Os últimos oito anos foram os mais quentes da história. É o que aponta o estudo anual (2023) sobre o clima, feito pela Organização Meteorológica Mundial. Os efeitos das mudanças climáticas são sentidos há anos, mas pioraram nos últimos tempos, com um maior número de inundações, secas, e ondas de calor.
As mudanças são vistas em escala global e têm impacto direto na saúde populacional, principalmente dos mais vulneráveis, que são as crianças, os idosos e pessoas com comorbidades no geral, que sofrem com alterações bruscas de temperatura e situações extremas.
Há cerca de um mês, o grupo conhecido como “Vovós pelo Clima” ganhou uma importante ação contra o governo suíço no Tribunal Europeu de Direitos Humanos (ECHR, sigla em Inglês). O coletivo de mulheres com média de idade de 73 anos argumentou que os esforços do governo de seu país contra a crise climática foram insuficientes para protegê-las de ondas de calor mais frequentes e intensas. E que os eventos climáticos extremos minaram sua saúde e as colocaram em risco de morte.
Além da cobrança por uma atitude efetiva dos países contra as mudanças climáticas, a ação das “vovós” também se justifica por outra razão: pessoas 60+ formam um dos grupos mais vulneráveis à crise climática. Fato comprovado pelo estudo “Global projections of heat exposure of older adults”, publicado na Nature Communications.
A pesquisa mostra que quase um quarto da população idosa mundial poderá estar vivendo em áreas de calor excessivo [o limiar crítico considerado pela pesquisa é uma temperatura máxima de 37,5°C] até a metade do século. A previsão é que em 2050 sejam quase 250 milhões de idosos vivendo em um planeta grassado pelos efeitos da crise climática. A exposição a altas temperaturas pode causar desidratação, distúrbios de sódio, disfunção renal e até mesmo a morte, sobretudo entre os mais velhos, detalha os estudos.
Os pesquisadores alertam que isso provavelmente criará pontos de vulnerabilidade biológica e social. O impacto nos sistemas de saúde e na desigualdade global será enorme, destaca o Guardian, porque as pessoas idosas são mais vulneráveis a temperaturas elevadas e as populações que serão mais afetadas tendem a estar nos países mais quentes e mais pobres do Sul Global.
A população global está envelhecendo a um ritmo sem precedentes – inclusive no Brasil, como mostrou o Censo 2022 do IBGE. Até 2050, o número de pessoas com 60 anos ou mais deverá dobrar para 2,1 bilhões, representando mais de 1 em cada 5 habitantes do planeta. “Dois terços deles viverão em países de baixa e média rendas, onde eventos climáticos extremos são especialmente prováveis”, previu o artigo.
Coordenador do estudo, Giacomo Falchetta, da CMCC Foundation – Euro-Mediterranean Center on Climate Change, espera que a pesquisa ajude a persuadir os formuladores de políticas a abordar a iminente colisão entre o crescimento populacional, o aumento da expectativa de vida e as mudanças climáticas, informa a Time. Compreender onde as populações mais velhas estão em risco de problemas de saúde relacionados ao calor, por exemplo, poderia ajudar os governos a direcionar recursos de saúde e abordar as necessidades de infraestrutura, como a construção de redes elétricas para gerenciar o aumento da demanda por eletricidade para ar condicionado e centros de resfriamento, e fornecer mais espaços verdes urbanos.
É importante lembrar que os três dias mais quentes já registrados no planeta aconteceram em julho de 2024. Somente no ano passado, foram contabilizadas cerca de 2.300 mortes associadas ao calor nos Estados Unidos, um salto de 117% em relação a 1999. Pesquisa recém-publicada alerta para o impacto nos serviços de emergência dos hospitais, que provavelmente não darão conta de tanta gente afetada pelas altas temperaturas.
Segundo a médica Cristiane Novaes, diretora do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, embora ainda não haja literatura científica suficiente, há evidências de um cenário mais desafiador: “vem ocorrendo uma mudança na prevalência de doenças sensíveis ao clima. Alterações cardiovasculares, por exemplo, são comuns em idosos, mas estão acontecendo por causa de um fator novo, que são as ondas de calor extremo cada vez mais frequentes”.
A lista é extensa e abrange diversos tipos de problemas: além dos cardiovasculares, como taquicardia e hipertensão, estão se tornando corriqueiros quadros de irritação e inflamação das vias aéreas e de alterações oftalmológicas. Eventos meteorológicos extremos também acarretam um aumento de estresse, ansiedade, depressão e outros transtornos mentais. O risco de morte durante uma onda de calor é 34% maior em áreas mais densamente povoadas, afetando especialmente crianças e idosos.
É importante registrar que o estudo “2024 State of the Climate Report”, relatório sobre a situação do planeta recém-publicado na revista científica BioScience, traz um apelo dramático dos cientistas. Os autores atualizaram 35 “sinais vitais” da Terra e alertam: “estamos entrando numa fase sem precedentes da crise climática”. O pior é que os governos sabem o que deve ser feito: limitar as emissões de carbono, abandonar o combustível fóssil, investir em fontes de energia limpa, proteger e restaurar a biodiversidade dos ecossistemas, conscientizar as pessoas a adotar novos hábitos alimentares, preferindo uma dieta baseada no consumo de plantas.
Fontes: ClimaInfo, g1, Agência Universitária de Notícias – USP.
Foto: Maskot/GettyImages.
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