Brasil registra recorde de acidentes com exploração de petróleo em 2024

Os defensores da exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas dizem que a Petrobras, que pleiteia uma licença para perfurar um poço no bloco FZA-M-59, no litoral do Amapá, tem um histórico operacional “invejável”. Mas os números da Agência Nacional do Petróleo (ANP) sobre os acidentes na exploração de petróleo e gás no mar em 2024 criam mais preocupações, ainda que não se restrinjam à petroleira estatal brasileira.

O Painel Dinâmico de Incidentes de Exploração e Produção (E&P) da ANP mostra que houve 731 acidentes nas operações em alto mar no ano passado – dois por dia, destaca André Borges na Folha. É um número recorde na série histórica do órgão regulador, iniciada em 2012. Em 2023, a exploração marítima de petróleo registrou 718 acidentes, e em 2022, 598.

A ANP classifica como “acidente” um evento no qual houve dano – poluição ou danos ao meio ambiente ou à saúde humana, prejuízos materiais ao patrimônio próprio ou de terceiros ou ainda a interrupção das operações da instalação. Em 2024, a maior parte dos acidentes ocorreu em instalações de produção (384), seguida de ocorrências em sondas (134), atividades ligadas a embarcações de apoio (91) e na fase de exploração dos poços (91). A instalação de sistemas submarinos contabilizou 23 casos, e outros 8 não tiveram origem determinada.

Além dos acidentes, a ANP mede as situações de “quase acidentes”, eventos com potencial de dano. Embora não tenha sido recorde em 2024, o número de quase acidentes saltou de 970 ocorrências em 2022 para 1.375 no ano passado.

Os números da ANP não detalham onde os acidentes ocorreram. Mas nenhum deles foi na foz do Amazonas, pois não há operação petrolífera na região no momento. No entanto, muitos dos quase 100 poços já perfurados na foz foram abandonados durante a perfuração por problemas mecânicos. A própria Petrobras abandonou um poço que abria numa área próxima ao bloco 59 por causa de um acidente provocado pela forte correnteza.

Ainda assim, o imenso risco operacional numa região de altíssima sensibilidade ambiental como a foz do Amazonas não abala nem a petroleira, nem os defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota”. Na 6ª feira (14/3), a Petrobras informou ao IBAMA que irá concluir a Unidade de Estabilização e Despetrolização (UED) de Oiapoque ainda este mês, e que a instalação poderá ser vistoriada em 7 de abril, informa o Valor. A unidade era uma das condicionantes no licenciamento do bloco 59 – mas não a única, já que técnicos do IBAMA voltaram a recomendar a negativa da licença.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou na semana passada que iria “pessoalmente” ao IBAMA para pedir a liberação da licença para a Petrobras ao presidente do órgão, Rodrigo Agostinho. Segundo O Globo, Silveira também terá a companhia da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, no encontro, ainda sem data marcada.

.Em tempo: Quem defende a exploração de petróleo na foz do Amazonas diz que ela é necessária para garantir o abastecimento para o Brasil no futuro. No entanto, pela primeira vez na sua história, o país exportou mais da metade do óleo cru que produziu no ano passado, mostra a Folha. Segundo o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (INEEP), as exportações brasileiras corresponderam a 52% de todo o petróleo que o país produziu em 2024. A média exportada foi de 1,75 milhão de barris por dia, marca 10% maior do que a registrada em 2023, de 1,6 milhão de barris por dia.

A alta se deu mesmo em um contexto de queda da produção nacional, que ficou, em média, em 3,4 milhões de barris por dia. Os números mostram que ainda que importemos volumes de gasolina, óleo diesel e gás de cozinha por falta de refinarias para processar o nosso petróleo, a produção interna atende a população, e as reservas já descobertas podem ser administradas para evitar qualquer desabastecimento no futuro.

Histórico de acidentes

Embora até mesmo muitos dos acidentes sejam controlados por protocolos de segurança e não causem danos graves, o histórico do setor inclui episódios de grande repercussão, como o vazamento de óleo na baía de Guanabara, em 2000, e o desastre da plataforma P-36, em 2001, lembra a reportagem da Folha. Mais recentemente, vazamentos e manchas de óleo afetaram a costa brasileira em 2019 e 2022.

A atual busca por explorar petróleo na Foz do Amazonas também tem gerado preocupações ambientais. A região, já vulnerável devido à desmatamento e outras atividades extrativas, é especialmente sensível a incidentes envolvendo petróleo, que podem comprometer ecossistemas únicos e afetar comunidades indígenas e tradicionais.

O licenciamento de atividades na região situada na margem equatorial, que estende-se do Amapá ao Rio Grande do Norte, tem sido objeto de intensos debates. O Ibama já rejeitou três vezes as propostas de segurança da Petrobras para o bloco 59, por considerar que as medidas apresentadas não garantem proteção adequada à região.

Por que o número de ocorrências cresceu?

Em resposta ao aumento dos acidentes, a ANP afirmou que o crescimento da atividade no setor, com a entrada de novas unidades de produção e a intensificação da perfuração de poços, tem contribuído para a elevação dos números. A produção de petróleo no Brasil também cresceu significativamente, de 1.890 barris por dia em 2012 para 3.320 barris em 2024. A agência ressaltou ainda que continua monitorando e fiscalizando as operações para garantir a adoção das melhores práticas de segurança no setor.

Fontes: Um Só Planeta, Folha SP, ClimaInfo, CBN.

Foto: Geraldo Falcão/Agência Petrobras.