Ameaça dos fungos à saúde humana cresce em um mundo cada vez mais quente e úmido

As infecções causadas por fungos provocam 2 milhões de mortes anualmente em todo o mundo, além de prejudicar a inserção social e, possivelmente, a saúde mental dos afetados. Não existem vacinas antifúngicas licenciadas e há poucas classes de medicamentos disponíveis para uso clínico. São poucas as doenças fúngicas que dispõem de testes rápidos para diagnóstico preciso. Para mudar esse cenário, é necessário fortalecer a capacidade laboratorial, aumentar os investimentos em pesquisa e inovação e traçar estratégias para melhor intervir na saúde pública.

Surto de fungos mortais cresce desde a Covid-19, impulsionado por mudanças climáticas

Um aumento silencioso, porém, mortal, de fungos raros, está avançando ao redor do mundo, impulsionado pela pandemia de Covid-19 e por um planeta em aquecimento que parece estar “treinando” esses microrganismos para sobreviver a temperaturas cada vez mais altas. Os impactos da pandemia no sistema imunológico e nas estruturas de saúde, bem como a adaptação de fungos ao calor, têm permitido que esses patógenos ampliem seu alcance geográfico e desenvolvam resistência, representando uma nova ameaça global.

De acordo com a Bloomberg, entre as espécies mais preocupantes está o fungo Candida auris, que prospera em equipamentos médicos e se instala em pacientes imunocomprometidos, apresentando alta mortalidade. Segundo nova análise de dados, o C. auris já foi identificado em cerca de 20 regiões desde o início da pandemia, espalhando-se por todos os continentes, exceto a Antártida. Em hospitais dos Estados Unidos, foram registrados mais de 2.300 casos em 2022, um aumento de mais de sete vezes em relação a 2018, quando a doença se tornou de notificação obrigatória.

Esse aumento não se restringe aos EUA. Na China, casos saltaram de 28 em 2018 para 182 em 2023, e na Europa as infecções quase triplicaram entre 2018 e 2021. Especialistas acreditam que a pandemia exacerbou o problema ao sobrecarregar hospitais, criando ambientes favoráveis para o crescimento de fungos que prosperam em condições de alta umidade, como a mucormicose, ou “fungo negro”, que se espalhou nos hospitais indianos durante a crise da variante delta.

Resistência ao calor

O crescimento de fungos em temperaturas próximas aos 37ºC do corpo humano representa um desafio inédito para a saúde pública. A resistência ao calor, que se acreditava ser um obstáculo natural para a infecção humana, está sendo superada por fungos adaptados ao aumento gradual da temperatura global. Pesquisas indicam que certas espécies, anteriormente inofensivas, podem passar por mutações que lhes permitem sobreviver em temperaturas humanas, ampliando suas chances de infectar novos hospedeiros.

Os estudos sugerem que esses fungos, ao desenvolverem adaptações ao calor, estão se tornando mais resistentes a medicamentos antifúngicos, um fenômeno que preocupa pesquisadores. Em julho, cientistas de Singapura identificaram uma nova cepa de C. auris, além das cinco já conhecidas, ressaltando a rapidez com que esses organismos estão evoluindo. Amostras laboratoriais de outro fungo, Rhodosporidiobolus fluvialis, também mostraram resistência ao calor e resistência a medicamentos em estudos recentes, o que alerta para a possibilidade de surgirem novas infecções em humanos.

Especialistas em saúde pública, como Arturo Casadevall, da Universidade Johns Hopkins, apontam que a adaptação dos fungos ao aquecimento é um cenário preocupante, especialmente em um mundo onde as temperaturas aumentaram mais de 1ºC desde 1880. Sem vacinas ou tratamentos eficazes para grande parte das infecções fúngicas, o aumento desses casos configura uma situação crítica para pacientes imunocomprometidos..

Sem vacina disponível, fungos são ameaça crescente no mundo

Em expansão no mundo, as infecções por fungos têm em comum a resistência aos tratamentos e a inexistência de vacinas licenciadas para preveni-las ou tratá-las. Vacinas antifúngicas são uma das fronteiras mais distantes de uma área da ciência que tem obtido avanços notáveis, como o desenvolvimento em tempo recorde dos imunizantes contra a Covid-19. Contra os fungos os obstáculos são muitos, mas a necessidade é grande, advertem cientistas e a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Os cientistas não estão preocupados com a emergência em humanos de fungos Cordyceps, como os da série e do game “The last of us”. E sim com microrganismos que, na vida real, adoecem com gravidade 300 milhões de pessoas e matam outras 1,5 milhão por ano no mundo, segundo estimativas da OMS, que salienta serem esses números subestimados.

Vírus e bactérias são inimigos formidáveis, mas os fungos, até agora, têm se mostrado um alvo quase impossível de atingir. Eles causam doenças das quais a maioria das pessoas jamais ouviu falar, mas espécies patogênicas microscópicas são capazes de provocar infecções com até 90% de letalidade, caso da Candida auris resistente em grupos vulneráveis e para a qual não há tratamento.

Fontes: Ciência Hoje, Exame, O Globo, CNN.

Foto: Reprodução/CDC.

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