Enquanto imagens da situação no Rio Grande do Sul mostram um cenário de calamidade, com cidades e regiões inteiras debaixo d’água, é natural que se pergunte como circunstâncias do tipo podem ser evitadas. As inundações são o desastre natural mais comum em todo o mundo, por isso, é curioso como ainda estamos tão vulneráveis a elas mesmo após avanços em ciência e tecnologia.
Com as mudanças climáticas cada vez mais reais, pesquisadores se debruçam sobre como a tecnologia e o conhecimento científico podem ajudar a antever os efeitos desse novo comportamento do planeta, o que significa basicamente se preparar para essas situações e agir para que o impacto na população seja o menor possível.
Hoje, a tecnologia mais aliada nessa missão é a inteligência artificial. Diferentes pesquisadores têm estudado uma forma de aplicar a tecnologia de aprendizado de máquina na previsão de inundações e enchentes, a fim de ajudar a soar o alarme antes que as águas subam.
Em março, o Google anunciou que tem usado IA para prever, com sucesso, inundações em rios – com até sete dias de antecedência em alguns casos. O projeto foi descrito em artigo publicado na revista científica Nature.
As inundações, apesar de comuns, podem ser difíceis de prever, já que a maioria dos rios não possui medidores de vazão. O Google, então, treinou modelos de aprendizado de máquina com todos os tipos de dados relevantes, incluindo eventos históricos, leituras de nível de rio e leituras de elevação e terreno. Com isso, a empresa gerou mapas localizados e realizou milhares de simulações em cada local. Esta combinação de técnicas permitiu que os modelos previssem com precisão as próximas inundações.
Previsões em tempo real
Com sede na cidade norueguesa de Bergen, a 7Analytics é outra equipe de cientistas, formada por profissionais de TI e geólogos, que oferece às empresas e autoridades locais previsões de inundações em tempo real e informa quais as áreas que estão particularmente em risco de danos causados pelas inundações. Assim como o Google, a predição da 7Analytics também é de sete dias.
O modelo da equipe norueguesa usa dados que levam em consideração para onde a água vai fluir e onde vai criar problemas. Eles alegam que é possível apontar que em cinco dias haverá 50 cm de água na sua região e quando ela vai baixar.
Para fazer isso, o software de IA da empresa estuda automaticamente não apenas o clima, mas também a geografia dos terrenos e dos rios, o grau de construção de uma área e sua capacidade de drenagem. Anteriormente, esses cálculos de previsão de inundações seriam feitos por software padrão, mas o maior poder computacional e a capacidade de aprendizagem da IA significam que o trabalho pode ser feito mais rapidamente e com muito menos intervenção humana.
Simulações e física
Outra empresa que trabalha nesta área é a Neara, de Londres. Ele usa IA para criar simulações digitais de inundações para o setor de infraestrutura elétrica. Estes prevêem como as inundações provavelmente ocorrerão, para que as redes de energia possam se preparar e tomar medidas para minimizar os danos.
A Neara alega que os seus dados podem mostrar onde é seguro restaurar a energia após uma inundação, quais cabos desligar, para onde desviar a energia e os locais exatos para onde os engenheiros devem ser enviados.
Um outro modelo em Virginia Beach, nos Estados Unidos, emprega aprendizado de máquina para interpretar os níveis de água a partir de câmeras web avançadas 4K com recursos infravermelhos. O projeto foi batizado de StormSense.
Os cientistas do MIT também desenvolveram um método para prever inundações, mas focadas em cidades costeiras e mais relacionadas ao impacto de furacões, fenômeno natural que não costumamos registrar no Brasil, mas têm sido cada vez mais comuns em alguns países, como os Estados Unidos.
O modelo de predição criado pelo MIT usa um método baseado na física para antever como o risco de inundações pode evoluir sob um clima mais quente nas cidades costeiras. Isso porque, quando os furacões atingem a costa, ventos fortes agitam as águas do oceano que geram tempestades nas regiões costeiras. Quando múltiplas fontes de inundação, como tempestades e chuvas e rios interagem, podem agravar os perigos de um furacão, levando a um número maior de inundações.
A equipe procurou, então, prever com precisão o nível e o grau de inundações. Os pesquisadores primeiro usaram modelos de chuva para simular a intensidade delas para um grande número de furacões simulados, depois aplicaram modelos numéricos para traduzir – em termos hídricos – a intensidade da chuva em inundações no solo durante a chegada dos furacões, fornecendo informações sobre uma região, como sua superfície e características topográficas.
Em seguida, a equipe desenvolveu um modelo hidrodinâmico para prever como duas fontes de inundações induzidas por furacões, como tempestades e inundações provocadas pela chuva, interagiriam simultaneamente no tempo e no espaço, à medida que furacões simulados atingissem regiões costeiras.
Segundo a equipe, a metodologia pode ser aplicada a qualquer cidade costeira para avaliar o risco de inundações compostas por furacões e tempestades extratropicais.
Fonte: Um Só Planeta.
Foto: Kelly Sikkema/Unsplash / Canaltech.