Entre as obras necessárias para a instalação dos parques eólicos estão as explosões de rochas, que provocam risco de desabamento e soterramento em locais que abrigam pinturas rupestres e sepultamentos com mais de dez mil anos de existência, localizados em parques arqueológicos no Seridó do Rio Grande do Norte, em sítios como Casa Santa, Talhado do Gavião e Pedra do Alexandre, que são mais antigos do que as pirâmides do Egito ou o Círculo de Stonehenge, na Inglaterra.
O alerta tem sido emitido por pesquisadores que irão se reunir nesta sexta (31) com professores, ativistas e lideranças indígenas de diversos estados nordestinos na Universidade Federal de Pernambuco, no campus Recife (UFPE), para discutir a ameaça ao patrimônio histórico na mesa redonda “Patrimônio Arqueológico x Energia eólica: o caso da Área Arqueológica do Seridó”.
De acordo com o grupo, a ocupação das áreas serranas pelas empresas de energia eólica, onde ficam os sítios arqueológicos, tem ocorrido de maneira acelerada com “licenciamentos pouco rigorosos e riscos severos ao meio ambiente, às populações e ao patrimônio cultural”.
Ao todo, o Seridó potiguar abriga mais de 300 sítios arqueológicos, que são pesquisados por cientistas desde os anos 1960. O Rio Grande do Norte possui o maior número de turbinas eólicas em operação no Brasil, sendo também o maior gerador desse tipo de energia, com mais de 2.800 máquinas em atividade, segundo a Secretaria Estadual do Desenvolvimento Econômico, da Ciência, da Tecnologia e da Inovação (SEDEC) do RN.
Caatinga
A chegada das eólicas também tem implicado em desmatamento nas áreas de Caatinga, um bioma já fragilizado e com processos de desertificação em curso, inclusive, no próprio Seridó. Além disso, a instalação das eólicas também tem prejudicado moradores de áreas próximas, causando adoecimento, rachaduras em residências e cisternas de água, perda de acesso a locais de extrativismo vegetal, lazer e culto.
Os pesquisadores apontam que os danos aos sítios arqueológicos causariam males, também, ao patrimônio regional, cada vez mais valorizado pelo turismo sustentável, que já começa a ser afetado pela produção energética, prejudicando a memória da coletividade e a materialização da ancestralidade, que tem sido, cada vez mais, reivindicada por parte da população local, em processo de reconhecimento das próprias raízes indígenas.
Diversidade e importância arqueológica
Os sítios arqueológicos do Seridó foram reconhecidos pela primeira vez por volta de 1920, pelo autodidata seridoense José de Azevedo Dantas, e atraem cientistas com pesquisas, principalmente, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), instituições que estarão presentes na mesa redonda desta sexta.
Nos anos 1970, a região passou a ser pesquisada de forma mais intensa e sistematizada pela UFPE, e segue sendo tema de trabalhos científicos até hoje. Há uma impressionante diversidade de registros, como vestígios de fogueiras, oficinas de produção de material lítico, além de locais de sepultamento humanos que comprovam a ocupação pré-colonial por grupos caçadores-coletores.
Também há inúmeros sítios com grafismos rupestres de três tradições gráficas distintas: Agreste, Itacoatiara e Nordeste. Esta última, por exemplo, é famosa pelos registros que tornaram a Serra da Capivara, no Piauí, reconhecida mundialmente.
O Seridó possui ainda sítios de grupos indígenas, ruínas de aldeias e vestígios arqueológicos da ocupação sertaneja, como moradias, igrejas, capelas, currais de gado, açudes, entre outros vestígios do processo de formação da região.
Serviço
A mesa redonda “Patrimônio Arqueológico x Energia eólica: o caso da Área Arqueológica do Seridó” desta sexta-feira é gratuito e de livre acesso ao público. O evento será realizado no auditório do terceiro andar do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFPE.
Para garantir vaga é preciso se inscrever pelo link https://forms.gle/BEdHWZNJBUePsQXM6.
A programação completa pode ser conferida na página do Laboratório de Geoarqueologia e Geotecnologias, vinculado ao Departamento de Arqueologia da UFPE.
Fonte: Saiba Mais.
Foto: arquivo Instituto Seridó Vivo.