Como Brasil contribui para prática cruel que tira barbatana de tubarão vivo

Você sabe o que é ‘shark finning’ e por que, além de cruel, essa prática representa um problema para todo o ecossistema marinho?

O termo é usado para designar o corte da barbatana de um tubarão, que, em seguida, é descartado ainda vivo no mar, resultando em uma sentença de morte lenta e dolorosa aos animais.

Mas o que as pessoas, em geral, têm a ver com isso e como podem ajudar a mitigar essas capturas brutais?

De acordo com estimativas da Humane Society International, organização não-governamental de proteção animal com atuação em mais de 50 países, cerca de 72 milhões de tubarões são mortos, por ano, unicamente para que suas barbatanas sejam retiradas. O objetivo? Servir de iguaria para uma sopa tradicional e sofisticada, consumida em países asiáticos como China, Japão, Hong Kong e Vietnã.

O custo de uma tigela de sopa de barbatana de tubarão pode chegar a até US$ 100 dólares (cerca de R$ 500). Um luxo para poucos, mas que tem como resultado um problema global: hoje, inúmeras espécies de tubarões estão ameaçadas de extinção devido à captura predatória e ao desequilíbrio nos sistemas marinhos.

Além disso, apesar do consumo da sopa de barbatana de tubarão se restringir à região da Ásia, estes animais circulam (e são alvo) nos oceanos do mundo todo e, mesmo com diversos países proibindo a prática, não são raras a caça e o comércio ilegal de barbatanas.

As partes retiradas costumam incluir nadadeiras peitorais, nadadeiras dorsais e a nadadeira caudal dos tubarões, mas, a depender da espécie, tamanho e características do animal também podem ser retiradas as nadadeiras pélvicas, menos apreciadas. As espécies afetadas são diversas, dentre elas os tubarões-martelo, o tubarão anequim e o tubarão-lixa.

Brasil tem o maior consumo de carne de tubarão no mundo

Nos últimos anos, sobretudo no início da década de 2010, o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) apreendeu dezenas de toneladas de barbatanas de tubarão durante operações de fiscalização no litoral brasileiro.

Uma publicação da Universidade Estadual Paulista (Unesp) aponta que, entre 1998 e 2014, operações no Pará e no Rio Grande do Sul resultaram na apreensão de 85 toneladas de barbatanas secas, prontas para exportação. Há registros históricos de apreensões também em estados como Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Norte

Chama atenção ainda que, conforme estudos recentes, sete em cada dez brasileiros não sabem que a carne de cação que é vendida nos supermercados é, na verdade, de tubarão (só muda a nomenclatura). O Brasil também é o maior importador e consumidor mundial da carne de cação, ou seja, mesmo que de forma involuntária, esse consumo estimula a comercialização e ameaça a preservação de espécies de tubarão.

Os efeitos nocivos do ‘finning’ voltaram a gerar debates recentemente, a partir de uma série de postagens feitas online pelo agente ambiental do Ibama, Wallace Lopes. A primeira mensagem publicada no Twitter destacando uma apreensão de toneladas de barbatanas de tubarão feita pelo Ibama no Pará, em 2012, teve mais de 6,7 mil replicações, quase 800 comentários e mais de 30 mil curtidas.

Na sequência, o fiscal federal deu detalhes de como funciona a prática e destacou que apesar de os brasileiros não terem tradição em consumir sopa de barbatana de tubarão, desempenha, nas suas palavras, “um papel central para o risco de extinção que, infelizmente, aflige muitas espécies de tubarão”.

“O caso é que a maioria dos países não possui o costume de consumir carne de tubarão. O Brasil também não tinha, mas aí a indústria pesqueira nacional resolveu essa questão dando um nome diferente à carne de tubarão: vendida aqui com o nome genérico de ‘cação’.

Essa informação enganosa, os preços atrativos e o fato de ser uma carne branca e sem espinhos são alguns dos fatores que resultaram no aumento do consumo entre as famílias brasileiras.

A explicação está na falta de rótulos adequados referentes à espécie que está sendo vendida. “Além da possibilidade de consumo de espécies ameaçadas, pode servir também de “lavanderia” para o comércio de barbatanas, que é muito mais lucrativo”, denunciou Lopes.

Redução do consumo ajuda a preservar espécies

No Brasil, como não há consumo de barbatanas e muitas das espécies de tubarões são protegidas de captura pela legislação, acontece que para além da busca pela carne de cação, muitos dos tubarões ao caírem em redes morrem. Este também é um fator considerável para ocorrer o comércio ilegal das barbatanas.

“Nesses casos, o pescador, muitas vezes, se depara com a seguinte opção: ou devolve o tubarão para o mar mesmo o animal estando morto ou esconde essas nadadeiras no barco e tenta repassá-la para outra embarcação antes de retornar. A negociação é feita ali mesmo e as peças são levadas por esses atravessadores para águas internacionais.

Combate global

Desde a década de 1990, ações de combate ao ‘finning’ vem se tornando mais frequentes e enérgicas no combate à exploração dos tubarões. Em 1999, a Organização das Nações Unidas (ONU) criou o ‘Plano de Ação Internacional para a Conservação e Manejo de Tubarões’. Apesar de nenhum país ser obrigado a participar da iniciativa, muitas nações estão aderindo a normativas de responsabilidade.

Nos Estados Unidos, desde 2010, uma lei de conservação de tubarões exige que os animais cheguem em solo com suas barbatanas intactas, reduzindo a prática de ‘finning’.

No Brasil, em 2014, foi editada a portaria número 445, que define espécies ameaçadas de extinção no litoral brasileiro e que proíbe a captura dessas espécies, também inibindo a ação. No mês passado, a portaria 148 atualizou as informações contidas na normativa anterior.

Outros esforços importantes vêm da Europa. No ano passado, o governo do Reino Unido indicou que vai introduzir a proibição da importação e exportação de barbatanas de tubarão. Já uma iniciativa popular criada nos países que compõem a União Europeia colheu, até janeiro, mais de 1,2 milhão de assinaturas para apresentar ao Parlamento e acabar com o comércio de barbatanas no bloco.

Na própria Ásia, cadeias de restaurantes e hotéis também vem interrompendo a venda da sopa de barbatanas, um indicativo de que ainda há muito a ser feito, mas a conscientização está cada vez maior.

Fonte: UOL.

Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons.