Artistas vão ao Congresso e levam Manifesto sobre Meio Ambiente ao STF

Um grupo de artistas esteve no Senado Federal, na tarde quarta feira (09/02), para alertar o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre uma série de projetos que, na interpretação do movimento, facilitam o desmatamento, fragilizam os direitos de propriedade indígenas e flexibilizam as regras para o uso de agrotóxicos. Em resposta, Pacheco afirmou que tais projetos focam em alterações em leis ambientais e serão discutidos em comissões antes de ir ao plenário.

Caetano Veloso leu uma mensagem em encontro com o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

“O dia de hoje marca uma mobilização inédita que une número expressivo de artistas e mais de duas centenas de organizações da sociedade civil e movimentos sociais em torno da causa ambiental. O simples fato de nos receber é um sinal da sua preocupação com a agenda, que é central para o presente e para o futuro do Brasil. Nós dois, particularmente, temos motivos de sobra para estarmos preocupados com o meio ambiente. Como mineiro, o senhor sabe bem a quantidade de sofrimento humano provocado por tragédias climáticas e ambientais. Não nos esquecemos de Mariana e Brumadinho, onde a população até hoje chora seus mortos e suas perdas”, afirmou o cantor e compositor.

O artista lembrou das tragédias provocadas pelas chuvas na Bahia e em Petrópolis (RJ). Caetano declarou ainda que o Senado “tem o poder e a responsabilidade de impedir mudanças legislativas irreversíveis que, cedendo a interesses localizados, empurram uma conta imensa à sociedade e comprometem o futuro do país”.

“Com todo o respeito, e na esperança de que o Poder Legislativo desperte, para seu possível papel de levar o Brasil a iluminar o mundo, deixo em suas mãos este documento [elaborado pelos artistas]”, disse.

Em resposta, Pacheco disse que o Brasil tem a obrigação de se preocupar com o meio ambiente.

Meu estado sofrendo com as chuvas, o Rio Grande do Sul sofrendo com a estiagem, coisas que nunca aconteceram. Houve um amadurecimento da preocupação em relação a esse tema no mundo. E o Brasil, como grande economia, esta nação tem a obrigação de ter a preocupação equivalente com o meio ambiente. Então esse discurso se tornou uma preocupação nacional”, argumentou o senador.

O presidente do Senado disse também que, sem dúvida, a audiência foi uma das “mais belas” manifestações da sociedade civil no Congresso. Pacheco afirmou que tratará de maneira séria, franca e transparente as reivindicações da classe artística. O senador afirmou que as propostas não terão tramitação “açodada” e não serão levadas diretamente a plenário.

A atriz Mariana Ximenes disse que o ato desta quarta busca defender o meio ambiente e combater a degradação da natureza. “É um ato pela vida, pelo planeta, pela natureza, pelo meio ambiente. E a gente precisa se ater a isso. A gente está aqui pelo meio ambiente. Então a gente precisa se unir para isso, porque a natureza não espera tamanha degradação”, afirmou Ximenes.

“O compromisso que faço com o líder da oposição e com vocês, da sociedade civil organizada, é de que nenhum desses projetos será diretamente pautado no plenário do Senado Federal sem a apreciação e tramitação devida no âmbito das comissões permanentes e temáticas da Casa”, disse Pacheco.

O grupo de artistas, que representa o chamado Movimento 342 Amazônia, mostrou preocupação com a aprovação, na Câmara, do regime de urgência para votação do Projeto de Lei (PL) 6.299/2002, que revoga a atual Lei dos Agrotóxicos e flexibiliza as regras de aprovação e comercialização desses produtos. Por isso, o grupo decidiu ir ao Senado para evitar que o mesmo também ocorresse lá, quando esse e outros projetos seguirem para apreciação dos senadores.

“Nós vamos ter toda a cautela de cada um desses cinco projetos, tratados no documento que recebi, de terem a destinação, o zelo, o cuidado, a tramitação digna e proporcional à importância do que eles representam. Não podemos ser compreendidos, nem o Brasil, nem o Congresso Nacional, como párias internacionais afastados da pauta do meio ambiente”, acrescentou o presidente do Senado.

Segundo Pacheco, que foi representante do Congresso na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP26), o Brasil tem uma péssima imagem em termos de preservação do meio ambiente e estará fadado ao insucesso econômico caso se distancie da pauta ambiental.

