Cerca de 20 passageiros ficaram feridos, tendo alguns deles recebido os primeiros socorros para ferimentos na cabeça.
A forte turbulência que atingiu um voo da Singapore Airlines proveniente de Londres causou uma morte e vários feridos. No entanto, o que aconteceu a bordo do Boeing 777-300ER com destino a Singapura ainda não é claro.
Os sites de localização das companhias aéreas registaram que o avião desceu cerca de 1800 metros em três minutos quando voou para o ar agitado para lá da Baía de Bengala.
Qual o perigo da turbulência num voo?
“Os ferimentos provocados por turbulência grave são relativamente raros no contexto de milhões de voos efetuados”, disse à BBC John Strickland, especialista em aviação geral. E as tripulações de voo podem frequentemente prever com antecedência o mau tempo e o ar agitado e estão treinadas para lidar com os efeitos.
“No entanto, a turbulência severa pode ser dramática e provocar ferimentos graves ou, infelizmente, neste caso, uma fatalidade”. Situações como esta, do Boeing 777-300ER, podem ocorrer quando um avião se depara com mau tempo.
Também pode acontecer quando voa em “turbulência de ar puro”, que ocorre apesar de condições aparentemente calmas. Esta ocorrência é particularmente perigosa porque, ao contrário da turbulência durante uma tempestade, é quase impossível de ser captada pelos instrumentos de deteção remota da aviação.
Também é difícil prever quando irá ocorrer porque é causada por turbilhões de pequena escala que são demasiado localizados para serem calculados pela maioria dos modelos meteorológicos.
A turbulência é a principal causa de ferimentos não mortais nos passageiros e na tripulação, de acordo com a Associação Internacional de Transportes Aéreos.
Entre 2009 e 2021, 146 passageiros e tripulantes ficaram gravemente feridos em incidentes de turbulência, de acordo com a Administração Federal de Aviação.
Em dezembro de 2022, 20 pessoas foram hospitalizadas na sequência de uma situação de turbulência num voo da Hawaiian Airlines de Phoenix para Honolulu.
Em março de 2023, um passageiro morreu depois de uma forte turbulência ter atingido o jato executivo em que viajava.
Em agosto passado, 11 pessoas tiveram de ser hospitalizadas depois de um voo da Delta ter sofrido uma turbulência na sua descida para Atlanta.
Os ferimentos terão incluído lacerações, ossos partidos, ferimentos na cabeça e perda de consciência, principalmente devido ao facto de os passageiros não usarem o cinto de segurança.
“Não é por acaso que as companhias aéreas recomendam que os cintos de segurança sejam mantidos levemente apertados durante todo o voo, seja ele longo ou curto”, disse Strickland.
Uma vez que têm de estar de pé durante mais tempo do que os passageiros, as assistentes de bordo são as mais vulneráveis num avião – aliás, têm 24 vezes mais probabilidades de ficarem gravemente feridas.
A turbulência está piorando devido às alterações climáticas
No ano passado, um estudo efetuado por meteorologistas da Universidade de Reading, no Reino Unido, concluiu que os céus estão até 55% mais turbulentos do que há quatro décadas, devido às alterações climáticas.
O ar mais quente resultante das emissões de dióxido de carbono está alterando as correntes de ar na corrente de jato, exacerbando a turbulência no ar limpo no Atlântico Norte e a nível mundial.
A equipe de cientistas descobriu que a turbulência severa no ar aumentou de 17,7 horas em 1979 para 27,4 horas em 2020 num ponto médio sobre o Atlântico Norte.
A turbulência moderada nesta zona aumentou 37%, de 70,0 para 96,1 horas, e a turbulência ligeira subiu 17%, de 466,5 para 546,8 horas.
Embora o Atlântico Norte tenha registado os maiores aumentos, o novo estudo concluiu que outras rotas de voo movimentadas sobre os Estados Unidos, a Europa, o Médio Oriente e o Atlântico Sul também registaram um aumento significativo da turbulência.
Cientistas indicam que alguns tipos de turbulência aérea devem se tornar mais comuns à medida que as mudanças climáticas se aprofundam, uma vez que o fenômeno é altamente influenciado pela temperatura global.
O especialista em aviação civil Adalberto Febeliano compara o que está acontecendo com a Terra sob aquecimento global ao ato de se pôr a água para ferver. Na ação, o fogo esquenta a água, e a água esquenta o ar acima dela.
O mesmo se dá com o solo que, com o aumento da temperatura decorrente das elevadas concentrações de gases causadores do efeito estufa, faz aumentar a temperatura da camada de ar acima dele. E as turbulências aéreas nada mais são do que o impacto de movimentações atmosféricas provocada s por variações de temperatura e pressão ou deslocamento de massas de ar sobre os aviões.
Um dos tipos de turbulência que já vem se tornando mais comum em razão das mudanças climáticas é a de céu claro, considerada mais perigosa justamente por não ser facilmente detectada por radares.
Uma pesquisa publicada na revista Geophysical Research Letters no ano passado afirma que, de 1979 a 2020, a incidência de turbulências de céu claro graves aumentou em 55% nas rotas sobre o Atlântico Norte, e em 41% nas rotas sobre o território dos Estados Unidos.
Os autores escrevem que, apesar de as porcentagens variarem de um ano para o outro, “há uma tendência clara de aumento a longo prazo”. “Encontramos aumentos semelhantes em outras rotas de voo movimentadas sobre a Europa, o Oriente Médio e o Atlântico Sul”, prosseguem em um texto sobre a pesquisa publicado no The Conversation, portal dedicado à divulgação científica.
Mauricio Pontes, investigador de acidentes aeronáuticos e especialista em gestão de crises da consultoria C5I, diz que, apesar de a pesquisa não analisar outros tipos de turbulência, é possível depreender que alguns deles também se tornarão mais constantes, como aqueles causados por tempestades.
“Estamos tendo fenômenos meteorológicos superlativos, as tempestades estão se tornando mais frequentes por causa do aumento da temperatura”, afirma Pontes. “O aquecimento global afeta a vida de diversas formas. Não seria diferente no ambiente aéreo.”
“Deveríamos investir em sistemas melhorados de previsão e deteção de turbulência para evitar que o ar mais áspero se traduza em voos mais turbulentos nas próximas décadas”, afirma Paul Williams, um cientista atmosférico da Universidade de Reading, coautor do estudo.
“As companhias aéreas terão de começar a pensar na forma de gerir o aumento da turbulência, uma vez que esta custa ao sector 150 a 500 milhões de dólares [134 a 465 milhões de euros] por ano, só nos Estados Unidos”, afirma Mark Prosser, meteorologista da Universidade de Reading que liderou o estudo.
“Cada minuto adicional passado a viajar em turbulência aumenta o desgaste do avião, bem como o risco de ferimentos para os passageiros e assistentes de bordo”.
Fonte: Euronews, Folha SP, G1.
Foto: Saif Zaman ( আয়ান ).