O relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil, de 2019, promovido pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), mostra um aumento de invasões em Terras Indígenas de 135% durante o primeiro ano do governo Bolsonaro. Isso representa mais que o dobro das invasões que aconteceram em 2018.
O número passou de 109 casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio”, em 2018, para 256 casos – em pelo menos 151 terras indígenas, em 2019.
Do número total de invasões, as principais motivações foram a exploração ilegal de madeira/desmatamento, atividades de garimpo e exploração mineral, atividades agropecuárias (soja, milho e gado), incêndios, pesca predatória e grilagem/loteamento ilegal.
A demarcação de Terras Indígenas é apoiada por mais da metade (82%) da população brasileira. É o que indica a pesquisa “Violência e Democracia: panorama brasileiro pré-eleições de 2022”, realizada pela Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS) e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
Segundo o Mapbiomas as propriedades privadas acumularam os maiores registros de desmatamento em 2021, com 69,5% do total, sendo 14,1% em assentamentos rurais. Outros 10,6% ocorreram em terras públicas – sendo 9,3% áreas não destinadas pela União. Dentro de áreas protegidas registrou-se 5,3% do total desmatado, sendo 3,6% dentro de unidades de conservação e somente 1,7% em Terras Indígenas.
Os números apresentam uma conscientização bem maior da que foi expressada nas urnas nas últimas eleições presidenciais, até porque há o reconhecimento da importância da preservação da cultura das populações nativas, e que as Reservas Indígenas são as áreas que mais protegem florestas no Brasil .
Em abril de 2017, o então candidato ao primeiro mandato como presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), deixou clara a sua visão de política ambiental em um discurso amplamente divulgado sobre as demarcações de terras ocupadas por povos tradicionais e originários.
No clube Hebraica, no Rio de Janeiro, Bolsonaro apontou para um mapa e afirmou, para uma sala lotada, qual era o uso que pensava destinar para as áreas indígenas. “Essas são as reservas indígenas do Brasil. Onde tem uma reserva indígena, tem uma riqueza debaixo dela. Temos que mudar isso daí”, proferiu ao reclamar do que chamou de falta de autonomia e de entrega do território brasileiro.
O presidente também chegou a proferir frases de cunho racista. “Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gasto com eles”, discursou.
Cinco anos depois, o estudo de 2022 aponta que os eleitores não concordam mais com esta visão do presidente eleito à época. Segundo a pesquisa, 83,4% reconhecem que existe racismo no Brasil. Em 2017, na versão anterior do levantamento, apenas 70% consideravam que a cor da pele, e não apenas a classe social, era um fator de desigualdade e violência.
Novas percepções e medo
Ainda de acordo com os resultados da pesquisa liderada pela RAPS e FBSP, a mudança na percepção da existência do racismo indica o aumento da clareza por parte da população sobre um marcador que é pungente na violência e desigualdade brasileira.
Já a defesa dos territórios indígenas resulta do crescimento do desmatamento e da violência na região amazônica nos últimos anos. Outro fator de sensibilização, ainda de acordo com o levantamento, é aumento dos índices de desastres ambientais relacionados às mudanças climáticas, o que aproxima a pauta ambiental do cotidiano das pessoas em diferentes regiões do país.
De modo geral, o índice de medo da violência em 2022 mostrou-se maior do que no levantamento realizado em 2017, mesmo que segundo as estatísticas oficiais o número de mortes violentas intencionadas tenha decrescido no período.
Quando observada a relação entre medo e autoritarismo, os dados indicam que aqueles que estão propensos a apoiar posições autoritárias são também os que afirmam sentir muito medo. Dentre os entrevistados, 67,5% afirmam ter medo de serem agredidos fisicamente em razão de sua escolha política ou partidária.
A pesquisa considera que as eleições que se aproximam ocorrerão em “clima de insegurança, ataque e sob alegação de fraude, com ânimos exaltados e em um cenário de polarização que tem crescido desde 2013”.
Outro dado alarmante é que desde 2019 o Brasil é considerado um dos dez países com maior tendência autocrática no mundo. E, desde 2021, faz parte de um grupo de cinco regiões globais no processo conhecido como “autocratização”, acompanhado por Hungria, Polônia, Sérvia e Turquia.
Agenda de direitos
No trecho voltado à agenda de direitos, é possível verificar a baixa adesão dos entrevistados às pautas conservadoras diretamente defendidas pelo bolsonarismo. Por exemplo, 67,6% dos entrevistados acham que a adoção de cotas tem impacto na redução da desigualdade entre pessoas negras e brancas e 66,4% discordam da suposta segurança trazida pelo armamento da população civil.
Entre as questões que as pessoas tendem a apoiar de forma mais contundente – com alto percentual de “concorda totalmente”- são a assistência pública às pessoas que estão passando fome (35,1%); aos programas de transferência de renda para os mais pobres (31,3%); a demarcação de terras indígenas (26,8%), a paridade de gênero no Poder Legislativo (25%) e a capacidade de criação de filhos por casais homossexuais (24,4%), Já 35,8% discordaram totalmente da afirmação “Não há racismo no Brasil”.
Mas, não se pode esquecer que o atual presidente foi eleito negando todas essas agendas e cumprindo de forma objetiva as suas promessas de campanha. Durante a gestão de Bolsonaro não houve demarcação de Terras Indígenas. Ao contrário: a violência contra essas populações e seus territórios triplicou, como indica o relatório “Violência contra os povos indígenas do Brasil”, do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). No mesmo período, a titulação de terras para comunidades quilombolas foi a menor da série histórica desde que esse tipo de reconhecimento foi iniciado, em 1996.
Aplicada pelo Datafolha a pesquisa escutou 2.100 pessoas com 16 anos ou mais, em cerca de 130 municípios de pequeno, médio e grande porte, entre os dias 3 e 13 de agosto de 2022. A margem de erro da pesquisa é de 2,0 pontos para mais ou para menos, em um intervalo de confiança de 95%.
Fonte: ((O))Eco.
Foto: Leonardo Prado.