Verba de R$ 1 bi que deveria servir para Conservação da Natureza no Paraná é destinada para outros fins, afirma Ministério Público

O recurso de mais de 1 bilhão e 396 milhões de reais da Petrobras para conservação ambiental no Paraná pode ser suspenso na próxima semana. A decisão será do juiz Flavio Antonio da Cruz, da 11ª Vara Federal de Curitiba, que recebeu do Ministério Público do estado o pedido de liminar para cumprimento de sentença. O MPPR pediu a suspensão imediata dos repasses de valores da indenização da estatal para projetos já aprovados pelo Conselho de Recuperação dos Bens Ambientais Lesados (CRBAL), nomeado pelo governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD).

Os valores, que correspondem a 66,66% deste total, estavam sendo pagos em parcelas ao Fundo Estadual de Meio Ambiente (FEMA) em razão de um desastre ambiental ocorrido em 2000. O recurso seria repassado a projetos aprovados em reuniões do CRBAL. Segundo o MP, o Estado do Paraná e o Instituto Água e Terra (IAT), responsáveis pelas propostas, pretendem usar os recursos de forma “inadequada”, “injustificadamente apressada” e “ilegal”.

A primeira parcela, no valor de mais de 232,8 milhões de reais, já havia sido depositada pela Petrobras. Outras três parcelas de igual valor seriam pagas a cada 90 dias, sendo a próxima no fim deste mês. O objetivo do acordo é financiar planos ou projetos para conservação e recuperação do patrimônio natural.

Conselho exclui organizações de proteção ambiental da mesa

Segundo o pedido do Ministério Público, os repasses não devem voltar a ocorrer sem que a formação do conselho seja revista. O CRBAL deve ser composto, conforme lei estadual 20.742/2021, pelo Secretário de Estado do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo (SEDEST), como Presidente; Secretário de Estado da Agricultura e do Abastecimento; Diretor-Presidente do Instituto Água e Terra (IAT); Procurador-Geral do Estado; Procurador-Geral de Justiça do Estado; além de dois representantes de entidades privadas sem fins lucrativos.

Os dois representantes foram nomeados pelo governador Ratinho Jr. e seu secretário do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo (Sedest), Márcio Nunes. São eles Marcos Domakoski, do Movimento Pró-Paraná (MPP), e Nelson Luiz Gomes, que representa o Instituto de Engenharia do Paraná (IEP).

Para os promotores de Justiça que assinam o pedido, Alexandre Gaio e Sérgio Luiz Cordoni, há “a ausência indevida de representantes da sociedade civil ligados especificamente à proteção ambiental em sua composição”.

Diante disso, o MP convidou organizações da sociedade civil para debater a destinação do recurso. Entre as organizações estão a Associação MarBrasil, Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (APREMAVI), Fundação Grupo Boticário, Instituto Semeia, Observatório de Justiça e Conservação (OJC), Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), Rede Pró Unidades de Conservação (Rede Pró-UC) e a Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS). Todas as organizações estão dispostas a participar das discussões para garantir a finalidade ambiental do recurso.

Para a Transparência Internacional Brasil, a principal recomendação para promover transparência e bom uso de recursos é a existência de conselhos plurais e democráticos. “A participação de organizações ambientalistas nesse processo é fundamental por poderem contribuir com sua experiência e pela atuação direta no tema”, afirma Renato Morgado, gerente de Meio Ambiente e Clima da organização.

Projetos ignoram conservação ambiental

O Governo do Paraná, através do conselho, aprovou projetos para compra de caminhões de lixo (projeto Paraná Sem Lixões), trituradores de galhos e construção de estradas rurais para mobilidade e escoamento agrícola.

Empresários envolvidos com a questão ambiental lamentam a postura do governo do Paraná. “O governo tem a oportunidade única de mudar o rumo da  proteção da natureza no Estado e deve fazer isso aplicando os recursos corretamente, como no fortalecimento das unidades de conservação de proteção integral e criação de novas áreas”, diz Roberto Klabin, empresário e acionista da Klabin S/A. “Essas são ferramentas importantes para o próprio desenvolvimento econômico do Estado e manutenção de recursos hídricos, hoje lamentavelmente escassos”, afirma.

Na mesa do conselho, foram aprovados 23 projetos do total, no valor de mais de 128 milhões de reais. Ou seja, mais da metade da primeira parcela seria usada em projetos do governo Ratinho Jr. que não tem finalidade ambiental.

Pelo acordo que define regras de aplicação do recurso, há divisão de percentuais para cada ação ambiental prevista, como uso para unidades de conservação. O MP ainda alerta para o fato de um mesmo projeto do governo ter sido proposto para várias divisões de recurso, o que comprova a falta de justificativa das propostas.

A pressa é inimiga da conservação

A agilidade para passar projetos é clara pela frequência de reuniões, algumas extraordinárias, do Conselho de Recuperação dos Bens Ambientais Lesados (CRBAL).

Criado em 2000, o CRBAL nunca funcionou regularmente até a instalação há dois meses de um conselho-gestor. Neste curto período, foram feitas 5 reuniões do conselho para aprovação dos projetos já que, conforme afirmou em uma delas o Secretário de Estado da Agricultura e Abastecimento, Norberto Ortigara, “o momento exigia celeridade”.

Dados do MapBiomas apontam que o Paraná está entre os estados que mais desmatam ilegalmente o bioma Mata Atlântica, junto com Minas Gerais e Bahia. Nos últimos 36 anos de levantamento, o estado perdeu 3.744 km2 de vegetação nativa.

“São necessárias políticas de conservação pra evitar o desmatamento ilegal, que ainda ocorre principalmente no centro-sul do Paraná, na região de florestas com araucária”, afirma Marcos Rosa, Coordenador Técnico do Mapbiomas.

Para o ex-Secretário Nacional de Biodiversidade e Florestas e ex-Secretário Executivo da Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica (CDB), Braulio Dias, medidas de conservação no Paraná são urgentes e necessárias. “Investindo em restauração da biodiversidade, o estado contribuiria para metas globais com a implementação da Década da ONU de restauração de ecossistemas (2021-2030) e para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”.

Fonte : Deproposito