Oito cidades do RN não cumprem obrigatoriedade de ter Plano Diretor

Oito cidades do Rio Grande do Norte não possuem plano diretor regulamentado e aprovado, mesmo com a obrigatoriedade prevista em lei federal (Estatuto das Cidades). A Constituição determina que o planejamento de desenvolvimento urbano é obrigatório para municípios que possuem acima de 20 mil habitantes e/ou que integrem regiões metropolitanas, quesitos que abrangem 33 municípios potiguares.

Porém, não é o que acontece nas cidades de Bom Jesus, Caraúbas, Goianinha, Ielmo Marinho, João Câmara, Parelhas, Pau dos Ferros e Vera Cruz (ver detalhes no box). As informações foram levantadas pela TRIBUNA DO NORTE com base nos dados da Pesquisa de Informações Básicas Municipais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Munic/IBGE). Das oito cidades, apenas Ielmo Marinho e Pau dos Ferros trabalham na elaboração de um plano diretor. Embora a regulamentação do documento – que trata da expansão urbana – seja obrigatória para cidades da Grande Natal ou com população superior a 20 mil pessoas, atualmente não há sanções para as localidades que não estão de acordo com a lei (nº 10.257/01), conforme explica o especialista George Câmara.

Segundo Câmara, que é mestre em estudos urbanos regionais e ex-presidente do Conselho Nacional das Cidades, a extinção do Ministério das Cidades em 2019 fragilizou o cumprimento da legislação. “Se o Ministério estivesse funcionando, respondendo à política de habitação, de saneamento, ele ia esbarrar na destinação de verbas para esses municípios que estariam inadimplentes. Não é porque o presidente da República quer fazer e vai lá e faz. Não é assim. É preciso ter critérios. Não é discricionário”, comenta.

Neste cenário, a elaboração do plano diretor depende de uma mobilização espontânea dos governantes municipais. “Depende muito da vontade dos prefeitos. Aí o prefeito pode pensar: ‘eu não vou gastar dinheiro com esse plano se essa exigência não está sendo cobrada’. É preciso pensar que a boa gestão sem planejamento não existe. Com um plano diretor é possível definir o zoneamento da cidade. Do que adianta, por exemplo, universalizar o acesso à educação se você mora num local e a escola mais perto fica do outro lado da cidade?”, questiona.

O Plano Diretor é um instrumento para estabelecer regras e diretrizes das políticas urbanas das cidades, como altura máxima de prédios, destinação do lixo e perfil de determinadas áreas. A legislação foi prevista na Constituição Federal de 1988 e regulamentada em 2001, com o Estatuto das Cidades. Todas as cidades potiguares que possuem planos diretores o elaboraram – ou o revisaram – após a lei federal de 2001. A legislação foi pensada para ser construída com a participação das gestões municipais e da sociedade civil, mobilizando o poder público, movimentos sociais, associações de moradores, empresários e pesquisadores para delimitar quais são as prioridades para o futuro de uma cidade. A lei diz ainda que os planos devem ser revisados a cada dez anos.

A arquiteta e urbanista Sophia Motta diz que a estruturação do plano é essencial para entender as dinâmicas urbanas e rurais de um determinado território. “Desta forma as cidades crescem sem nenhum regramento urbano, isso impossibilita o planejamento futuro de um município. A importância do plano diretor é quase inquestionável para essas cidades pequenas porque elas crescem de forma desordenada e os serviços públicos não chegam para quem mais precisa”, explica.

Ao todo, de acordo com os dados do IBGE, das 33 cidades com obrigatoriedade de aprovar um plano diretor, 25 possuem a regulamentação. Dos 25 municípios, 16 estão com os planos defasados. A última a atualizar o documento foi a capital, com a sanção assinada em março deste ano após um longo processo de discussão. Até então, a última revisão do Plano Diretor de Natal havia acontecido em 2007.

A cidade de Macaíba, na Região Metropolitana de Natal, também revisou o plano local recentemente. O último texto era de 2008 e foi finalmente atualizado em outubro de 2021. Em vigência há um ano, o novo plano já causou mudanças significativas no ordenamento da cidade, diz Billy Vitorino, titular da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (Semurb).

“Foi um passo muito importante para o desenvolvimento do município. Tivemos várias novidades. Até o final do ano passado, Macaíba não podia ter prédios com mais de quatro andares e agora a gente consegue fazer prédios com até cinco pavimentos. Vai ter o primeiro prédio de apartamentos na cidade, então isso

O Estado tem ainda casos de “exemplo de boa gestão”, analisa a arquiteta Sophia Motta, em referência às cidades que não são obrigadas a ter plano diretor, mas que já o implementaram. Também de acordo com a Pesquisa Munic do IBGE, o RN tem 15 cidades nesta situação. “Isso demonstra um bom exemplo. São cidades que têm menos de 20 mil habitantes, que não estão na Região Metropolitana, mas que têm Plano Diretor. Isso é muito importante para que a cidade cresça saudável e serve de exemplo para outras localidades”, explica Sophia.

Plano Urbano da Região Metropolina fica para 2023

Sete anos após a aprovação da lei nº 13.089/15, que criou o Estatuto das Metrópoles e determinou que os governos estaduais elaborem o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) para as regiões metropolitanas, o Rio Grande do Norte ainda não possui nenhum tipo de regulamentação urbana sobre a Grande Natal. De acordo com o Governo do Estado, a pandemia inviabilizou o diagnóstico e as discussões do tema, o que deverão acontecer no ano que vem. A ideia do governo é iniciar o processo de formulação do PDUI em 2023 e concluir em meados de 2024.

Christan Vasconcelos, coordenador da Região Metropolitana de Natal, órgão vinculado à Secretaria de Estado de Planejamento e Finanças (Seplan), afirma que o processo de criação do PDUI deve durar cerca de um ano e meio e contar com a colaboração dos municípios. A ideia inicial é que o plano de integração contemple a chamada “região metropolitana funcional”, composta pelos territórios que estão mais próximos da capital e que tenham um fluxo constante de pessoas.

“É um discussão muito ampla que envolve todos os gestores, dos governos estaduais e municipais, da esfera federal e também da sociedade civil. Entre 2020 e 2022 tivemos um período de dificuldade financeira e também por causa da pandemia. Tivemos que superar algumas situações para poder acreditar que agora em 2023 vamos iniciar esse processo”, destaca.

O mestre em assuntos urbanos, George Câmara, aponta que a elaboração de um PDUI é essencial para estruturar políticas de transporte público, habitação, urbanismo e saneamento básico. O PDUI, que é uma espécie de Plano Diretor das regiões metropolitanas, deve servir de base para discutir questões que são de interesse de municípios conurbados, como a dinâmica de pessoas que dormem em uma cidade, mas trabalham em outra, além da ordenamento de um sistema integrado de ônibus e trens.

“É de extrema importância para organizar o uso do espaço territorial urbano. Se uma pessoa mora na cidade X e na cidade Y ela sabe que o serviço de saúde é melhor, ela vai procurar lá. Isso é um exemplo, penaliza o bom serviço, o serviço que funciona fica sobrecarregado. Então é preciso ter essa regulamentação, mas a gente depende muito da vontade dos governantes porque o não cumprimento não é responsabilizado”, destaca Câmara.

Fonte: TN RN.

Foto: Divulgação.