O governo federal publicou nesta terça-feira (22) no Diário Oficial da União o Decreto nº 12.438, que regulamenta o artigo 49 da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) e abre exceções à proibição de importação de resíduos. Na prática, o decreto flexibiliza a entrada no Brasil de resíduos industriais como sucatas metálicas, cacos de vidro, papéis usados, restos de borracha e plásticos, entre outros. A medida representa um claro retrocesso em termos ambientais e sociais, ao fragilizar compromissos históricos assumidos pelo país com a sustentabilidade e a valorização da cadeia da reciclagem nacional.
A decisão foi assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, e pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Ainda que traga salvaguardas e mencione o fortalecimento de cooperativas de catadores, o decreto abre uma brecha ampla para que empresas passem a importar resíduos sob o argumento de “viabilidade econômica” e “pureza do material”, como previsto no artigo 4º do texto. A lista de materiais autorizados, presente no anexo do decreto, inclui itens de alto valor para a indústria de transformação, cuja concorrência internacional pode inviabilizar a atuação de milhares de catadores brasileiros.
Ameaça à política de economia circular
A Política Nacional de Resíduos Sólidos, criada em 2010 após amplo debate com a sociedade civil, foi um marco no enfrentamento dos impactos ambientais da produção e consumo. Um dos seus pilares é a logística reversa, que visa garantir que embalagens, produtos descartados e materiais recicláveis retornem à cadeia produtiva por meio da coleta seletiva e da atuação das cooperativas. A nova medida, porém, esvazia esse princípio ao permitir que empresas substituam materiais recicláveis nacionais por resíduos importados.
Apesar de o decreto prever a observância da Convenção de Basileia — que regula o trânsito internacional de resíduos perigosos —, a autorização para entrada de materiais recicláveis pode transformar o Brasil em um novo destino de lixo industrial dos países desenvolvidos. Esse risco não é teórico: há precedentes graves no Sudeste Asiático, onde países como Indonésia e Malásia já enfrentaram crises ao se tornarem depósitos de lixo “reciclável” de outras nações.
O argumento da “pureza do resíduo” presente no decreto também é problemático. Em nome da eficiência industrial, pode-se justificar a importação de resíduos altamente processados, enquanto materiais recicláveis de origem nacional — por vezes mais complexos de triagem, mas socialmente valiosos — acabam descartados ou subvalorizados.
A publicação do Decreto nº 12.438 representa uma inflexão negativa na trajetória da política ambiental brasileira, poucos meses depois da sanção de uma lei que proibia a importação de lixo. Embora traga salvaguardas formais e menções à valorização dos catadores, seu conteúdo abre brechas para a desvalorização da reciclagem nacional, favorecendo interesses econômicos da indústria em detrimento da sustentabilidade e da justiça social. Há risco de que o tema seja revisto pelo Congresso Nacional e judicializado por cooperativas de catadores.
Roberto Rocha, presidente da Associação Nacional de Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (ANCAT) e referência na luta pelos direitos dos catadores, embarca nesta quarta-feira (23) para uma série de reuniões com membros do governo federal. Ele lidera o setor contra o Decreto nº 12.438/2025, publicado no Diário Oficial da União em 22 de abril, que abre brechas para a entrada de sucatas metálicas, cacos de vidro, papéis usados, borrachas e plásticos no país — medida que, na visão dos catadores, mina a sustentabilidade e os avanços da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Na prática, o decreto regulamenta o artigo 49 da Lei nº 12.305/2010 e reverte parte dos ganhos obtidos com a Lei nº 15.088, sancionada em 6 de janeiro de 2025, que proibiu a importação de resíduos e rejeitos e fortaleceu a reciclagem interna. A flexibilização representa, segundo ambientalistas, um retrocesso que coloca em risco a qualidade da matéria-prima nacional e a renda de milhares de trabalhadores informais.
Fonte: Brasil 247.
Foto: Joel Rodrigues/Agência Brasília.
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