Os projetos contestados pelo movimento são o PL 2.159/2021 (que afrouxa as regras do Licenciamento Ambiental); o PL 2.633/2020 e 510/2021 (que altera regras de regularização fundiária); o PL 490/2007 (que institui o Marco Temporal para a demarcação de terras indígenas); o PL 191/2020 (que cria regras para autorizar exploração de recursos naturais em terra indígena), além do PL dos agrotóxicos.

Alguns artistas pediram a palavra, criticaram os projetos e pediram a rejeição no Congresso. “Se aprovadas, essas proposições poderão facilitar o desmatamento, permitir a mineração e o garimpo em terras indígenas e desproteger a floresta contra a grilagem e os criminosos. Como parte da sociedade civil, os artistas em grande número decidiram vir a esta Casa, conjuntamente com membros de entidades não governamentais e especialistas em questões climáticas, para expressar sua desaprovação a esses projetos”, afirmou o músico Caetano Veloso, porta-voz do movimento no encontro.

“É fundamental que haja, dentro do jogo político, um freio que impeça essa barbaridade que está na iminência de acontecer. A responsabilidade dos senhores e senhoras do Senado é imensa”. O agronegócio está praticando uma autofagia, a destruição. Vejam a estiagem no Rio Grande do Sul”, apontou o também músico Nando Reis. Além deles, estiveram no encontro com Pacheco, os músicos Caetano Veloso, Chico Buarque (virtualmente) Seu Jorge, Daniela Mercury, Maria Gadu, Ermicida, as atrizes Cristiane Torloni, Mariana Ximenes e Alessandra Negrini, a produtora artística Paula Lavigne, entre outros.

STF

A comitiva também visitou o Supremo Tribunal Federal (STF) e entregou o documento com 42 assinaturas para 4 dos 11 ministros da corte – todos relatores de ações visadas pelo movimento.

Os artistas pediram prioridade no julgamento de 11 processos que tratam de questões ambientais, entre eles a Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) 760 – que trata do desmatamento na Amazônia Legal; a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 79 – que trata do Fundo Amazônia; a ADPF 708 – que trata do Fundo do Clima; e a ADPF 857, que trata das queimadas na região do Pantanal.

O que dizem os projetos de lei criticados pelos artistas
  • PL 2.159: Licenciamento Ambiental

O PL torna o licenciamento ambiental uma exceção, em vez de ser a regra, e também permite o “licenciamento autodeclaratório”, que dispensa a verificação do relatório de descrição do empreendimento, além de expandir a lista de atividades que não precisam de licenciamento ambiental.

  • PL 2.633 e PL 510: grilagem

Os dois projetos de lei estão relacionados e concedem anistia à grilagem de terras públicas. Se aprovados, podem permitir, por exemplo, a regularização de áreas ilegalmente ocupadas. Além disso, propriedades de até 2,5 mil hectares poderão ser tituladas por meio de autodeclaração. O PL 2.633 foi aprovado na Câmara dos Deputados e pode ser pautado para votação no Senado, em uma versão, que é o PL 510.

  • PL 490: Marco Temporal das Terras indígenas

O PL altera a demarcação das Terras Indígenas e permite, entre outras coisas, a reintegração de posse pelo Governo Federal. Além disso, estabelece que a demarcação pode ser contestada em qualquer estágio do processo e estabelece o “Marco Temporal” para todas as demarcações de Terras Indígenas que não estivessem ocupadas até a Constituição de 1988.

  • PL 191: Garimpo em terras indígenas

O PL autoriza a mineração e a construção de hidrelétricas em terras indígenas. O projeto valida ainda todos os requerimentos de exploração de minérios que tenham sido solicitados ou protocolados antes da lei, e legaliza garimpos. Apresentado pelo Executivo, o projeto aguarda a criação de uma Comissão Especial na Câmara de Deputados.

  • PL 6.299: Lei dos Agrotóxicos

O projeto revoga a atual Lei de Agrotóxicos (7.802/89) e flexibiliza a aprovação e o uso de agrotóxicos no Brasil. Se aprovado, transfere o poder de decisão sobre o uso de novos agrotóxicos para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Dessa forma, órgãos como o Ibama e a Anvisa, deixam de ser responsáveis pelo processo de avaliação e aprovação. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados e está agora sob apreciação do Senado.

Fontes: G1, Agência Brasil, Gazeta Brasil.