Depois de décadas de tramitação, o plenário da Câmara dos Deputados pode aprovar, ainda nesta semana, o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que altera o processo de licenciamento ambiental. Apontado por seus defensores como caminho para “desburocratizar” e reduzir a demora no andamento de empreendimentos, o PL do Licenciamento é visto por ambientalistas como o principal ataque à legislação ambiental nas últimas décadas. O projeto ficou conhecido como “PL da Devastação”.
Entre as principais medidas criticadas por defensores do meio ambiente estão o estabelecimento da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que dissemina o autolicenciamento, inclusive para empreendimentos de médio impacto, e a Licença Ambiental Especial (LAE), que dá tratamento político a projetos tidos como “prioritários”, concedendo a licença de maneira acelerada e a despeito de potenciais danos ao meio ambiente. A consulta prévia a povos indígenas e comunidades tradicionais também é excluída.
PL da Devastação quer levar Brasil “de volta para a década de 1960”, diz Fabio Feldmann (Autor do capítulo sobre meio ambiente da Constituição Federal)
Primeiro a propor um projeto de lei sobre o tema no Brasil, o advogado ambientalista e ex-deputado federal Fabio Feldmann concorda que o atual rito de licenciamento ambiental tem problemas, especialmente pela falta de recursos humanos nos órgãos ambientais, mas acredita que o PL prestes a ser aprovado passa longe de resolvê-los. “O projeto tem uma visão equivocada, que não compreende a importância da avaliação ambiental, exclui a sociedade de participação e tem um desejo íntimo de acabar com o licenciamento”, afirma em entrevista à Agência Pública.
O Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que dispõe sobre o licenciamento ambiental, representa desestruturação significativa do regramento existente sobre o tema e representa risco à segurança ambiental e social no país. Além disso, afronta diretamente a Constituição Federal, que no artigo 225 garante aos cidadãos brasileiros o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, com exigência de estudo prévio de impacto ambiental para instalação de qualquer obra ou atividade que possa causar prejuízos ambientais.
O texto também viola o princípio da proibição do retrocesso ambiental, que vem sendo consolidado na jurisprudência brasileira, segundo o qual o Estado não pode adotar medidas que enfraqueçam direitos. Contraria, ainda, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceram a inconstitucionalidade da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para atividades de médio impacto ambiental.
Ao permitir que a definição de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental ocorra sem coordenação nacional e fora do âmbito de órgãos colegiados, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e os Conselhos Estaduais e Municipais, o projeto pode promover a ação descoordenada entre União, Estados e Municípios no processo de licenciamento ambiental e desarticular os mecanismos de participação social. O PL é, por fim, omisso em relação à crise climática, sem sequer mencionar a questão em seu conteúdo, fazendo com que o processo de licenciamento desconsidere esse tema crucial.
Portanto, a proposta terá impacto negativo para a gestão socioambiental, além de provocar, possivelmente, altos índices de judicialização, o que tornará o processo de licenciamento ambiental mais moroso e oneroso para a sociedade e para o Estado brasileiro.
É fundamental que o Poder Legislativo assegure o equilíbrio entre a celeridade desejada pelos setores produtivos e a necessidade de preservar os instrumentos essenciais à proteção ambiental. Um marco legal eficaz deve promover o desenvolvimento sustentável com base em critérios técnicos, transparência e responsabilidade institucional, em consonância com os princípios constitucionais que regem a tutela do meio ambiente.
Enquanto seguem nesta quinta-feira (7) as reuniões finais no governo federal para definição de qual postura o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva,vai tomar sobre o projeto que cria uma lei geral do licenciamento ambiental, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima divulgou os dados consolidados de alertas de desmatamento nos últimos 12 meses na Amazônia. E isso, sozinho, já deveria servir como um excelente argumento para o veto do presidente aos pontos mais danosos daquele que ficou conhecido como PL da Devastação.
O texto aprovado no Congresso tem sido apontado como uma potencial bomba para o aumento do desmatamento no país, uma vez que traz diversos trechos que abrem a possibilidade de redução no controle ou mesmo na prevenção de desmatamento.
Uma análise feita pelo Instituto Socioambiental calculou que as brechas criadas pelo projeto de lei podem fazer com que o Brasil perca o equivalente ao território do Paraná em florestas.
Ou seja, o projeto tem o potencial de impossibilitar que o Brasil cumpra suas metas de zerar o desmatamento até 2030 e ainda pôr a perder tudo o que o governo conquistou nesta seara nos últimos dois anos e meio.
Conheceremos o resultado nesta sexta. E aí começa outra batalha com o Congresso, para não derrubar os vetos e passar a lei. Oremos.
Fonte: Agência Pública.
Imagem: Agência Pública
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