Países em guerra alertam na COP30 que conflitos pioram crise climática e vice-versa

Diversos países e territórios em conflito — como Israel, Palestina, Rússia e Ucrânia — participaram da COP30. Em suas falas durante a cúpula de Belém, essas delegações insistiram na necessidade de discutir a relação entre as guerras e a mudança climática. Seus governos também solicitaram que a comunidade internacional ajude a financiar suas respostas às catástrofes ambientais.

“A mudança climática não espera que os embates terminem”, diz Ellie Kinney, gerente sênior do centro de pesquisa Conflict and Environment Observatory, sediado no Reino Unido. Governos como o palestino e o ucraniano enfrentam o desafio de lidar simultaneamente com os impactos da guerra e da crise climática, que muitas vezes se reforçam mutuamente.

Alguns estudos sugerem que a mudança climática pode agravar conflitos armados ao estimular uma competição cada vez mais acirrada por recursos escassos. “Não é o único fator, mas tem um impacto significativo”, afirma Kinney.

A delegação do Iêmen reforçou essa ideia durante sua participação na COP30, citando a falta de água como um dos fatores que ampliam a violência no país. A da Somália apresentou um argumento semelhante, demonstrando como as secas paraçam famílias a migrar e criam instabilidades que podem evoluir para conflitos armados.

Esses conflitos, por sua vez, também intensificam a crise climática. Um dos focos do trabalho de Kinney é o estudo das emissões de poluentes durante as guerras — especialmente em conflitos de larga escala, como a invasão russa da Ucrânia e os bombardeios israelenses em Gaza.

“Bombardeios aéreos emitem uma grande quantidade de carbono”, diz ela. “Mas há também outros fatores que nem sempre são lembrados, como a destruição de prédios e sua reconstrução, que são dois processos altamente poluentes.”

Um estudo preliminar do serviço de satélites da ONU, divulgado em outubro deste ano, indica que cerca de 81% das construções em Gaza sofreram algum dano durante a guerra.

Em sua fala na COP30, Ibrahim Alzeben, embaixador da Palestina no Brasil, afirmou que os ataques de Israel dos últimos dois anos criaram milhões de toneladas de detritos, além de terem destruído redes de esgoto, contaminando assim a água potável do território. Disse ainda que a comunidade internacional deve proteger não apenas as pessoas em Gaza, mas também o ambiente, que está em risco.

Há ainda outros impactos significativos dos conflitos no ambiente, afirma Kinney, como o fato de que os aviões comerciais são paraçados a evitar o espaço aéreo de países em guerra, como o da Ucrânia, o que aumenta consideravelmente a duração — e a emissão de poluentes — dos voos.

As delegações de muitos desses territórios em conflito são relativamente pequenas, como as da Palestina e da Síria. Devido a atritos diplomáticos com o Brasil, Israel reduziu sua equipe a apenas três integrantes de médio escalão do governo. Já a delegação da Ucrânia foi particularmente ampla, incluindo não apenas membros do governo, mas também diversos pesquisadores e membros de organizações da sociedade civil.

A Ucrânia é hoje um dos casos-chave nos estudos sobre as emissões de poluentes durante conflitos armados, afirma Kinney. Com a invasão russa iniciada em 2022, cientistas aprimoraram métodos de medição — hoje, essas técnicas são usadas também em Gaza. Nesse contexto, a delegação ucraniana apresentou à cúpula suas iniciativas verdes de reconstrução, com ênfase nas energias renováveis.

Kiev também afirmou em Belém que buscará US$ 43 bilhões em compensação ambiental da Rússia ao fim da guerra. Segundo o vice-ministro Pavlo Kartashov, a ofensiva russa produz um “carbono de conflito” que inclui combustível queimado, florestas destruídas e o uso massivo de concreto e aço, impondo um custo climático significativo.

Outra prioridade para diversas dessas delegações na COP30 é o financiamento climático. Países em conflito têm pelejado para atrair esses fundos devido ao receio dos investidores de colocar seu dinheiro nessas economias fragilizadas e instáveis. Com isso, há menos mecanismos para lidar com as emergências climáticas — que continuam a ocorrer, a despeito da política.

Essa é a principal mensagem de um grupo de países africanos, incluindo Mauritânia, Burundi e Sudão do Sul, que pressionam os demais membros para que lhes destinem mais fundos climáticos.

Durante a cúpula de Belém, Bashir Mohamed Jama, ministro do Ambiente da Somália, disse que seu país recebe menos de 1% do que precisa para se adaptar à mudança climática. “Nenhum país deveria ser deixado para trás”, afirmou em um comunicado.

Fonte: Folha SP.

Foto: Valentyn Ogirenko/Reuters.

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