União Europeia chega a acordo por nova lei que proíbe importação de produtos ligados à desmatamento

Nesta terça-feira (6), parlamentares da União Europeia (UE) chegaram a um acordo preliminar com os governos do bloco por uma nova lei que obrigará as empresas a verificar e emitir uma declaração de que os produtos colocados no mercado não levaram ao desmatamento e à degradação florestal em qualquer lugar do mundo. De acordo com o texto acordado, embora nenhum país ou commodity seja banido, as empresas não poderão vender seus produtos na UE sem esse tipo de declaração.

As empresas também terão que verificar o cumprimento da legislação relevante do país de produção, inclusive sobre direitos humanos e se os direitos dos povos indígenas envolvidos foram respeitados. Segundo a UE, a nova lei garantiria aos consumidores europeus que os produtos que compram não contribuem para a destruição e degradação das florestas, incluindo florestas primárias insubstituíveis, reduzindo assim a contribuição da UE para as mudanças climáticas e a perda de biodiversidade a nível global.

No Brasil, essa lei antidesmate pode atingir o comércio de carne bovina, soja, óleo de palma, madeira, cacau e café, e a alguns produtos derivados, incluindo couro, chocolate e móveis. Borracha, carvão e alguns derivados de óleo de palma foram incluídos a pedido dos parlamentares da UE.

Isso pode comprometer a exportação de produtos de origem bovina do Brasil para o mercado europeu. Em especial para as gigantes da indústria da carne JBS, Marfrig e Minerva que não estão em conformidade com lei europeia e não se conformam às exigências da lei.

Durante a negociação, a união afirmou que trabalhará com os países afetados para aumentar sua capacidade de implementação das regras. Entre eles, estão o Brasil, Indonésia e Colômbia. Segundo a Reuters, alguns países alegam que as novas determinações são onerosas e caras.

O Parlamento também garantiu uma definição mais ampla de degradação florestal que inclui a conversão de florestas primárias ou florestas em regeneração natural em florestas plantadas ou em outras terras arborizadas e a conversão de florestas primárias em florestas plantadas, informa a Reuters.

Essa expansão da lei era esperada principalmente por causa de outros biomas com vasta vegetação. Um exemplo é o Cerrado, no qual 600 mil quilômetros quadrados do Cerrado não estariam sujeitos à lei. Essa é uma área quase tão grande quanto a Ucrânia. E é nessa região que a fronteira de expansão agrícola mais cresce no Brasil todo, de acordo com o Instituto Cerrados, sem fins lucrativos.

“A União Europeia acha adequado consumir produtos vinculados à perda da savana mais biodiversa do mundo? Isso não parece inteligente”, disse Yuri Salmona, diretor do Instituto Cerrados.

A Comissão deve avaliar, em até um ano após a entrada em vigor da legislação, se deve estender o escopo a outras terras arborizadas. Depois, a Comissão ainda avaliará o alargamento do âmbito de aplicação a outros ecossistemas, incluindo terras com elevados teores de carbono e elevado valor de biodiversidade, bem como a outros produtos de base.

Os parlamentares avaliarão também a necessidade de obrigar as instituições financeiras da UE a fornecerem serviços financeiros apenas aos seus clientes se avaliarem que existe apenas um risco insignificante de que esses serviços não conduzam à desflorestação.

As autoridades competentes da UE terão acesso a informações fornecidas pelas empresas, como coordenadas de geolocalização, e realizarão verificações. Elas podem, por exemplo, usar ferramentas de monitoramento por satélite e análise de DNA para verificar a origem dos produtos.

Desmatamento legal e ilegal

Para o economista do meio ambiente e pesquisador Alain Karsenty, do Centro de cooperação internacional e pesquisa agroeconômica para o desenvolvimento (CIRAD), o mais importante no novo texto é a não distinção entre desmatamento legal e ilegal.

“Desde o fim de 2021, os britânicos têm um texto equivalente, com uma diferença notável: o texto britânico proíbe a entrada de produtos vindos de desmatamento ilegal”, destaca. “O texto europeu não faz diferença entre desmatamento legal ou ilegal. Assim, produtos que tenham origem de desmatamento considerado ‘legal’ segundo o texto de alguns países, serão impedidos de entrar na Europa”, explica.

Sobre a forma de fiscalizar as novas regras, o especialista diz que “toda a responsabilidade vai recair sobre os importadores. São esses operadores econômicos que terão de controlar os fornecedores para saber se o produto colocado no mercado não vem de desmatamento”, afirma. “Todas as terras que serviram para a produção devem ser geolocalizadas com as coordenadas”, especifica. Karsenty lembra ainda que haverá “mecanismos de sanções financeiras e controles aleatórios, porém rígidos” para verificar o cumprimento das normas.

O especialista também destaca que os países enfrentam situações muito diferentes e que às vezes é difícil contemplar todas as ameaças numa legislação ampla. O Parlamento Europeu deixou o prazo de um ano para refletir sobre a inclusão de “outras áreas arborizadas”, como o cerrado, que se estende pelo Brasil, Paraguay e Bolívia.

“O que vale para o Brasil, não vale para outros países na África”, alerta Karsenty. “O Brasil tem espaço de pastagens degradadas para plantio de culturas, tem alternativas. Já a África não, e as plantações avançam sobre a savana ou as florestas. A regulamentação terá que olhar caso a caso, pois senão pode haver problemas de aplicação” da lei, conclui.

Fonte: Um Só Planeta, G1, Reuters.

Foto: Ibama / Divulgação.