Erosão costeira causa avanço do mar em todas as 20 cidades litorâneas do Ceará

O litoral do Ceará tem sido fortemente afetado pela erosão costeira nos últimos anos, o que causa o avanço do mar e prejudica os atrativos naturais e as infraestruturas que sustentam a economia local. Um estudo revela que dos 553 pontos analisados da linha de costa, 215 foram enquadrados como em erosão crítica em todas as 20 cidades litorâneas do estado.

Entre 1984 e 2020, o litoral da região perdeu cerca de 110 metros de faixa de areia, de acordo com um estudo da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Nos últimos anos, moradores e comerciantes da região conviveram com os efeitos diretos desse avanço do mar: muros desabaram, trechos da Avenida Litorânea cederam, rachaduras surgiram em imóveis e o medo de desabamentos se tornou constante entre quem vive em condomínios à beira-mar.

Entenda o que é a erosão costeira

As praias podem ter diferentes composições — arenosas, argilosas ou rochosas — e se formam nas áreas onde ocorrem as variações das marés. Segundo o professor Jeovah Meireles, do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), a dinâmica das ondas, especialmente durante a maré cheia, movimenta constantemente os sedimentos, como a areia, ao longo da costa.

Essa movimentação é guiada pelo ângulo em que as ondas quebram na faixa de areia, um processo influenciado pelos ventos alísios, correntes de ar constantes e regulares que sopram dos trópicos em direção à linha do Equador. A energia gerada por essas ondas garante o transporte contínuo das areias ao longo do litoral. No entanto, quando essa areia não é reposta — seja por sedimentos vindos de praias vizinhas, por rios ou por outros processos naturais —, o volume de areia diminui e dá início ao processo de erosão.

A erosão pode ser intensificada tanto por mudanças climáticas, como por atividades humanas. Jeovah aponta três principais causas que vêm potencializando esse processo:

– Ocupação urbana e retirada de areia: A zona de berma, faixa entre a praia e o continente, vem sendo ocupada de forma desordenada e usada como fonte de areia para construção, o que compromete a reposição natural de sedimentos e agrava a erosão;

– Interferência nos rios e barragens: Em nível regional, barragens nos rios têm reduzido o volume de sedimentos que alcança as praias, prejudicando o abastecimento natural de areia;

– Crise climática e elevação do nível do mar: Dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) mostram que a elevação do nível do mar está acelerando de forma preocupante.

Entre os principais fatores que contribuem para a intensificação da erosão nas praias do Ceará, o professor destaca o desmatamento das bacias hidrográficas, a impermeabilização do solo e a ocupação desordenada de áreas sensíveis, como dunas, falésias e manguezais.

Os efeitos da erosão são sentidos rapidamente. A faixa de praia se modifica com velocidade, restringindo o uso para lazer, turismo e moradia por parte das comunidades litorâneas.

Panorama da erosão costeira no Ceará

O Ceará possui mais de 570 km de costa com 20 municípios no litoral, incluindo: Acaraú, Amontada, Aquiraz, Aracati, Barroquinha, Beberibe, Camocim, Cascavel, Caucaia, Cruz, Fortaleza, Fortim, Icapuí, Itapipoca, Itarema, Jijoca de Jericoacoara, Paracuru, Paraipaba, São Gonçalo do Amarante e Trairi.

Para avaliar o impacto da erosão costeira no Ceará, o PCEC utilizou técnicas e ferramentas de sensoriamento remoto, com o objetivo de identificar alterações na linha de costa ao longo do tempo.

Locais mais afetados

A análise realizada  revela que a erosão crítica é um problema recorrente ao longo do litoral cearense. Entre os 20 municípios costeiros avaliados, todos apresentam ao menos um ponto com esse tipo de erosão.

Foram identificados dez núcleos de erosão distribuídos entre os municípios de Icapuí, Fortim, Aquiraz, Beberibe, Caucaia, São Gonçalo do Amarante, Itapipoca e Acaraú. Nessas áreas, dez praias seguem vulneráveis à ação do mar, sem que tenham sido implementadas estratégias eficazes de contenção nos últimos seis anos.

Ações de resposta

Para enfrentar os efeitos da erosão costeira, o Governo do Ceará instituiu o Comitê de Planejamento e Resposta à Erosão Costeira (CPREC), que atua como paraça-tarefa na formulação e execução de ações estratégicas diante do avanço do mar.

O comitê é responsável por planejar, implementar e acompanhar medidas de contenção da erosão ao longo do litoral cearense.

Entre suas atribuições estão:

– Sugerir medidas que contribuam para a execução do plano estadual de resposta;

– Atuar de forma complementar nas ações necessárias em áreas afetadas;

– Monitorar continuamente a ocorrência de processos erosivos;

– Promover debates, campanhas educativas e ações de conscientização ambiental;

– Recomendar políticas públicas, normas e diretrizes para uma gestão costeira eficaz;

– Revisar e atualizar periodicamente os planos e estratégias de combate à erosão.

O PCEC é um produto a nível do estado do Ceará. Porém, os problemas ocorrem na escala do município. Dessa forma, os municípios precisam se empoderar dessas informações para que eles possam de alguma forma estabelecer ações, dentro do próprio município, ou recorrer as ações indicadas pelo plano — Davis Pereira de Paula, coordenador do CPCEC.

Para o coordenador, é fundamental que os municípios elaborem um Plano Diretor — instrumento que define como deve ocorrer o crescimento urbano e o uso do território. Ele alerta que cidades com áreas de erosão crítica, como Icapuí, enfrentam um cenário ainda mais preocupante por não contarem com diretrizes claras para regulamentar a ocupação do solo.

“Um município costeiro com vocação turística tem que investir em um Plano Diretor. Só dessa forma você vai conseguir minimamente disciplinar a ocupação do solo. Se eu não disciplino a ocupação do solo, a repercussão é essa que a gente está mostrando no documento [PCEC]: o mar vai avançando, entra em conflito com os equipamentos urbanos e a partir daí você tem a repercussão, como a destruição de uma casa ou de um calçadão”, pontua.

Fonte: g1.

Foto: Fabiane de Paula/SVM.