O desmonte das políticas ambientais no Brasil nos anos Bolsonaro, que resultou em aumento do desmatamento em todos os biomas e das emissões de gases de efeito estufa do país, provocou a mobilização de algumas organizações da sociedade civil a fim de fortalecer a bancada ambientalista no Congresso na próxima legislatura.
A compreensão é de que é no Legislativo que a agenda ambiental e climática pode avançar ou atravancar no país. Foi lá que parte dos retrocessos observados nos últimos quatro anos —mas não só— teve palco.
A plataforma Farol Verde, uma das mais robustas a rastrear candidaturas à reeleição e novas mais alinhadas com a agenda ambiental, identificou que a maior parte dos candidatos que tentam se reeleger na Câmara ou no Senado tiveram um desempenho antiambiental na atual legislatura.
O levantamento, divulgado nesta terça-feira (20), faz um raio-X sobre como votaram, entre janeiro de 2019 e julho deste ano, 486 parlamentares que tentam se manter no cargo ou mudar para a Casa vizinha. O resultado mostra que a maioria não seria aprovada no critério de compromisso ambiental.
Para fazer essa análise, a plataforma, apoiada por diversas organizações da sociedade civil, criou um índice de convergência ambiental. Chamado de ICAt, ele deu uma nota de 0% a 100% para cada um dos candidatos. Pelo cálculo, quanto mais próximo de 100%, mais verde é o candidato à reeleição.
A nota leva em conta como esses políticos se manifestaram em 12 votações críticas para a área no período. Elas trataram de anistias a grilagem de terras, regularização fundiária, flexibilização do Código Florestal, dia dos povos indígenas, urgência para mineração em terras indígenas, liberação de agrotóxicos, flexibilização do licenciamento ambiental, mercado de carbono, pagamento por serviços ambientais e água como direito fundamental.
A referência para o cálculo da convergência ambiental foi a votação do coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista na Câmara e no Senado.
Entre 453 candidatos à reeleição para a Câmara (incluindo três senadores que tentam uma vaga na Casa), apenas 132 (29%) apresentaram um ICAt superior a 50%. E somente 25 “passaram com louvor”, com mais de 90% de convergência. A pontuação média dos candidatos foi de 43%.
“O ICAt funciona como uma nota. E, se fosse escola pública, com média cinco, na média essa turma estaria reprovada em matéria ambiental”, comenta o advogado André Lima, idealizador e coordenador do Farol Verde.
Uma nota média de 50%, avalia, seria o necessário para a Câmara ser considerada minimamente equilibrada e medianamente comprometida com as pautas socioambientais. A média das mulheres, que são minoria na Câmara, foi melhor que a dos homens (51,3% e 41,5%, respectivamente).
Considerando os candidatos por região, os parlamentares do Nordeste foram os que se saíram melhor em matéria socioambiental, com ICAt médio de 46%. Os do Sul foram os piores, com 39%.
As cinco melhores unidades da federação, as únicas com nota acima de 50%, representam pouco mais de 10% da bancada total da Câmara. Já as sete piores bancadas estaduais, com índice médio abaixo de 40%, possuem 133 deputados (25% do total).
Praticamente em todos os estados, apenas cerca de um terço dos deputados apresentou indicador ambiental positivo, acima de 50%, e mais da metade deles tiveram índices inferiores a 30%.
A análise por bancada confirmou a ideia de que a agenda ambiental e climática na Câmara é pauta preponderantemente de partidos de esquerda e centro-esquerda. As legendas com melhor desempenho no índice foram Rede, PT, PCdoB, PSOL, PSB e PDT.
As com os piores índices foram Novo, Podemos, União Brasil, PSC, PL, PSD, Solidariedade, Republicanos e PP.
Para o Senado, que tem 34 candidatos à reeleição (sendo 12 senadores e 22 deputados federais nesta legislatura), a análise mostrou uma atividade um pouco mais equilibrada, com 32% dos parlamentares (11) com nota superior a 50%. A análise bate com o que se observou nos últimos anos: “projetos bomba” antiambiente foram contidos ou amenizados no Senado.
“A gente tem de sair do corner, da defensiva, da resistência aos retrocessos e ir para a grande virada parlamentar pelo clima e pela sustentabilidade. O Brasil tem tudo para voltar a ser uma grande liderança, mas sem um Parlamento mais sensível a essas questões, mesmo um bom presidente pode ter dificuldade com essa agenda”, diz Lima.
“O Parlamento é chave para conter retrocessos. Precisa ter um Congresso mais verde para ter um Executivo que equilibre mais o jogo”, complementa.
No site da plataforma, além das notas no ICAt, o eleitor também pode ver um compilado sobre como o candidato se comporta nas redes sociais em relação a temas como florestas, clima, biodiversidade, agrotóxico, grilagem, entre outros.
Além do Farol Verde, outras iniciativas, como Clima de Eleição, Sinal de Fumaça e Voto sem Vacilo, estão rastreando candidaturas novas e à reeleição mais alinhadas com a agenda ambiental.
“Precisamos de pelo menos 250 parlamentares que fiquem acima de 50% no índice de convergência. Não precisa votar em todas as matérias de acordo com a agenda ambiental, mas se vota aqui, ali, já melhora o cenário”, afirma Lima.
Segundo ele, em governos anteriores, essa negociação foi mais possível, o que não ocorreu nos últimos quatro anos. “O governo esticou a corda e a Câmara, depois de Arthur Lira assumir a presidência, embarcou no governo. Se a gente melhorar em 20% o índice médio ambiental da Câmara, já resulta em algo mais estratégico, mais conversável.”
Fonte: Folha SP, Projeto Planeta em Transe.
Pedro Ladeira