Em 2024, 142 defensores da Terra e do meio ambiente foram assassinados e outros 4 desapareceram no mundo, segundo relatório da organização internacional Global Witness. O total de 146 vítimas representa uma queda em relação a 2023 (196 casos), mas não indica melhora real, pois, segundo a ONG, subnotificações continuam elevadas e a violência segue de forma sistemática.
Em média, três pessoas foram assassinadas ou desapareceram por semana no último ano por tentar proteger seus territórios, rios e florestas. Desde 2012, quando a Global Witness começou a monitorar os ataques, já foram contabilizados 2.253 defensores mortos ou desaparecidos.
América Latina concentra 82% dos crimes
O levantamento mostra que a América Latina segue como a região mais perigosa do mundo para defensores ambientais, respondendo por 82% dos casos em 2024. Essa liderança negativa se repete há mais de uma década, impulsionada por conflitos ligados ao agronegócio, mineração, extração ilegal de madeira e atividades do crime organizado.
As vítimas mais frequentes são pequenos agricultores e povos indígenas — 45 pessoas em cada um desses grupos foram mortas ou desapareceram no último ano. Mulheres também estão entre as vítimas: 14 morreram ou desapareceram, muitas delas familiares que foram alvo de ataques coletivos.
Brasil: queda nos assassinatos, aumento nas ameaças
O Brasil aparece novamente entre os países mais letais, ocupando a quarta posição do ranking. Em 2024, foram 12 assassinatos de defensores ambientais, número menor do que em 2023 (25 casos), mas que ainda coloca o país entre os mais violentos do mundo.
Metade das vítimas brasileiras eram agricultores familiares; quatro eram indígenas e uma era quilombola. Para além das mortes, os ataques não letais aumentaram. A Comissão Pastoral da Terra (CPT), instituição civil criada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que monitora conflitos no campo, registrou 481 tentativas de assassinato em 2024, sendo 44% dirigidas contra povos indígenas e 27% contra quilombolas.
Esses dados revelam um cenário de violência disseminada, em que a vida de defensores é constantemente ameaçada, diz a Global Witness, que classifica o Brasil como um país de “espaço cívico obstruído”, onde há restrições ao direito de manifestação e alta incidência de intimidações contra ativistas.
A Colômbia segue como o país mais perigoso do mundo para defensores, com 48 assassinatos em 2024, um terço do total global. A violência está fortemente ligada à atuação de grupos armados e do narcotráfico em áreas de alta biodiversidade. O México registrou 19 casos (18 assassinatos e um desaparecimento), em meio a disputas territoriais marcadas pela presença do crime organizado. Nas Filipinas, foram 8 casos, e em Honduras, 6.
Impunidade e interesses econômicos
Segundo a Global Witness, a violência contra defensores é alimentada por altos índices de impunidade. Quando há investigação, em geral apenas os executores materiais, como os pistoleiros contratados, são julgados. Os mandantes, frequentemente ligados a setores econômicos poderosos ou ao crime organizado, permanecem intocados.
Os ataques em 2024 estiveram relacionados principalmente a mineração (29 casos); exploração madeireira (8 casos); agronegócio (4 casos). Organizações criminosas também desempenham papel central, sobretudo na Amazônia, onde estão associadas ao desmatamento, à grilagem de terras e à corrupção institucional.
Um estudo da Fundação Heinrich-Böll lançado este ano mostra que a Amazônia brasileira tornou-se estratégica para o tráfico de drogas. Facções disputam o controle das rotas e mercados locais, e a profissionalização do narcotráfico, associada a crimes ambientais, tem levado à interiorização da violência na região.
O relatório enfatiza que a violência contra defensores ambientais é, ao mesmo tempo, uma crise de direitos humanos e uma crise climática, uma vez que os ativistas estão na linha de frente da preservação de ecossistemas que garantem água, biodiversidade e regulação climática.
Desde a assinatura do Acordo de Paris, em 2015, 1.733 defensores foram mortos ou desapareceram. Na América Latina, quase mil casos ocorreram desde a entrada em vigor, em 2018, do Acordo de Escazú, tratado regional que prevê proteção específica a defensores ambientais.
“Às vésperas da COP30, que será realizada no Brasil, é urgente que governos e empresas reconheçam a importância desses defensores e garantam sua proteção, para que possam atuar sem risco de vida”, alerta a Global Witness.
Fonte: Um Só Planeta.
Foto: © Tânia Rêgo/Agência Brasil.