Pesquisadora da UFRN participa de descoberta de novo dinossauro brasileiro

Observo várias espécies extintas moverem-se em direção do presente e diversas das espécies do presente moverem-se em direção ao passado”. A frase, escrita pelo paleontólogo Peter Wilhelm Lund em 1843, reflete sobre as possíveis descobertas científicas e marcos históricos que poderiam vir a existir no futuro. Hoje, 179 anos depois, prova-se longe de estar equivocada. Um exemplo disso é a descoberta recente de uma espécie inteiramente nova de dinossauro brasileiro, nomeado de Ibirania parva, ou Pequeno peregrino das árvores. A descoberta vem de um trabalho desenvolvido há quase vinte anos por vários pesquisadores, dentre eles a professora Aline Marcele Ghilardi, do Departamento de Geologia da UFRN.

A descrição da nova espécie foi publicada no dia 15 de setembro no artigo A New Nanoid Titanosaur (Dinosauria: Sauropoda) From the Upper Cretaceous of Brazil pela revista científica Ameghiniana. Trata-se do primeiro saurópode (pescoçudo) anão das Américas.

O nome Ibrania é a junção das palavras Ibirá – cidade onde a espécie foi encontrada – e ania que em grego significa “caminhante, peregrino”. Já parva é o latim para ‘pequeno’. Como a palavra Ibirá vem do Tupi – significando “Árvore” – podemos traduzir o nome desse dino como “o pequeno peregrino das árvores”. Ele também recebeu o apelido de Bilbo – uma referência ao protagonista de O Hobbit e sua altura diminuta. Eles medem de 5 a 6 metros de comprimento e têm altura similar à de uma vaca.

Aline Ghilardi fez graduação, mestrado e pós-doutorado na Universidade Federal de São Carlos, interior de São Paulo, tendo passado pelo doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro, e conta que foi a primeira a trabalhar com os fósseis do pequeno dinossauro pescoçudo na cidade de Ibirá, São Paulo.

“Eu que limpei, identifiquei eles pela primeira vez. À época, a gente não tinha muita coisa de dinossauros pescoçudos descritos pra região onde esse material foi encontrado. Então não foi possível identificar se seria uma nova espécie e a que grupo pertenceria. De fato, era um material diferente de outros dinossauros pescoçudos, mas foi o máximo que eu consegui chegar na época”, lembra a pesquisadora, destacando que estava ainda na graduação de Ciências Biológicas, e usou o estudo em seu trabalho de conclusão de curso, com a supervisão do professor Marcelo Adorna Fernandes.

Novos ossos foram encontrados entre 2009 e 2016 de pelo menos três indivíduos diferentes no mesmo local.

Ibirania parva habitou a Terra há 80 milhões de anos, no território onde hoje está a cidade de Ibirá, no interior de São Paulo. A pesquisa analisou material encontrado na região e descobriu serem pertencentes a três dinossauros diferentes. Ao longo dos anos, a conclusão foi de que tratavam-se de três indivíduos de uma espécie diferente das mais de 40 espécies brasileiras conhecidas até então, sendo excepcionalmente curiosa por divergir até mesmo dentro do próprio grupo por um fator marcante: o tamanho.

Pertencentes ao grande grupo de dinossauros saurópodes, considerados os maiores animais a caminharem em terra firme e também chamados de dinossauros pescoçudos, a nova espécie possuía um tamanho excepcionalmente reduzido, de entre 5 e 6 metros de comprimento e altura similar à de uma vaca.

Para Aline, essas medidas foram uma grande surpresa para todos os envolvidos, primeira dentro da comparação de Ibirania com seus companheiros de grupo. “A maioria dos outros dinossauros saurópodes que conhecemos chegava a tamanhos desproporcionalmente grandes. Um exemplo é o Austroposeidon, que também viveu na região do interior de São Paulo por volta do mesmo período que o Ibirania, tendo cerca de 25 metros de comprimento”, conta Aline.

Outro fator surpresa para os pesquisadores foi o geográfico. A espécie nova foi encontrada no interior do Brasil, mas os saurópodes de tamanho reduzido são comumente associados a ambientes de ilhas antigas, como é o caso do Europasaurus, encontrado na Europa. Isso se dá por as ilhas serem ambientes com áreas e recursos alimentares restritos, o que desfavorece a existência de animais herbívoros de grandes dimensões.

O trabalho que descobriu Ibirania parva descreve, portanto, a primeira espécie comprovadamente anã das Américas. “Encontrar essa espécie com tamanho tão reduzido, muito abaixo do que se tinha conhecimento, nos fez pensar em várias possibilidades. A conclusão a que chegamos foi de que o ambiente semiárido da região, com uma sazonalidade marcada por períodos secos muito intensos, foi o que contribuiu para essa anormalidade. Além disso, conseguimos perceber também que Ibirania conseguia habitar e permanecer nos ambientes mesmo durante os períodos de secas mais intensas”, explica Aline.

Os coautores que completam o trabalho são Tito Aureliano, Verónica Díez Díaz, Kamila L. N. Bandeira, André G. S. Cattaruzzi, Fabiano V. Iori, Ariel M. Martine, Alberto B. Carvalho, Luiz E. Anelli e Hussam Zaher.

“O interessante é que, com esse trabalho, a gente sai daquela forma tradicional de descrever espécies que simplesmente é olhar a forma dos ossos, identificar o que tem de diferente e dar um novo nome. Não. A gente explora mais. A gente quis saber como era a ecologia do animal, a fisiologia, como ele crescia, se ele de fato era anão. Então a gente investigou vários aspectos da vida desse animal”, ressalta Aline Ghilardi, ao nomear o que fizeram de Nova Paleontologia, “uma Paleontologia do século 21”.

“A gente não dá só nome pra essas figurinhas que viveram no passado. A gente quer saber como elas eram, como elas viviam, aonde elas viviam e, por isso, muitas cabeças envolvidas nesse estudo. Foi uma parceria muito instigante. Feliz que tenha resultado em um trabalho tão legal”, conclui a pesquisadora.

Fonte: Agência Saiba Mais,  Blog FM, Agecom UFRN.

Arte: Sérgio Lages.