Revista Galileu.
Foto: Martadha Al-Sudani/AA/Picture Aliance.