Jornalista inglês e indigenista desaparecem na Amazônia

O indigenista da Funai (Fundação Nacional do Índio), Bruno Araújo Pereira, e o jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do Guardian baseado no Brasil, estão desaparecidos desde domingo (5). Eles viajavam juntos pelo Vale do Javari, no Amazonas, e foram vistos pela última vez na comunidade de São Rafael. O caso levantou temor sobre a segurança da dupla. Segundo informações da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), da qual Bruno faz parte, o indigenista é alvo de ameaças constantes de madeireiros, garimpeiros e pescadores da região. A Polícia Federal foi acionada para investigar o desaparecimento.

Bruno e Dom retornavam do Lago do Jaburu, onde visitaram uma base da Funai. “Depois partiram rumo a Atalaia do Norte, viagem que dura aproximadamente duas horas. Assim, deveriam ter chegado por volta de 8h, 9h da manhã na cidade, o que não ocorreu”, diz um comunicado da Unijava (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) e da Opi (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato).

A Univaja afirma que enviou equipes de busca às 14h e às 16h do mesmo dia, mas elas não tiveram sucesso. A notícia do desaparecimento provocou comoção entre jornalistas brasileiros, que cobraram as autoridades para a realização de buscas na região.

Colaborador do jornal The Guardian e de outras publicações internacionais, Dom Phillips, que mora no Brasil há 15 anos, viajou para a região para fazer entrevistas para um livro que está escrevendo. Segundo texto do The Guardian, Phillips participou de uma das expedições de Pereira à mesma região em 2018.

O editor do Guardian, Jonathan Watts, afirmou que seu desaparecimento ocorre após “ameaças de morte ao seu colega indigenista”, Bruno.

Nas redes sociais, internautas cobram ação das autoridades. Em especial, jornalistas estão indo às redes manifestar preocupação com o colega e ressaltam que o Vale do Javari tem histórico de invasões pelo garimpo ilegal, bem como enfatizam que Bruno recebeu ameaças por parte destes grupos criminosos.

Colegas de profissão também apontam que Dom faz um jornalismo crítico à exploração ilegal da Amazônia e que também foi alvo de ameaças por parte de madeireiros e garimpeiros ilegais.

A Univaja aponta que a equipe da entidade vinha recebendo “ameaças em campo” e que Pereira, que também é servidor licenciado da Funai, era especificamente alvo de intimidações por sua atuação contra invasores de terras indígenas.

“A ameaça não foi a primeira, outras já vinham sendo feitas a demais membros da equipe técnica da Univaja, além de outros relatos já oficializados para a Polícia Federal, ao Ministério Público Federal em Tabatinga, ao Conselho Nacional de Direitos Humanos e ao Indigenous Peoples Rights International”, disse a entidade em nota.

O líder indígena Marubo disse ainda ao jornal que a região de Javari, que abriga mais de 20 grupos indígenas, passa por uma situação tensa e perigosa, que se agravou nos últimos anos – principalmente após o assassinato em 2019 de um colaborador da Funai chamado Maxciel Pereira dos Santos.

Segundo o jornal O Globo, o governo federal está montando uma paraça-tarefa com agentes da Polícia Federal, oficiais da Marinha, do Exército, bombeiros, servidores da Funai, da Defesa Civil e da Força Nacional de Segurança em Tabatinga, no Amazonas. O governo federal no entanto ainda não confirmou oficialmente a informação.

O governador do Estado do Amazonas, Wilson Lima, disse que determinou o envio de reforço policial especializado para a região de Atalaia do Norte para ajudar nas buscas.

Atalaia do Norte, com 15 mil habitantes e terceiro menor IDH do Brasil, é o município mais próximo da confluência entre rios Ituí e Itaquaí, na entrada do Vale do Javari. A junção dos dois rios foi a primeira a receber uma base de proteção por sua localização estratégica, ainda em 1996, no processo de estabelecimento de contato com o povo Korubo.

Os conflitos na região são antigos. Em 2000, um grupo de cerca de 300 pescadores autodenominados de Movimento dos Sem Rio, de Atalaia do Norte e Benjamin Constant, atacou a base do Ituí-Itaquaí e a sede da Funai em Atalaia do Norte com coquetéis molotov.

Investigações às quais a BBC teve acesso na época apontavam que os ataques partiam de pescadores e caçadores ilegais de Atalaia do Norte (AM) financiados sobretudo por grupos de contrabandistas de animais de Tabatinga (AM) e Benjamin Constant (AM), as duas maiores cidades da região, a 1.100 quilômetros de Manaus. Os animais são vendidos para compradores brasileiros, peruanos e colombianos.

“Sob o governo atual a pressão aumentou ainda mais porque os invasores se sentiram empoderados e se tornaram mais agressivos”, disse Marubo ao jornal, acrescentando que “gangues organizadas” de garimpeiros e caçadores ilegais estão “saqueando” as florestas e rios da região impunemente.

Fontes: DW, BBC, G1, Folha SP, Ambiente Brasil.